Veja x USP: “brincando com fogo”
29/05/2007
- Opinión
A edição paulista da revista Veja desta semana se superou no reacionarismo. Na sua capa terrorista, que apresenta a foto de uma barricada incendiada em frente à reitoria da Universidade de São Paulo e uma manchete apocalíptica (“Caos na USP”), e no título agressivo do artigo principal (“Estão brincando com fogo”), a publicação exagera nos adjetivos contra os estudantes que ocuparam esta instituição na legítima luta pela autonomia universitária. O texto assinado pelos “jornalistas” Álvaro Leme, Maria Paola e Sandra Soares parece ter sido escrito por ativistas do CCC (Comando de Caça aos Comunistas) no período mais sombrio da ditadura militar no país. Mais realistas do que o rei, eles destilam ódio na pseudo-reportagem.
Após fazer apologia da “maior e melhor instituição de ensino do país”, sem entrar no mérito das críticas dos estudantes, a matéria editorializada desqualifica o “pequeno bando formado por cerca de 300 de seus quase 80.600 alunos que invadiu o prédio e ali acampou, ameaçando permanecer aquartelado até que uma lista com dezessete exigências, boa parte delas oportunista, fosse atendida”. Diz ainda que “os arruaceiros destruíram uma porta e depredaram as placas... Espalhados por um chão ensebado, coberto por pedaços de papel, casais namoraram, rapazes divertiam-se em jogos de carteado e mocinhas pintavam as unhas – alguns vestidos com camiseta de microscópicos partidos da esquerda radical, como PSOL, PCO e PSTU”.
Razões da famiglia Civita
Além de desancar os estudantes, o artigo também critica a “Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo, que aproveitou para entrar em greve, desrespeitando o direito dos alunos que querem estudar, e o Sindicato dos Trabalhadores da USP”. Sobre as reivindicações dos manifestantes, que repudiam cinco decretos do governador José Serra contrários à autonomia universitária, afirma, candidamente, que houve apenas “desencontro de informações” e que o “o governo se apressou em apagar o incêndio”. Na opinião dos porta-vozes da Editora Abril, “os estudantes que invadiram a reitoria da USP pegaram carona” nesta confusão. E eles ainda lamentam, despudoradamente, que “os amotinados não atendam a imprensa”.
Caso não tivesse estourado o escândalo envolvendo o senador Renan Calheiros, provavelmente o “caos na USP” seria a manchete da edição nacional da revista Veja. A grosseira provocação não ficaria circunscrita ao encarte paulista. Isto por dois motivos. O primeiro, de classe, é que esta publicação direitista sempre se coloca frontalmente contra todos os movimentos sociais – organizados ou espontâneos, sem distinções. O segundo, mais político, é que a revista da famiglia Civita já deflagrou a campanha presidencial do tucano José Serra. Ela faz um esforço titânico para evitar qualquer tema que prejudique o seu “candidato” e para difundir suas “virtudes”. A campanha é descarada – e alguns jornalistas topam fazer o papel de ingênuos!
Publicitários de José Serra
Para ilustrar, bastam dois exemplos. Na semana de janeiro em que ocorreu a erosão na obra do Metrô, que abriu uma cratera no centro de São Paulo e causou várias vítimas, a capa da revista Veja estampou a foto de um cachorro com salto alto e a “meiga” manchete: “Humanos&caninos: uma história de amor”. Já em meados de maio a revista fabricou uma reportagem rasgando elogios ao governador, que teria resolvido os problemas de segurança pública e controlado os presídios, “com medidas rigorosas”. Na deprimente foto em que ele aparece segurando um rifle, a legenda publicitária: “José Serra brinca com uma arma diante de fotógrafos. Mas o governador não está para brincadeira quanto o assunto são as penitenciárias do Estado. Elas são regularmente revistadas por agentes especiais e os presos indisciplinados agora sofrem sanções”.
No caso da ocupação da USP, a revista até superou os seus concorrentes tucanos. A Folha de S.Paulo, por exemplo, chegou a criticar a total omissão do tucano. O articulista Fernando Barros e Silva registrou que “o governo Serra tergiversa, desconversa, age reiteradamente de forma oblíqua. Ora parece pouco seguro de seus propósitos, ora dá impressão de que quer engambelar a platéia”. Já o jornalista Paulo Henrique Amorim, no seu blog Conversa Afiada, lembrou que o governador sempre desaparece de cena política quando ocorre algo grave no Estado e perguntou: será que ele está pendurado ao telefone com os editores da Folha, Estadão, Globo e Veja para fabricar uma cobertura favorável diante do “caos na USP?”.
- Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB, editor da revista Debate Sindical e autor do livro “As encruzilhadas do sindicalismo” (Editora Anita Garibaldi, 2ª edição).
Após fazer apologia da “maior e melhor instituição de ensino do país”, sem entrar no mérito das críticas dos estudantes, a matéria editorializada desqualifica o “pequeno bando formado por cerca de 300 de seus quase 80.600 alunos que invadiu o prédio e ali acampou, ameaçando permanecer aquartelado até que uma lista com dezessete exigências, boa parte delas oportunista, fosse atendida”. Diz ainda que “os arruaceiros destruíram uma porta e depredaram as placas... Espalhados por um chão ensebado, coberto por pedaços de papel, casais namoraram, rapazes divertiam-se em jogos de carteado e mocinhas pintavam as unhas – alguns vestidos com camiseta de microscópicos partidos da esquerda radical, como PSOL, PCO e PSTU”.
Razões da famiglia Civita
Além de desancar os estudantes, o artigo também critica a “Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo, que aproveitou para entrar em greve, desrespeitando o direito dos alunos que querem estudar, e o Sindicato dos Trabalhadores da USP”. Sobre as reivindicações dos manifestantes, que repudiam cinco decretos do governador José Serra contrários à autonomia universitária, afirma, candidamente, que houve apenas “desencontro de informações” e que o “o governo se apressou em apagar o incêndio”. Na opinião dos porta-vozes da Editora Abril, “os estudantes que invadiram a reitoria da USP pegaram carona” nesta confusão. E eles ainda lamentam, despudoradamente, que “os amotinados não atendam a imprensa”.
Caso não tivesse estourado o escândalo envolvendo o senador Renan Calheiros, provavelmente o “caos na USP” seria a manchete da edição nacional da revista Veja. A grosseira provocação não ficaria circunscrita ao encarte paulista. Isto por dois motivos. O primeiro, de classe, é que esta publicação direitista sempre se coloca frontalmente contra todos os movimentos sociais – organizados ou espontâneos, sem distinções. O segundo, mais político, é que a revista da famiglia Civita já deflagrou a campanha presidencial do tucano José Serra. Ela faz um esforço titânico para evitar qualquer tema que prejudique o seu “candidato” e para difundir suas “virtudes”. A campanha é descarada – e alguns jornalistas topam fazer o papel de ingênuos!
Publicitários de José Serra
Para ilustrar, bastam dois exemplos. Na semana de janeiro em que ocorreu a erosão na obra do Metrô, que abriu uma cratera no centro de São Paulo e causou várias vítimas, a capa da revista Veja estampou a foto de um cachorro com salto alto e a “meiga” manchete: “Humanos&caninos: uma história de amor”. Já em meados de maio a revista fabricou uma reportagem rasgando elogios ao governador, que teria resolvido os problemas de segurança pública e controlado os presídios, “com medidas rigorosas”. Na deprimente foto em que ele aparece segurando um rifle, a legenda publicitária: “José Serra brinca com uma arma diante de fotógrafos. Mas o governador não está para brincadeira quanto o assunto são as penitenciárias do Estado. Elas são regularmente revistadas por agentes especiais e os presos indisciplinados agora sofrem sanções”.
No caso da ocupação da USP, a revista até superou os seus concorrentes tucanos. A Folha de S.Paulo, por exemplo, chegou a criticar a total omissão do tucano. O articulista Fernando Barros e Silva registrou que “o governo Serra tergiversa, desconversa, age reiteradamente de forma oblíqua. Ora parece pouco seguro de seus propósitos, ora dá impressão de que quer engambelar a platéia”. Já o jornalista Paulo Henrique Amorim, no seu blog Conversa Afiada, lembrou que o governador sempre desaparece de cena política quando ocorre algo grave no Estado e perguntou: será que ele está pendurado ao telefone com os editores da Folha, Estadão, Globo e Veja para fabricar uma cobertura favorável diante do “caos na USP?”.
- Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB, editor da revista Debate Sindical e autor do livro “As encruzilhadas do sindicalismo” (Editora Anita Garibaldi, 2ª edição).
https://www.alainet.org/pt/articulo/121434
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