Criança e consumo

15/03/2010
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O II  Fórum Internacional Criança e Consumo ocorrerá na capital paulista, entre 23 e  25 de setembro, no Instituto Itaú Cultural. Em três noites de trabalho serão  discutidos o consumismo infantil e suas conseqüências.  

Na primeira noite, haverá o lançamento  do documentário “Criança e consumo”. Nas outras, debates sobre  “Publicidade, educação e infância” (24/9) e “Sociedade de consumo”  (25/9).

Na última noite será  apresentado o vídeo de atividades pedagógicas desenvolvidas com crianças do  projeto “Educando na periferia”, do Instituto Alana. Nele, um grupo de  crianças reage à pergunta: "Como seria uma vida sem publicidade?".  

Haverá ainda, em  22 de setembro, um workshop destinado exclusivamente a  jornalistas. O objetivo é passar aos profissionais da área os fundamentos, os  pontos polêmicos sobre a temática do consumismo, os novos enfoques para o  tema, e alertá-los para maneiras diferenciadas de realizar a cobertura  jornalística sobre o assunto.

Não  é fácil atrair criança ao mercado de consumo; dotada de imaginação e  criatividade, ela é capaz de fazer um cavalo de um cabo de vassoura ou um  castelo de um punhado de areia. Para a lógica do mercado, entretanto criança  tem duas vantagens como consumista: não tem discernimento e seduz o adulto.  Cheguei aos treze anos sem que o fator dinheiro entrasse em minha vida. Até  hoje não sei a marca do tênis que usava. O máximo de consumo era pedir ao meu  pai que trouxesse, ao retornar do trabalho, uma caixa de pregos para fixar meu  carrinho de rolimã.

Como fazer a criança  tornar-se consumista? Um dos recursos mais utilizados é a erotização precoce.  Vide os trajes das apresentadoras de programas de TV destinados ao público  infantil. Se se consegue que a criança comece a pintar o rosto diante do  espelho aos 4, 5 anos; a prestar demasiada atenção ao próprio corpo; a se  preocupar com a marca do tênis, da roupa... essa criança precocemente  erotizada manifesta trejeitos de adulto, vocabulário de adulto, desejos de  adulto. Ela é psicologicamente ‘adulta’ e biologicamente infantil.  

Ao chegar à puberdade, o corpo desperta  e a consciência se desloca da fantasia para a realidade - então ela, insegura,  procura prolongar a fantasia. Assim, torna-se vulnerável às drogas. As drogas  cumprem esse papel de prolongar a fantasia em adolescentes imaturos,  ‘educados’ para serem consumistas  precoces.

Um dos fenômenos marcantes do  neoliberalismo é que, antes, ao vestir uma camisa, a pessoa dava valor ao  tecido, humanizava o tecido por usá-lo. Hoje, ao contrário, é a camisa, com a  sua grife, que imprime valor à pessoa. E o valor é tanto maior quanto  mais grifes ela ostenta. Se chega a pé à sua casa, tem valor Z; se chega de  BMW, tem valor A! A mercadoria que a reveste agrega mais ou menos valor. Eis a  reificação do ser huma­no.

Para  evitar tais deformações, o Instituto Alana criou, em 2006, o projeto “Criança  e consumo”, que busca fomentar, na sociedade, consciência crítica quanto ao  consumo de produtos e serviços por crianças e adolescentes, de modo a evitar,  na medida do possível, a mercantilização da infância e da juventude; a cultura  da violência; o materialismo excessivo; o desgaste das relações sociais  etc.

O Alana fiscaliza a publicidade  voltada às crianças e jovens, acolhe denúncias e toma medidas legais junto aos  órgãos competentes para sustar anúncios que deseducam as novas gerações.  

São muitos os exemplos na TV: na praia,  um grupo de meninas suspira ao ver um galã adulto calçando uma sandália de  dedo (erotização precoce); duas crianças com menos de 10 anos hipnotizam a mãe  para que compre numa determinada loja (inversão de valores); um filhote de  cachorro empurra, com o focinho, o balanço com uma criança (exploração da  credulidade infantil e risco à segurança); brindes associados à compra de  guloseimas (estímulo ao consumo excessivo de alimentos); crianças num veículo  são acalmadas pelo DVD player colocado no teto de um carro (desprestígio ao  papel educativo da família e sobrevaloração da  tecnologia).

Criança não deve ser objeto  de peças publicitárias. Para que se torne um adulto sadio, precisa é de afeto,  estima, respeito (consciência dos limites) e mergulho em seu próprio universo  onírico.

Mais informações:  www.alana.org.br
<http://www.alana.org.br>  

- Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Maria  Stella Libanio Christo, de “Fogãozinho, culinária em histórias  infantis”(Mercuryo Jovem), entre outros livros.  

 

A reprodução só pode ser feita mediante autorização por escrito de Frei Betto.

https://www.alainet.org/pt/articulo/129220
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