Os nós do resgate do Peru por Ollanta
- Opinión
Naquela que é, provavelmente, sua melhor novela, Conversas na Catedral (um barzinho em que os amigos da geração se reúnem em Lima), Vargas Llosa faz com que um personagem pergunte ao outro:
- Quando se estrepou o Peru.
Se dá por estabelecido que o país tenha se estrepado, faltava saber apenas quando isso tinha se dado.
Depois da sucessão de fracassos, o sentimento no Peru hoje é o de alívio e de resgate. Alívio por ter evitado, por pouco o retorno sinistro do fujimorismo. (Keiko, apesar de tudo o que se alinhou contra ela, teve quase a metade dos votos, embora a pesquisa mais recente dê uma expectativa favorável a Ollanta de mais de 70%).
Mas a herança da qual ele parte é difícil e ele tem plena consciência disso.
Cada governo que se lanca na superação do modelo neoliberal parte de uma herança determinada, seu inevitável ponto de partida para a construção especifica da sua modalidade do posneoliberalismo.
Em geral parte-se de situações de crise, mais ou menos aguda – com a Argentina como caso mais extremo, mas que se estende a praticamente todos os outros países. No caso do Peru essa é uma diferença: como dizia um ditador brasileiro, “a economia vai bem, o povo vai mal”.
Há um consenso no Peru de que não se deveria retroceder do crescimento econômico dos últimos anos, mas fazê-lo acompanhar com políticas redistributivas. Esse é um condicionante para Ollanta. Se não recebe o Peru em crise econômica, em compensação sofre as pressões para que não mude a política econômica. A solução que ele está buscando implementar é a da cobrança de um imposto aos sobre lucros, o que as mineradoras ganharam acima da media mundial do setor. Trata também de cobrar impostos pendentes que os governos anteriores nao cobraram. Retirou a proposta de nacionalização de empresas mineradoras, que seu programa para o primeiro turno tinha.
Este é o primeiro dos principais nós que Ollanta tem que enfrentar. O segundo é o de como, no marco do Tratado de Livre Comércio que o Peru tem com os EUA, pode-se priorizar as relações com Unasul – como tem reiterado Rafael Rongliolo, Ministro de Relações Exteriores e uma das mais importantes presenças da esquerda no minstério. Brechas há, tanto assim que a China já se tornou o primeiro parceiro comercial do Peru. Uma delas é que o TLC se refere a relações comerciais – obstáculo para o ingresso do Peru no Mercosul -, mas não a posições aprovadas em Unasul e no seu recentemente criado Conselho Sulamericano de Economia e Finanças, sobre medidas defensiva em relação as consequências da crise.
Mas o nó talvez mais difícil é a relação entre as empresas mineradoras e os movimentos indígenas. O extrativismo exportador foi o responsável tanto pelo crescimento regular da economia, em torno de 7% ao ano, nunca conseguido antes no país, como pela multiplicação dos conflitos, a grande maioria deles em torno de questões de meio ambiente, de algumas dezenas para várias centenas em poucos anos.
Como as coisas estão colocadas hoje ou o governo mantém a forma de atuação – prepotente, avassaladora do meio ambiente – das grandes empresas estrangeiras e garante a continuidade do ritmo de crescimento da economia, mas se chocará abertamente com os movimentos indígenas ou formalizará o direito de veto destes e inviabilizará grande parte dos grandes investimentos que tem garantido a expansão continuada da economia peruana.
Ollanta quer redistribuir as cartas do jogo, tem planos que, se conseguir colocar em prática, permitiria redefinir o desenho dos enfrentamentos, apoiado no imenso apoio eleitoral que teve na região. (Em Puno, onde houve um grave conflito durante o processo eleitoral e Ollanta conseguiu que se suspendesse o conflito por um tempo, ele obteve mais de 70% dos votos. Certamente do equacionamento deste problema depende em grande medida o resgate do Peru.
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