O papel do G-20 e os rumos do Brasil na reestruturação mundial
14/11/2014
- Opinión
Neste final de semana, os 20 chefes dos países mais ricos do mundo se reúnem na Austrália para tratar fundamentalmente da retomada do crescimento da economia global. Após seis anos do início da crise iniciada em 2008, os debates ainda não convergiram para o entendimento se a situação atual reflete apenas uma fase de dinamismo baixo da produção ou se trata mesmo de uma recessão comparável a de 1929.
Na ausência de compreensão comum, ganha importância a difusão de análises econômicas cada vez mais contraditórias. De um lado, os integrantes do pensamento neoliberal que sustentam o desmonte das políticas existentes de proteção da produção e emprego.
De outro lado, os defensores do pensamento não liberal que alertam para o comportamento das bolsas de valores e mercado financeiro descolado da economia real. Por conta disso, caberia a manutenção das políticas públicas mais amplas, de reformulação da governança mundial (papel das agências multilaterais como Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional) e medidas de regulação e promoção do desenvolvimento em novas bases econômicas, sociais e ambientais.
O exemplo da ação integrada dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) serviria de exemplo. Mas para além das interpretações da crise mundial e do papel das políticas governamentais adotadas, cabe ressaltar o simultâneo movimento mais amplo de reestruturação econômica impulsionada mais recentemente. Três evidências disso chamam a atenção tanto pela rapidez com que ocorrem como pela dimensão estrutural, muitas vezes sem o devido acompanhamento de todos os cidadãos.
A primeira evidência encontra-se na consagração de uma nova partilha do mundo em função do esvaziamento relativo dos Estados Unidos no exercício de uma ordem unipolar. Em contrapartida, o avanço de um mundo policêntrico, com novas regiões exercendo a promoção do desenvolvimento supranacional, representa no contexto sul-americano a oportunidade de o Brasil contribuir mais decisivamente na integrado regional do desenvolvimento em novas bases.
A segunda evidência corresponde ao fortalecimento do papel do Estado, geralmente associado ao apoio das grandes empresas à competição global. A forte transferência de recursos públicos às mega corporações transnacionais (bancos e empresas não financeiras) indica tanto o aprofundamento da concorrência intercapitalista como a maior competição entre os Estados. A posição brasileira em virtude disso, de apoiar à reestruturação patrimonial de empresas privadas nacionais e de estatais acompanha esse movimento na mesma medida que se busca também fortalecer as oportunidades de expansão das micro e pequenas empresas.
A terceira evidência, por fim, localiza-se na concentração de esforços técnico-científicos voltados para a geração de um novo modelo de produção e consumo menos degradante do meio ambiente. Isso porque a eficácia das ações públicas que procuram minorar as emissões de gás carbono por meio da conscientização, tributação e promoção de alternativas ambientalmente sustentáveis pressupõe outra base tecnológica para produzir. Ademais das iniciativas em torno da matriz energética renovável, passa a ter importância a conformação de uma estrutura bioindustrial que promova a produção crescente dos empregos verdes.
Neste campo, o Brasil se destaca por já possuir uma das matrizes energéticas das mais limpas do mundo, como deter a oportunidade de construir - a partir da exploração petrolífera do pré-sal - o seu projeto nacional de desenvolvimento que atenda a perspectiva de inclusão de toda a sociedade. Tudo isso se torna plenamente possível nos dias de hoje, embora dependa efetivamente de uma maioria política realmente comprometida com essa perspectiva.
Após 29 anos de democracia consolidada no Brasil, não parece haver o que possa impedir a consagração de um grande projeto de país soberano, justo, solidário e próspero. A não ser o obstáculo político de continuar ousando na direção de utilizar a crise como uma oportunidade para maior avanço econômico, social e ambiental.
- Marcio Pochmann, para a Rede Brasil Atual
14/11/2014
https://www.alainet.org/pt/articulo/165495?language=es
Del mismo autor
- Capitalismo de investimentos fantasmas e empresas zumbis 13/10/2021
- O trabalhador no sistema Hamlet 11/08/2021
- Novíssima maquinaria e o trabalho no início do século 21 27/07/2021
- Dólar no pior cenário desde o fim do padrão ouro 22/06/2021
- Mudanças para o desenvolvimento não liberal 20/05/2021
- Trabalho na América Latina e a pandemia 24/06/2020
- Extrema direita, economia parada e conexão com os pobres 22/06/2020
- Economia solidária pós-pandemia deve pautar os futuros governos progressistas 18/05/2020
- Capitalismo e a Covid-19 05/05/2020
- A indústria do medo e o crescimento do partido da segurança 28/04/2020