O controle do que vemos, ouvimos e lemos

16/07/2015
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Nos EUA, nos últimos anos, produziu-se um espetacular avanço na monopolização dos meios de comunicação. A Lei das Telecomunicações (“Telecommunications Act”) de 1996 pode ser considerada como o ponto de partida desse processo.

 

Essa lei levantou as restrições que havia sobre a propriedade de estações de rádio. Antes dessa data, apenas uma empresa poderia ser proprietária de duas estações AM e de duas FM no mesmo mercado, sem exceder 40 em todo o país. Com a suspensão dessa norma uma onda de consolidações é desencadeada.

 

Nos seis anos posteriores à entrada em vigor da lei, “Clear Chanel Communications”, por exemplo, obteve o controle de 1.225 estações de rádio em 300 cidades. Atualmente, é proprietária ou controla mais de 6.600 estações, mais da metade das existentes nos Estados Unidos. Soma-se a isso uma rede nacional, “Premiere Radio Networks”, que produz, distribui ou representa aproximadamente 90 programas, atende em torno de 5.800 estações e tem cerca de 213 milhões de ouvintes semanais. Também inclui a “Fox News Radio”, “Fox Sport Radio” e “Australian Radio Network”, entre outras. Sua receita, em 2011, alcançou a cifra de 6,2 bilhões de dólares.

 

Eliminadas as restrições para a consolidação vertical, faltava apenas remover as limitações que existiam à consolidação horizontal estabelecidas pela regra da FCC (“Federal Communications Commission”), de 1975 (“crossownershiprule”) que proibia a quem era proprietário de um jornal a posse de uma estação de rádio (ou de TV) e vice-versa no mesmo mercado. A finalidade da regra era impedir que uma única entidade se tornasse voz dominante dentro de uma comunidade. Em 2003, a FCC flexibilizou tais restrições, mas o Terceiro Circuito de Apelações bloqueou a implementação das mudanças. Em março de 2010, o Tribunal levantou o bloqueio e abriu o caminho para a consolidação horizontal.

 

A imprensa escrita, falada ou televisiva segue as agendas impostas pelos proprietários. Quando estes são milhares, prevalece a diversidade de informação e de opinião dentro dos limites que permitam o “establishment”. Mas quando a consolidação ocorre em grande escala, como atualmente, a agenda que domina é a de poucos e poderosos proprietários. A ideologia que propaga a mídia é, logicamente, a mais reacionária possível e de ultradireita. Hoje temos mais canais de TV do que nunca, sendo que uma quantidade substancial deles se dedica ao fundamentalismo religioso, às vendas por meio da televisão, ao mais frívolo entretenimento, ou à pornografia. Nos restantes, a qualidade caiu para seu nível mais baixo, o que, combinado com o excesso de propagandas, atinge limites embrutecedores.

 

Tudo isto é extremamente perigoso em uma sociedade que mal sabe ler e já perdeu a capacidade de discernir entre fatos e opiniões, porque está acostumada à seleção ou apresentação dos acontecimentos de acordo com os critérios estabelecidos. Os episódios são ignorados ou distorcidos para legitimar opiniões.

 

A desregulamentação abriu todos os mercados de telecomunicações, incluindo os de cabo ou satélite, e da Internet à concorrência desleal. Cinco conglomerados de mídia controlam 90% de tudo o que lemos, ouvimos e vemos. O que pode haver de estranho no fato de que dezenas de milhões de norte-americanos aprovem a guerra preventiva, os assassinatos seletivos de supostos inimigos dos Estados Unidos, a tortura de prisioneiros, as violações de fronteiras com drones, ou os crimes chamados de danos colaterais. Ou que ignoram completamente os sofrimentos da população de Cuba por causa de um bloqueio criminoso de meio século.

 

A consolidação produz meios de comunicação que não estão direcionados a toda a comunidade. Os anunciantes participam com ¾ da renda, e eles só se preocupam com o segmento da população com capacidade de compra de seus produtos ou serviços. Especificamente, a população de baixa renda não faz parte de seus interesses. A consolidação torna os cidadãos norte-americanos meros consumidores e espectadores.

 

Atualmente, o livre mercado é o critério com o qual os meios de comunicação são analisados. Isto é, a operação eficiente e o lucro máximo são os principais ou únicos objetivos, desconsiderando o importante papel que deve ser desempenhado pelos meios de comunicação na sociedade e na vida pública. Os meios de comunicação consolidados são, em geral, grandes e complexas instituições sociais, culturais e políticas e não somente instituições econômicas. Essas exercem uma profunda e negativa influência na sociedade. Se permitirmos que controlem o que vemos, ouvimos e lemos, também controlarão o que pensamos.

 

Raúl Antonio Capote é licenciado em artes, mestre em Relação Internacionais e professor auxiliar da Universidade de Ciências Pedagógicas Enrique José Varona. É membro da União de Historiadores de Cuba e da Sociedade Cultural José Martí e também escritor. Foi oficial da segurança cubana e durante anos um agente infiltrado que ajudou a desbaratar redes de sabotagens e terrorismo contra Cuba socialista, tendo escrito, sobre esta experiência o livro Enemigo (ainda sem edição em português).

 

- Salvador Capote Llano, natural de Cruces, Cuba, residente em Miami, Doutor em Medicina, especialista em Bioquímica, estudou Filosofía e Letras em Cuba e Ciências Políticas em Paris, é jornalista e trabalha na Rádio Miami.

 

http://www.sul21.com.br/jornal/o-controle-do-que-vemos-ouvimos-e-lemos-1-por-raul-antonio-capote-e-salvador-capote/

https://www.alainet.org/pt/articulo/171154

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