FMI: 'o alívio da dívida tem que ser muito maior do que o que foi proposto'
- Opinión
A crise grega não perdoa ninguém. As diferenças entre o FMI e a Alemanha sobre a reestruturação da dívida grega dividiram a Troica, e expõe o debate entre uma Comissão Europeia dominada por Angela Merkel e um Banco Central Europeu (BCE) que deixou pelo caminho toda pretensão de independência política. A viagem do ministro de economia estadunidense Jack Lew à Alemanha, nesta quinta, é sinal de que a crise causou um conflito evidente na relação entre os Estados Unidos e a União Europeia. Um voto negativo do parlamento alemão à negociação de um resgate à Grécia, nesta sexta, poderia destruir tudo em questão de segundos.
Nas últimas duas semanas, o FMI disparou com artilharia pesada para que a Alemanha aceitasse a necessidade de reestruturar a dívida grega. No dia 2 de julho, três dias antes do referendo, o organismo indicou que a reestruturação era imprescindível, um argumento que caiu como uma luva para as pretensões de Alexis Tsipras, em sua campanha pelo “Não” à austeridade. Nesta quarta, antes do debate das leis exigidas pelo Eurogrupo no Parlamento Grego, o Fundo reforçou essa declaração com números incontestáveis.
Pelos cálculos do FMI, a dívida grega hoje é “insustentável”: 177% do PIB, e chegaria a 200% em 2018. “Se espera que a Grécia tenha um superavit fiscal primário de 3,5% do PIB, algo que poucos países são capazes de alcançar”, aponta em sua avaliação, “…o alívio da dívida tem que ser muito maior do que o que foi proposto”. Com o apoio do presidente Barack Obama, e do ministro de economia Jack Lew, curiosos aliados do Syriza nesta “casa da mãe joana” que se transformou a Zona Euro hoje, o FMI deixo claro que só participará da negociação e de um eventual acordo com a Grécia se houver uma proposta séria de reestruturação sobre a mesa.
A mensagem será reforçada pelo ministro de economia estadunidense, que iniciou nesta quinta uma turnê de dois dias na Europa, que incluem visitas a Frankfurt (sede do Banco Central Europeu), Berlim (sede do parlamento e do governo alemão) e Paris. Numa conferência de imprensa, pouco antes de sua chegada ao velho continente, o presidente do Banco Central Europeu (BCE), o italiano Mario Draghi, anunciou um aumento de 900 milhões de euros da linha de emergência para os bancos gregos, montante ínfimo, mas de forte simbolismo.
O congelamento desta linha de crédito foi decisiva, no final de junho, para asfixiar financeiramente os bancos e forçar a capitulação de Tsipras. Uma medida que parecia mandar às favas a autonomia política do BCE. Segundo o Financial Times, “o BCE enfrenta acusações de não cumprir com sua missão de defender a estabilidade financeira e atuar como prestamista de última hora”. No dia 9 de julho, a Alcimos, uma empresa financeira que opera na Grécia, iniciou demanda contra o BCE na corte europeia, por prejuízos econômicos.
O FMI também saiu mal visto dessa situação. Segundo a BBC, Philippa Malmgren, ex-assessora econômica de George Bush, “seus erros foram monumentais, e a pergunta é: se não podem salvar a Grécia, o quê poderão fazer quando vierem problemas mais graves, como o da França?” Salvaguardar a credibilidade do FMI, diante do desafio de competir com o Banco de Investimentos de Infraestrutura da Ásia e, em menor medida, com o Banco de Desenvolvimento dos Brics, é fundamental para Estados Unidos. “A China e outros países exigem mudanças no FMI, não conseguiram e agora estão buscando alternativas. Não nos equivoquemos. O que querem hoje é substituir o FMI”, afirmou Malmgren.
Ninguém acredita que a negociação do resgate grego, baseada na proposta do Eurogrupo, terá futuro a médio prazo. No debate parlamentário em Atenas, sobre as leis exigidas para o resgate, o primeiro-ministro Alexis Tsipras e seu ministro de economia, Euclid Tsakalotos, reconheceram que não tinham “muita confiança” nas medidas, mas que as impulsavam para evitar uma catástrofe. Se não houver nova oferta de reestruturação e o FMI cumpre sua ameaça de não participar do resgate, a negociação entre o Eurogrupo e a Grécia ficaria exposta a questionamentos legais, já que o texto acordado considera essencial a presença do Fundo.
A proposta poderia naufragar nesta sexta, se o parlamento alemão não a aprova. Segundo o indicado à Carta Maior pelo ex-vice-ministro de economia alemão Heiner Flassbeck, hoje chefe de economistas da UNCTAD (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, em sua sigla em inglês), a maioria parlamentar da coalizão entre o conservadorismo cristão e os social-democratas deveria ser suficiente para evitar qualquer rebelião. “Eles têm dois terços do parlamento. Com isso, deveria ser suficiente. Contudo, não vai mudar a natureza da proposta, que é um desastre para a Europa, para a Grécia e para a própria Alemanha, porque é um programa restritivo, em meio a uma depressão econômica. Isto é exatamente o oposto do que a Grécia necessita. Cedo ou tarde, será inviável, será um novo fracasso”, indicou.
Créditos da foto: Présidence de la République française
17/07/2015
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