Respeito ao voto popular
- Opinión
O que pretendem os golpistas com o impedimento da presidenta Dilma: revogar direitos dos trabalhadores, retirar direitos previdenciários e extinguir programas sociais como Bolsa Família. Querem também, a todo custo, revogar a lei que instituiu o regime de partilha na exploração de petróleo, que garante ao Estado brasileiro o domínio sobre as reservas do pré-sal
A política brasileira vive hoje um dos cenários mais impensados da sua recente democracia. Mesmo com o fim das eleições presidenciais ainda se vive uma conjuntura de disputa pelo poder travada em grande parte com atitudes antidemocráticas, fascistas e perigosas sob a óptica do respeito à Constituição Federal. A sensação vivida hoje no Congresso é de profundo desalento ao se vivenciar uma crise política institucional gerada por uma oposição que torce contra o Brasil. Uma oposição que atua não contra o governo de Dilma Rousseff – atitude que seria legítima, batalha normal do jogo político e da multiplicidade de forças partidárias –, ela age sim contra os brasileiros ao apostar no quanto pior, melhor. A verdade é que sabotam o país, agindo a cada dia com mais e mais irresponsabilidade.
O ápice desse crítico panorama, que se arrasta desde o encerramento das eleições, se alcançou com a decisão do presidente da Câmara dos Deputados, deputado Eduardo Cunha, de autorizar a abertura do processo de impeachment contra a presidente da República, Dilma Rousseff, no último dia 2 de dezembro. O pedido foi formulado pelos juristas Hélio Bicudo e Miguel Reale Júnior com o apoio da oposição. O documento trata de acusar a presidenta Dilma de descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal ao ter editado decretos liberando crédito extraordinário sem autorização do Congresso Nacional. Acusação essa que não se sustenta sob nenhum ponto de vista. Não há motivo algum para o impedimento, Dilma não cometeu, em momento algum, crime de responsabilidade.
Essa proposta de romper o regime democrático, de impor um golpe, não será vitoriosa porque existem forças neste país que não são só as forças de esquerda, são as forças democráticas que entendem que nós temos que preservar o respeito à democracia e, fundamentalmente, o respeito ao voto popular. O voto popular não pode ser conspurcado, não pode ser pisoteado. E o povo demonstrou isso no último dia 16. Milhares de pessoas foram às ruas dizer: não vai ter golpe. Mesmo com a sabotagem clara da mídia, a população foi às ruas lutar. Estamos vendo a cada dia manifestações e mais manifestações de lideranças, intelectuais, sindicalistas, do povo brasileiro dizendo que não vai haver golpe! Não vamos deixar que isso aconteça, vamos lutar no Congresso e nas ruas.
São notórias e amplamente criticadas também as circunstâncias em que o pedido de abertura de impeachment foi aceito na Câmara. Já que Cunha deflagrou o pedido de impedimento da presidenta ao ter seus interesses contrariados no Conselho de Ética com a decisão do PT de votar pela admissibilidade das investigações. O motivo torpe – uma clara retaliação – demonstra a falta de legitimidade de Cunha para conduzir o processo. Essa é a maior das artimanhas que se presta a oposição para tentar impedir que continue na Presidência da República quem obteve a maioria dos votos nas eleições. Dilma Rousseff ganhou legitimamente no voto. Agora tenta-se, de forma sorrateira, golpista, impedi-la de governar. Mas nós queremos construir um Brasil democrático e soberano. Nós queremos construir um Brasil de oportunidades para todos. E é exatamente esse projeto que a oposição está contestando.
Não tenham dúvida de que o objetivo do impedimento da presidenta é exatamente reverter esse processo que tanto avançou nos últimos anos. Hoje milhões de brasileiros têm a cabeça erguida porque sua vida melhorou, porque podem se manifestar livremente, podem se afirmar política e socialmente. Esse processo incomoda a elite, incomoda os que querem manter um país de casa-grande e senzala. Eles querem manter uma minoria ganhando muito e uma grande maioria oprimida e vivendo na miséria. Mas isso não será mais possível. Pensam que, a partir do impedimento da presidenta Dilma, poderão revogar direitos dos trabalhadores, retirar direitos previdenciários e extinguir programas sociais como Bolsa Família. Querem também, a todo custo, revogar a lei que instituiu o regime de partilha na exploração de petróleo, que garante ao Estado brasileiro o domínio sobre as reservas do pré-sal. Querem entregar essa riqueza nacional para as potências estrangeiras. Mas tudo isso não será possível, o povo não vai abrir mão dessas conquistas.
Sendo assim, todo esse panorama de acirramento das disputas contribui diariamente para uma instabilidade no Congresso, no governo e, especialmente, na economia. É claro que a crise econômica internacional reflete no Brasil. E causa impactos consideráveis, especialmente com a queda nas commodities. Contudo, a persistente instabilidade política é o principal elemento de agravamento do cenário porque paralisa o país e em parte o governo federal. Ao se projetar um futuro cenário, diria que cessada a crise política o Brasil poderá equilibrar as contas e adotar medidas de ajustes para seguir avançando no caminho do crescimento e do desenvolvimento social. Precisamos urgentemente colocar o trem nos trilhos, e a oposição, em especial o PSDB, precisa se unir aos esforços para enfrentar a crise econômica. Ações que requerem atuação preponderante do Congresso, como adoção de medidas de controle do déficit público, incentivo às exportações e mudanças na política de juros.
Resumindo, a decisão do Supremo Tribunal Federal zerou o jogo, restabelecendo o rito democrático no plenário da Câmara dos Deputados. E o respeito ao Estado de Direito. Em realidade, liquidou as manobras golpistas do chantagista Cunha e do PSDB. Esse processo de impeachment precisa ser pautado pela ampla defesa, princípio do contraditório, das garantias previstas na Constituição Federal e respeito às normativas da Câmara e do Senado. E foi isso que o STF determinou: regras claras e respeito aos preceitos legais. O recado fica nítido: golpistas não passarão. Nós, do PT, do governo, vamos travar no Congresso uma batalha dura para impedir que esse golpe manche nossa democracia. E lutar para colocar fim nessa crise política para que possamos seguir trabalhando em prol de melhorar a vida do povo brasileiro.
- Carlos Zarattini é economista, deputado federal (PT/SP) e vice-líder do PT na Câmara dos Deputados
Edição 143, 21 dezembro 2015
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