Permitir Gilmar Mendes julgar o governo é o mesmo que aceitar a escalação do Presidente do Flamengo como juiz de Fla-Flu

20/03/2016
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Gilmar Mendes julgando atos do governo Dilma? Gilmar Mendes impedindo a Presidente de exercer uma das faculdades constitucionais mais primárias – para não dizer prosaicas –, como a de nomear ou exonerar qualquer pessoa para seu Ministério ou para qualquer cargo do Poder Executivo? Aceitar isso é o equivalente a aceitar como válida uma cédula de 3 reais.

 

É visível que Gilmar Mendes, que foi o Advogado-Geral da União do FHC e depois indicado pelo tucano para o STF, não consegue conter seu desejo obsessivo de inviabilizar e impedir o funcionamento do governo. Esta obsessão já alcançou as raias da histeria, da irracionalidade e do descontrole.

 

O sistema jurídico brasileiro está seriamente ameaçado pela partidarização e pela instrumentalização do Poder Judiciário [e da Polícia Federal] na luta política fascista que visa a eliminação de inimigos ideológicos. Existem justiceiros – uns maus funcionários públicos - que usam a toga como disfarce para a atuação partidária de oposição ao governo.

 

Como Ministro da Suprema Corte, ao invés de conspirar, Gilmar deveria ser um guardião de primeira linha da defesa do mandato conferido à Presidente Dilma por 54.501.118 pessoas. Se esse é o ensinamento que Gilmar transmite aos alunos do Instituto de Direito Público, faculdade da qual ele é sócio-proprietário, coitados daqueles [de]formados naquele forno ideológico.

 

Como Juiz do STF, aliás, ele recebe um salário nababesco para exercer com plena independência e soberania a função de julgador. Como funcionário público com dedicação exclusiva, ele pode desempenhar ao mesmo tempo atividade empresarial e receber pagamento de uma fonte de renda paralela? O Instituto de Direito Público recebe recursos do governo federal a qualquer título, mesmo sendo ele um funcionário público com participação acionária na empresa?

 

O governo tem de tentar derrubar a liminar concedida pelo Ministro Gilmar Mendes de anulação da posse de Lula na Casa Civil, porque ele já proferiu publicamente sentença antecipada sobre o assunto, e por isso perdeu totalmente a imparcialidade de julgar. Permitir Gilmar Mendes julgar o governo, Lula e o PT seria o mesmo que aceitar a escalação do Presidente do Flamengo como juiz do Fla-Flu: o resultado é conhecido por antecipação.

 

O novo Advogado-Geral da União, o Ministro José Eduardo Cardozo, tem dois exemplos valiosos de como agir contra este novo abuso cometido pelo condomínio jurídico-midiático-policial para desestabilizar o país e acirrar o confronto.

 

Em primeiro lugar, José Eduardo poderia se inspirar na postura política e institucional do seu sucessor no Ministério da Justiça, Eugênio Aragão, que em 15 minutos no cargo fez pela normalidade jurídico-institucional muito mais do que ele fez em quase seis anos na função.

 

Em segundo lugar, e sem maiores esforços de trabalho, José Eduardo poderia simplesmente transcrever os argumentos do Presidente do STF Ricardo Lewandowski escritos no artigo Judicatura e dever de recato, para peticionar a anulação da liminar concedida por Gilmar Mendes ao PPS e ao PSDB, assim como para pedir o impedimento deste posicionado Juiz julgar assuntos sobre os quais antecipou juízo de valor na mídia.

 

Diz o Presidente do STF:

 

O Código de Ética da Magistratura, consubstanciado na Resolução 60, de 2008, do Conselho Nacional de Justiça, consigna, logo em seu artigo 1º, que os juízes devem portar-se com imparcialidade, cortesia, diligência, integridade, dignidade, honra, prudência e decoro. A incontinência verbal pode configurar desde uma simples falta disciplinar até um ilícito criminal, apenada, em casos extremos, com a perda do cargo, sem prejuízo de outras sanções cabível.

 

A Lei Complementar nº 35, de 1979, estabelece, no artigo 36, inciso III, que não é licito aos juízes ‘manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos ou em obras técnicas ou no exercício do magistério.

 

O prejulgamento de uma causa ou a manifestação extemporânea de inclinação subjetiva acerca de decisão futura, nos termos do artigo 135, V, do Código de Processo Civil, caracteriza a suspeição ou parcialidade do magistrado, que permitem afastá-lo da causa por demonstrar interesse no julgamento em favor de alguma das partes.

 

Por mais poder que detenham, os juízes não constituem agentes políticos, porquanto carecem do sopro legitimador do sufrágio popular. ... Em países civilizados, dentre eles o Brasil, proíbe-se que exerçam atividades político-partidárias, as quais são reservadas àqueles eleitos pelo voto direto, secreto e universal e periódico.

 

O protagonismo extramuros, criticável em qualquer circunstância, torna-se ainda mais nefasto quando tem o potencial de cercear direitos fundamentais, favorecer correntes políticas, provocar abalos na economia ou desestabilizar as instituições, ainda que inspirado na melhor das intenções.

 

Ricardo Lewandowski finaliza sua magistral explicação dizendo que “posturas extravagantes ou ideologicamente matizadas são repudiadas pela comunidade jurídica, bem assim pela opinião pública esclarecida, que enxerga nelas um grave risco à democracia”.

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/176168
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