Os atentados em Bruxelas e o futuro da União Europeia
- Opinión
A capital da Bélgica e da Europa foi atingida esta semana por dois atentados simultâneos, cuja autoria foi reivindicada pelo grupo extremista Estado Islâmico. Apesar do menor número de vítimas fatais na capital belga, cerca de 31, em comparação com os 130 mortos nos atentados de Paris em Novembro de 2015, os acontecimentos em Bruxelas estão carregados de significados simbólicos e de possíveis reverberações políticas dignas de nota.
Os atentados ocorreram em um contexto que remonta ao aprofundamento da crise dos refugiados e às dúvidas acerca do futuro do espaço Schengen. O crescente influxo de refugiados na Europa, que culminou na decisão unilateral da Alemanha de fechar suas fronteiras em Setembro de 2015, enfatizou a necessidade de criação de um plano conjunto no nível supranacional para lidar com a crise dos refugiados e suscitou rumores acerca da inviabilidade ou do possível fracasso do espaço Schengen, que garante o direito fundamental à livre circulação de pessoas entre os países que compõem esta área. Dois meses depois, os ataques cometidos por grupos extremistas em Paris revelaram que as células em ação se organizavam na Bélgica, expondo as possíveis desvantagens da ausência de fronteiras internas. Nesse contexto, criou-se no âmbito da União um projeto de emenda à regulamentação do espaço Schengen. Tal emenda reconhecia que a ameaça de ocorrência de atentados poderia partir dos cidadãos da União e, portanto, visava reforçar o controle nas fronteiras.1
Por intermédio de alegações relacionadas à segurança, tanto no que se refere à crise dos refugiados quanto no que se refere à ameaça de grupos extremistas, os Estados membros empreenderam ações individuais, em especial no que se refere ao controle das fronteiras, o que por sua vez aprofundou as dúvidas acerca do futuro do espaço Schengen, um dos símbolos da integração europeia.
Os atentados em Bruxelas, ocorridos três dias após o fechamento de um acordo entre União Europeia e Turquia para conter o influxo de refugiados na Europa, abrem precedentes para uma série de possíveis ações políticas em nome da segurança. Um ataque à Bruxelas, centro nervoso da União Europeia, pode enfraquecer os laços da integração e impulsionar decisões que reforcem a soberania nacional de cada um dos países membros, na medida em que é possível alegar que as decisões adotadas no âmbito da União não foram capazes de evitar ataques em duas capitais europeias, nem de gerenciar a situação dos refugiados de maneira rápida e exitosa. Nesse contexto em que os termos "terrorismo" e "refugiados" se mesclam, formando um emaranhado político e gerando confusões, em especial no imaginário da opinião pública, xenofobia e nacionalismos podem emergir, disputando espaço com o bom senso e com as decisões coletivas.
Embora o grupo extremista Estado Islâmico tenha reivindicado a autoria dos atentados, seus executores eram belgas, nascidos em Bruxelas. Esperamos que o mosaico de nacionalidades que compõe a cidade de Bruxelas, e que faz dela a segunda cidade mais cosmopolita do mundo, continue a existir segundo um equilíbrio harmônico, refletindo o espírito de integração da União Europeia, da qual Bruxelas é sede, e privilegiando decisões que estejam em consonância com o Direito Internacional e com o respeito à proteção internacional aos refugiados.
Em meio aos acontecimentos recentes, um debate sobre a eficácia das instituições europeias deve ganhar espaço. Os ministros do Interior e da Justiça dos países membros da União se reuniram em caráter extraordinário dois dias após os atentados para decidir a resposta do bloco frente a estes atos.
- Natália Costa é bacharel em Relações Internacionais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Assistente de Pesquisa na Cátedra e Rede UNESCO/UNU de Economia Global e Desenvolvimento Sustentável (REGGEN).
1 Proposal for a REGULATION OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL amending Regulation No 562/2006 (EC) as regards the reinforcement of checks against relevant databases at external borders. Disponível em: http://ec.europa.eu/dgs/home-affairs/what-we-do/policies/securing-eu-bor...