As raízes misóginas do golpe

26/04/2016
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Foto: comemoração misógina dos golpistas na Câmara em 17 de abril de 2016. odiomujeres brasil
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 Misoginia é uma palavra de origem grega que pode ser traduzida como “ódio às mulheres”. Trata-se de uma manifestação de desprezo, de repulsa ao gênero feminino e aos traços característicos do comportamento das mulheres.

 

Alguns autores vêm no comportamento dos misóginos não apenas ódio às mulheres, mas medo da sobreposição destas e do feminino ao mundo considerado como de domínio masculino. Não raras vezes o misógino utiliza-se da violência física ou simbólica como forma de expressão da sua repulsa.

 

Faço este breve apanhado inicial para caracterizar um dos mais odiáveis lemas do movimento golpista contra a Presidenta Dilma Rousseff, a expressão utilizada nos cartazes “tchau querida”. Não podemos negar que o Brasil ainda carrega um ranço patriarcal em vários dos seus espaços, para não dizer em todos. As mulheres ainda são raras no comando das grandes empresas e dos órgãos da administração pública e, mesmo tendo uma formação intelectual e técnica média maior do que a da massa trabalhadora masculina, recebem salários menores.

 

Apesar de conquistado um espaço significativo ao longo no tempo no mercado de trabalho, por méritos e não por concessão, as mulheres sofrem com a ausência de políticas públicas de inclusão produtiva, de saúde, da abertura no espaço de luta sindical e, acreditem, até com a falta de banheiros próprios nas empresas.

 

Alguns dos segmentos mais ocupados por mulheres no mundo do trabalho também são pródigos em denúncias de assédio moral e de desrespeito dos direitos trabalhistas, como telemarketing, venda de cosméticos, comercio de roupas, educação e triagem de resíduos sólidos, sem contar os serviços domésticos que apenas muito recentemente tiveram direitos e garantias de outros campos do mundo trabalho reconhecidos.

 

Mas, em termos reais, muitas mulheres com idade mais avançada, em regiões periféricas e cidades menores ainda estão condenadas ao trabalho doméstico não remunerado, que não é contabilizado pelas empresas capitalistas.

 

Dilma Rousseff, desde muito cedo, ousou romper com os limites impostos pelos conservadores, tanto que ainda na adolescência pegou em armas contra a ditadura militar, foi presa e torturada, como tantas outras jovens militantes. Graças aos seus méritos pessoais galgou espaço na administração pública até ser eleita Presidenta da República, levando consigo ideias de transformação social e de inclusão das mulheres. Basta ver que tanto o “Bolsa Família” como o “Minha Casa, Minha Vida” são programas centrados nas mulheres que, em regra, são as pessoas que realmente garantem a sustentação e subsistência de crianças, de jovens e das famílias.

 

Foi exatamente por este motivo que os golpistas resolveram expressar seus preconceitos de forma direta contra a Presidenta. Ao contrário de firmarem o debate político “golpe x impeachment”, a escumalha fascista que se organizou na Câmara dos Deputados no dia 17 de abril preferiu ir além, e soltar o slogan “tchau querida”.  A homenagem de Jair Bolsonaro (PSC-RJ) ao torturador de diversas mulheres, Coronel Carlos Alberto Ustra, foi apenas o coroamento do que há de pior da política brasileira, uma comprovação definitiva que dois fatores pesaram muito no movimento golpista: o preconceito e o ódio.

 

Na verdade, a Câmara acabou demonstrando muito mais do que o tradicional ranço golpista das nossas elites conservadoras. As reiteradas citações à Deus, à família e aos valores do conservadorismo são uma demonstração clara de que a direita não evoluiu e de que não aceita, de forma alguma, a derrota eleitoral e o pensar diferente, ainda mais se o movimento de ruptura for conduzido por uma mulher não sujeita aos padrões tradicionais de submissão.

 

A misoginia, o ódio em relação à presença de uma mulher no centro do poder esteve presente em todos os momentos da articulação dos golpistas, tanto que estes não deixaram, em momento algum, de manifestar a sua repulsa nos patéticos cartazes dando tchau à Presidenta.

 

 Sandro Ari Andrade de Miranda, advogado, mestre em ciências sociais.

 

Publicado em 25 de abril de 2016

 

 

 

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/177031
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