Estudo mostra impacto do Plano Temer no Bolsa Família Uma tragédia social

26/05/2016
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 familia pobre brasil
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Um dos programas de combate à pobreza mais bem-sucedidos no mundo, tido como exemplo pela Organização das Nações Unidas (ONU), o Bolsa Família poderá ser fortemente impactado pela gestão do presidente interino Michel Temer na área social.

 

Apesar de um anúncio oficial ainda não ter sido feito, os documentos “Uma ponte para o futuro” e “Travessia Social”, publicados pela Fundação Ulysses Guimarães, do PMDB, partido de Temer, bem como declarações de vários de seus ministros, indicam que a política social deverá sofrer grandes transformações, a começar pelo foco exclusivamente nos 5% mais pobres da população brasileira.

 

Com base no conteúdo desses documentos, a Fundação Perseu Abramo, do Partido dos Trabalhadores, elaborou um estudo que mostra o que muda para a população se tais medidas forem postas em prática, e até que ponto o Programa Bolsa Família (PBF) – um dos principais responsáveis pelo aumento de 10% do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do país entre 2000 e 2010 – ficará comprometido.

 

O resultado imediato é que 39,3 milhões de pessoas serão excluídas do programa.

 

Em 2014, de acordo com os dados da PNAD/IBGE daquele ano, havia em torno de 14,3 milhões de famílias em situação de pobreza (núcleos com três, quatro pessoas vivendo com R$ 176 por mês, em média). Em abril de 2016, 97,3% dessa pobreza estimada, ou 13,9 milhões de famílias, eram atendidas pelo Bolsa Família.

 

Se restrito aos 5% mais pobres, o programa passará a atender 3,4 milhões de famílias, ou cerca de 12,2 milhões de pessoas. Prováveis 10,9 milhões de famílias ficarão de fora e a cobertura média nacional da pobreza cairá para 23,7%.

 

“Só no Nordeste serão 7 milhões de famílias desassistidas”, afirma o geógrafo Ronnie Aldrin Silva, um dos responsáveis pelo estudo.

 

Com 717 mil beneficiários, a região Centro-Oeste, hoje com a maior cobertura média da pobreza, de 103,8%, passará a ter menor proporção de cobertura do país, com apenas 20% das famílias no perfil atendidas e 137,7 mil famílias. Em seguida, virá a região Norte, com 21,2% e 370 mil famílias, o Sul, com 21,8% e 236 mil famílias, Sudeste com 22% e 843 mil famílias e, por fim, Nordeste, com 25,9% e cerca de 1,8 milhão de famílias pobres atendidas.

 

Política social em novas bases

 

Segundo o presidente da Fundação Perseu Abramo, Marcio Pochmann, o Plano Temer, pelo que se deduz dos documentos do PMDB, traz uma mudança significativa na forma de enxergar a política social, bem diferente da que ficou consolidada na Constituição de 1988.

 

“Até os anos 80, o acesso à política social era meritocrático, restrito a quem tinha registro em carteira (40% dos trabalhadores em 1980); a Constituição de 88 inovou e tornou a política social universalista”, explica.

 

Significa que, desde então, todos os brasileiros, trabalhadores ou não, ricos e pobres, têm acesso ao sistema de proteção (amparo em casos de doença, desemprego, aposentadorias) e promoção (educação, treinamento, formação) social. O Plano Temer, de acordo com Pochmann, traz outra concepção, focalizada e não universal, introduzindo a ideia de que a política social “tem que se adaptar ao tamanho do orçamento”.

 

Ele lembra que entre 88 e os anos 2000 o gasto social no Brasil subiu de 13% para 23% do PIB, “o que é comparável aos países desenvolvidos, que costumam reservar em torno 1/5 do PIB para gastos sociais”.

 

O Bolsa Família foi concebido dentro da visão universalista. Tem sido responsável por manter 36 milhões de pessoas fora da linha da extrema pobreza e ainda conta com outras vantagens além da questão da renda, como o combate à evasão escolar, melhoria da saúde materno-infantil, inserção no mercado de trabalho, entre outras.

 

Além dos benefícios sociais evidentes, e celebrados mundo afora, o programa tem um impacto econômico que foi medido pelo IPEA: para cada R$ 1,00 gasto com o Bolsa Família, R$ 1,78 são adicionados ao PIB, já que as famílias mais pobres gastam praticamente tudo o que ganham.

 

Assim, os R$ 27,6 bilhões gastos em 2015 geraram um incremento de R$ 49,2 bilhões no PIB, cita o estudo. No total, o programa comprometeu 0,46% do PIB no ano passado, enquanto que nos Estados Unidos, por exemplo, os programas “focalizados” correspondem a 2% do PIB. Com as mudanças do Plano Temer, o Bolsa Família cairá para 0,11% do PIB. Essa economia, porém, nem tão significativa assim, deve vir acompanhada de uma grande regressão social.

 

Crédito da foto: CEERT – Centro de Estudos de Relações de Trabalho e Desigualdade

 

- Paula Quental é jornalista

 

25/05/2016

http://brasildebate.com.br/uma-tragedia-social-estudo-mostra-impacto-do-plano-temer-no-bolsa-familia/#sthash.uQbLAX7A.dpuf

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/177717
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