Brasil em liquidação, verdadeira Black Friday
Os entreguistas acham que o conteúdo nacional trava o desenvolvimento da indústria.
- Opinión
Na sexta-feira passada acompanhei do plenário o contundente pronunciamento do senador Paulo Paim (PT-RS), no qual ele denunciou a dramática situação do Polo Naval do município gaúcho de Rio Grande. A situação ali é desesperadora. Em 2013, 20 mil empregados do polo impulsionavam a indústria e o comércio da região. Hoje só restam 600 trabalhadores. Segundo relatos feitos a Paim por autoridades locais, o município foi vítima da nova política da Petrobras, que entre outros retrocessos iniciou um programa de cancelamento dos contratos de construção de plataformas para exploração de petróleo nos estaleiros do Brasil em favor de empresas de fora do país, especialmente da China.
Para confirmar a política entreguista, no dia seguinte, sábado, a "Folha de S.Paulo" trouxe como manchete de capa a informação de que o governo decidiu adotar um pacote de medidas cuja intenção é atrair R$ 371,2 bilhões em investimentos ao longo de dez anos e, com isso, dar mais impulso à economia. Será? Sabem quais são as medidas? Entre elas, a liberação do FGTS para aquisição de imóveis de até R$ 1,5 milhão, o aumento da faixa de renda para R$ 9 mil mensais na aquisição do Minha Casa, Minha Vida, venda de terras a estrangeiros, entrega de bens às Teles para ampliar a banda larga e a diminuição do conteúdo nacional para as licitações de petróleo e gás, o que impulsionava nossa indústria.
Definitivamente, este governo está cego, surdo e mudo para os anseios dos brasileiros. Essas iniciativas não vão trazer desenvolvimento e prosperidade, pelo contrário, vão concentrar ainda mais a renda. Assim como fez com o corte dos gastos e o que pretende com a reforma da Previdência e as mudanças nas leis trabalhistas, o principal foco de quem tirou a Dilma é privilegiar os mais ricos e, de quebra, dar o Brasil de bandeja para os interesses internacionais.
Por coincidência, também falei da tribuna do Senado sobre o estudo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) intitulado "A Política de Conteúdo Local na Indústria de Petróleo e Gás Natural". Esse trabalho mostra a inquietação do setor privado nacional com a intenção do governo de reduzir o conteúdo nacional na produção de bens e serviços no país. Não somos apenas nós do PT ou da esquerda que estamos perplexos diante desse cenário.
Segundo a Fiesp, que apoiou o impeachment, a revisão dessa política está sendo efetuada em um momento inoportuno, pois, dependendo de sua nova configuração, pode agravar a recessão e o desemprego, especialmente nos setores fornecedores de bens e serviços para extração e desenvolvimento de petróleo e gás natural. É o que está acontecendo com o Polo Naval do Rio Grande do Sul citado por meu colega Paulo Paim.
Os entreguistas acham que o conteúdo nacional trava o desenvolvimento da indústria. Só para lembrar, o pré-sal foi viabilizado com alto índice de conteúdo nacional, representando 46% da produção de petróleo no País. Nessas jazidas, a marca de 1 milhão de barris de petróleo por dia foi atingida em dez anos, enquanto a Petrobras necessitou de 45 anos para atingir seu primeiro milhão em produção de petróleo fora do pré-sal. Então, como o conteúdo nacional trava a produção? Isso é uma mentira. Nossa indústria é perfeitamente capaz. O que está por trás desse argumento é o interesse de empresas que querem fornecer para a Petrobras, mas não querem montar estrutura aqui, dar empregos aqui, repassar tecnologia para setores importantes ao nosso desenvolvimento.
Infelizmente, o ataque à indústria nacional não para na desconstrução das políticas de conteúdo nacional. Há também, de forma igualmente preocupante, o esvaziamento inexplicável do BNDES, há décadas o carro-chefe no financiamento de investimentos no país. Recentemente o banco devolveu R$100 bilhões para o Tesouro Nacional para pagar juros da dívida. Eram R$100 bilhões que estavam aportados lá, que poderiam estar sendo usados para financiar a nossa indústria com juro mais barato. Mas o dinheiro serviu para atender ao capital financeiro.
Como se vê, falta escrúpulo a este governo. Além de destruir a indústria naval brasileira, que tem por trás uma pujante cadeia produtiva, e de restringir o financiamento produtivo, querem permitir ainda a venda de terras para estrangeiros, ferindo a nossa soberania, e entregar para as empresas de telecomunicações os bilionários bens da União. É um acinte!
Assim como é um acinte o que estão fazendo com a política habitacional. Eles estão tirando o FGTS para financiar as moradias mais baratas e dando para quem pode comprar imóvel de até R$1,5 milhão. Não é essa faixa de renda que vai impulsionar a economia e criar empregos. É preciso aumentar o número de beneficiados da Faixa 1 do Minha Casa, Minha Vida, que são os mais pobres e justamente os que ajudam a movimentar a economia, principalmente nas pequenas cidades. O presidente Lula fez isso após a crise de 2008/09.
Nós estamos assustados com tudo que está acontecendo. Não há outra saída. É preciso ir para as ruas e denunciar sem medo essa gente que deu o golpe para destruir as conquistas e direitos do povo brasileiro e fazer a vontade dos ricos e poderosos. O governo afrontou a Constituição com a desculpa de que traria esperança e dias melhores, mas desde o início vem dando exemplo de que não passa de um governo entreguista e que só se preocupa com o andar de cima.
- Gleisi Hoffmann é Senadora pelo PT do Paraná. Foi diretora financeira da Itaipu Binacional e Ministra-Chefe da Casa Civil
20 de Fevereiro de 2017
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