O golpe é contra um projeto de país

30/03/2017
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Para os que têm dúvidas de que a operação da Lava-Jato é um Cavalo de Troia, que veio para acabar com o que restou de soberania no Brasil, e destruir o setor de engenharia nacional, recomenda-se atentar para a matéria divulgada pela imprensa neste sábado, dia 25. Segundo os jornais, a empresa Odebrecht passará a ter suas operações monitoradas, por profissionais indicados pelo MPF, do Brasil, e DoJ, dos EUA, que é o equivalente do governo americano, ao Ministério da Justiça, no Brasil.

 

A Odebrecht Defesa era responsável pela construção do submarino nuclear, e sua controlada, a Mecatron, responsável pela fabricação dos mísseis nacionais. Coincidência ou não, a empresa foi uma das primeiras atingidas pela Operação Lava-Jato, com a prisão de seu presidente, Marcelo Odebrecht, condenado a 23 anos de prisão.

 

No ano passado, ainda antes do impeachment, já tínhamos a informação que Sérgio Moro, e o procurador-geral da República Rodrigo Janot, atuavam em parceria com órgãos dos Estados Unidos contra empresas brasileiras. E que Sergio Moro, em 2016, autorizou o compartilhamento da delação premiada do ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró, com investigadores de Londres em processo contra a Petrobrás. O juiz autorizou também conversas feitas diretamente com cada delator da Lava-Jato e o Departamento de Justiça dos EUA, sem passar pelo Estado brasileiro, como prevê a lei. Ou seja, os responsáveis pela operação Lava-Jato permitem o acesso a órgãos do Estado norte-americano, a informações sigilosas, que são utilizadas para atacar e processar judicialmente a Petrobrás e outras empresas brasileiras. Como podemos nominar esse tipo de atitude, senão de entreguista? Como podemos chamar também a prisão do Vicealmirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, principal responsável pela conquista da independência na tecnologia do ciclo de combustível, que colocou o Brasil em posição de destaque na matéria, no mundo?

 

O governo que assumiu com o golpe é o mais subserviente e entreguista da história, nesse quesito, a ditadura militar não chega aos seus pés. Em pouco tempo do desgoverno golpista a lista de atrocidades é imensa. Está muito claro que os EUA não apoiaram o golpe no Brasil por simpatia a Temer, mas pelo interesse em petróleo, água, recursos naturais em geral, pela biodiversidade da Amazônia, assim como pelo interesse de abortar um incipiente é limitado processo de construção de um projeto nacional de desenvolvimento.

 

Somente um processo sofisticado de manipulação da população, poderia possibilitar o apoio a uma operação entreguista como a Lava-Jato, e aceitar com naturalidade o repasse ao Império do Norte, petróleo, água, minerais e território para instalação de bases militares. Soube-se que membros do Ministério Público envolvidos com a Lava-Jato estão explodindo de orgulho por estarem trabalhando em conjunto com os policiais do Departamento de Justiça do Estados Unidos, considerado muito eficientes. Ou seja, aquilo que poderia ser motivo de vergonha nacional, que é nutrir de informações uma potência estrangeira, que fornecerão elementos para prejudicar e processar a maior empresa nacional, motor da economia brasileira, é motivo de orgulho e deslumbramento para esse pessoal. Com polpudos salários pagos pelo povo brasileiro, atuam com órgãos dos Estados Unidos, sem qualquer constrangimento, contra empresas brasileiras, e achando isso bonito ainda. Atacando inclusive, a indústria Eletronuclear, com a prisão do seu mentor e líder maior.

 

As empresas estrangeiras, mesmo envolvidas em casos de corrupção, foram, o tempo todo, poupadas das investigações e pressões da Lava-Jato. Em 2015, a imprensa mostrava que 22 empresas internacionais com sedes na Itália, Holanda, EUA, Grécia e Cingapura foram citadas nas delações premiadas da Lava-Jato como envolvidas no esquema de corrupção da Petrobrás. Porém nada aconteceu com elas, as ações foram todas voltadas para as empresas brasileiras, especialmente, além da Petrobrás, a Odebrecht. As empresas estrangeiras continuaram a operar normalmente, inclusive expandindo seus investimentos no Brasil no período recente. Os responsáveis pela Operação não queriam nem que fosse aprovada, no começo de 2016, a lei de Leniência no Congresso. Um mecanismo que possibilita que, quando constatado o caso de corrupção, os responsáveis na empresa sejam punidos, porém a empresa (tecnologia, empregos, ativos), seja preservada. É difícil aceitar que a atitude se devia apenas à ignorância do que ocorre em outros países, ou por absoluto desconhecimento de princípios básicos de economia. Queriam mesmo quebrar as empresas. Os governos, a partir de 2003, ousaram praticar políticas minimamente soberanas, como a rejeição da Alca, e a organização do BRICS, que ameaça, inclusive a hegemonia do dólar, comprou aviões da Suécia, ao invés das empresas norteamericanas. Adquiriram helicópteros da Rússia e montou o projeto de submarino nuclear em parceria com a França. Encaminharam a votação, em 2010, da lei de

 

Partilha, contra o desejo das multinacionais do Petróleo. Além disso, se aproximou dos parceiros sul-americanos, fortaleceu o Mercosul e continuou o projeto de produção de enriquecimento de urânio, estratégico para o Brasil. Isto desagradou muita gente e a Lava-Jato veio para ajudar a interromper esse processo.

 

Desde o início da operação os indícios de que os objetivos centrais da Lava- Jato era quebrar a Petrobrás, abrindo caminho para mudar a lei de Partilha eram muito fortes: a) denúncias do Wikileaks de que os estadunidenses estavam preocupados com o crescimento da Odebrecht; b) grande contrariedade das multinacionais com a Lei de Partilha; c) financiamento, por parte dos bilionários do petróleo, Irmãos Kock, dos movimentos de direita no Brasil que tentavam desestabilizar o governo; d) visita do Procurador Geral da República aos EUA, com equipe de procuradores, para coletar informações que serviriam de munição para abrir processos contra a Petrobrás. Temos que entender o contexto no seu todo. A atual ofensiva contra a indústria da carne, por exemplo, que vem dos mesmos setores que querem destruir a Petrobras e que liquidaram com o setor de engenharia nacional, não está ocorrendo em função da exploração dos trabalhadores ou porque as políticas de meio ambiente são desrespeitadas. Até porque, a solução desses problemas não seria a destruição da ampla cadeia de beneficiamento de alimentos (que inclui operários, produtores integrados, transportadores, distribuidores, vendedores, veterinários), e dos milhões de empregos gerados pelo setor. É que o objetivo é destruir o que o Brasil ainda dispõe de indústria, liquidar a frágil malha de direitos sociais numa escalada nunca vista, e destruir o pouco que sobrou da soberania nacional. Mas a bola está em jogo e não está morto quem peleia.

 

José Álvaro de Lima Cardoso

Economista.

https://www.alainet.org/pt/articulo/184479
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