As lutas atuais contra a dívida ilegítima numa perspetiva histórica
- Opinión
CONTEÚDOS:
1. Introdução
2. Estudos de caso
2.1. Estudo de caso anglo-irlandês “Not Our Debt” que analisa a responsabilidade pela crise
2.2. Estudo de caso “15MpaRato” que analisa a transparência das dívidas contraídas
2.3. Estudo de caso “Debt Resistance UK” que analisa as instituições financeiras que ludibriam as autoridades locais
2.4. Estudo de caso “Rolling Jubilee” que mostra que é possível anular a dívida se houver vontade política
3. Auditorias à dívida: um movimento abrangente para denunciar dívidas
3.1. Objetivos das auditorias
3.2. Reflexões sobre a experiência da auditoria grega
4. Precedentes históricos do repúdio da dívida
4.1. Equador e Islândia
4.2. O repúdio da dívida nos EUA nos anos trinta do séc. XVIII
4.3. México: A luta bem sucedida contra a dívida nos séc. XIX e XX
4.4. O repúdio da dívida na Rússia Soviética
4.5. O repúdio da dívida na Costa Rica
4.6. A longa lista de anulações ou repúdios de dívida entre os séculos XIX e XXI
5. A doutrina da dívida odiosa
6. Conclusão
1. Introdução
A presença crescente de credores e de detentores de ativos na esfera do poder é uma característica generalizada da financeirização. Convém destacar dois aspetos da financeirização, que servem para compreender o contexto em que surgiram várias lutas recentes contra a dívida. O primeiro diz respeito à financeirização da vida quotidiana com o consequente aumento das dívidas privadas. O segundo aspeto diz respeito ao modo como a crise financeira foi gerida. A diminuição da prestação pública de serviços associada à era neoliberal, da qual a financeirização tem sido uma característica fundamental, levou à mercantilização dos serviços básicos e submergiu as pessoas em níveis crescentes de dívida privada. Os indivíduos ficaram cada vez mais dependentes de empréstimos para terem acesso a serviços básicos, como habitação, educação e saúde. Vários autores desta publicação analisam os detalhes e as variações nacionais desses processos.
Os fracassos do sistema financeiro que vieram à tona durante a crise financeira global foram encobertos pelo Estado e o custo avassalador do resgate do setor financeiro, por sua vez, criou dificuldades às finanças públicas. Os países foram apanhados por esquemas que convertem dívida privada em pública, fazendo aumentar o pagamento da dívida em detrimento de outras despesas. A adoção generalizada de medidas de austeridade empurrou esses custos para o setor público, que cobriu os prejuízos e as insolvências do setor bancário. Em certos casos, o setor financeiro chegou mesmo a morder a mão a quem lhe deu de comer, levando os Estados à bancarrota (Cutillas, 2014). A situação fez com que vários países da zona do euro pedissem ajuda oficial à Troika (BCE, FMI e Comissão Europeia) e foi particularmente nesses casos que o poder dos credores sobre os países se fez notar. Utilizando meios de retenção do crédito e retirando qualquer capacidade de manobra aos países endividados, foi-lhes imposta a austeridade e os grandes condicionalismos estruturais (Roos, 2016). Os métodos bola de neve, os negociantes de crédito, os agiotas, os oficiais de justiça e os credores multilaterais e internacionais trabalharam no sentido de manter a convicção de que é imperativo pagar. Mesmo quando se demonstra que a acumulação de dívida não foi usada para beneficiar os objetivos coletivos de uma população, o poder da alta finança permite que sejam exercidas pressões sobre Estados e indivíduos financeiramente dependentes.
Seguindo as pegadas históricas dos movimentos contra a dívida injusta que há muito existiam no Sul Global, uma infinidade de lutas surgiram combatendo a chantagem da dívida e a austeridade que dela resultou
A situação gerou todo o tipo de resistências, e marés de descontentamento varreram a Europa. Vários movimentos sociais que surgiram nessa época agitada tinham a dívida como pano de fundo. Seguindo as pegadas históricas dos movimentos contra a dívida injusta que há muito existiam no Sul Global, uma infinidade de lutas surgiram combatendo a chantagem da dívida e a austeridade que dela resultou.
Em articulação com académicos e ONG, as lutas contra a dívida tentaram denunciar as falhas da lógica económica da austeridade, que ostensivamente reivindicava possuir o remédio para as dívidas gigantescas, mas que, na verdade, levou apenas a que estas se acumulassem cada vez mais. Apresentada como uma solução para a crise, a austeridade tem um histórico pouco abonatório em termos de correção de desequilíbrios fiscais ou de solução de crises de endividamento, fazendo com que as lutas contra a dívida estejam inextricavelmente ligadas a argumentos contra a austeridade (Laskaridis, 2015).
As violações e a redução de direitos básicos provocadas por cortes, privatizações e consequente pobreza, necessárias para que a dívida seja paga, são frequentemente invocadas para justificar o argumento da justiça social. Embora a impossibilidade de pagar as dívidas, tanto a nível individual como nacional, seja uma realidade comum para muitos, estando na base de pedidos de perdão de dívida, essa não tem sido a principal reivindicação dos recentes movimentos de luta contra a dívida. Em vez disso, as lutas contra a dívida têm, em geral, adotado uma postura mais combativa, questionando a validade e a origem das dívidas contraídas. As iniciativas, sendo diversas, tentam investigar e deslegitimar o processo que leva à acumulação de dívida e mostrar que o benefício coletivo da população não é alcançado. Muitas vezes, a dívida cresce devido a custos excessivos, termos abusivos, refinanciamentos sucessivos, comissões e encargos cada vez maiores, bem como devido a corrupção e a escândalos (Fattorelli, 2014). Apesar de os credores tentarem manter a viabilidade e o pagamento das dívidas como algo inquestionável, os movimentos sociais começaram a questionar e a expor os mecanismos subjacentes à acumulação de dívida e à austeridade. Desta forma, desmascararam a lógica da austeridade e a dívida subjacente, imposta, foi deslegitimada.
O clima político em que os movimentos de luta contra dívida cresceram nos últimos anos foi parte integrante do coro alargado da insatisfação contra as estruturas políticas existentes. Apelos no sentido duma maior transparência e responsabilização, e de sanções significativas contra os responsáveis por crimes financeiros, juntaram-se ao esvaziamento das instituições oficiais que, agindo supostamente sempre em nome do povo, acabaram por atuar frequentemente em detrimento da maioria, e, portanto, perdendo legitimidade aos olhos de muitos. A título de resposta, muitos movimentos que lutavam contra a dívida, usando a autoorganização e as estruturas de base, resolveram tomar o destino nas suas próprias mãos; reuniram provas e fizeram investigações; constituíram processos legais contra banqueiros e resistiram a despejos, ocupando praças. Palavras de ordem gritadas nas praças públicas de vários países fizeram da dívida uma preocupação generalizada, reunindo grupos sob o lema “Não Devemos, Não Pagamos”, ou perguntando “Quem Deve a Quem?”, no sentido de tentar reverter a narrativa oficial e reforçar o poder dos devedores sobre os credores.
Muitos movimentos e estruturas de base reuniram provas, fizeram investigações, constituíram processos legais contra banqueiros e resistiram a despejos
Através de formas diversas, inovadoras e criativas, as lutas dos endividados revelaram a instabilidade e os limites da financeirização. Nesse enquadramento, o capítulo discute exemplos específicos de luta contra a dívida, que desafiaram a legitimidade das dívidas. A lógica desses desafios baseava-se no argumento de que a dívida e o seu pagamento eram ilegítimos, odiosos ou ilegais, constituindo uma violação dos direitos humanos básicos. Não pretendemos fazer um estudo exaustivo, mas sim tirar um conjunto de retratos, mostrando a diversidade das questões levantadas e as táticas usadas. Apesar de todos os movimentos terem características comuns, existe variação significativa em termos da abordagem adotada e do enfoque político, embora não nos detenhamos sobre isso. O objetivo desta secção é salientar alguns pontos em comum em termos de argumentação e de raciocínio. O capítulo discute depois exemplos históricos para mostrar que são possíveis e necessárias ações unilaterais e mobilizações populares para efetivamente desafiar o poder dos credores.
2. Estudos de caso
2.1. Estudo de caso anglo-irlandês “Not Our Debt” (Esta dívida não é nossa) que analisa a responsabilidade pela crise
Em 2007/8, a onda de incumprimento dos bancos decorrente do grande aumento da dívida privada, em particular do mercado de hipotecas de alto risco, teve consequências profundas. As quedas repentinas de instituições como a Depfa, Hypo Real Estate, Dexia, ABN Amro, Northern Rock, Royal Bank of Scotland, Fortis, Natixis mas também do Commerzbank, apenas para citar alguns exemplos, ficam para a história como espetaculares. A imposição da austeridade obrigou cidadãos e serviços públicos a pagarem a socialização da dívida privada, e, consequentemente, o pagamento da dívida foi amplamente questionado. As pessoas queriam saber por que razão aqueles que não eram responsáveis pelos problemas da dívida tinham de pagá-la por eles, enquanto os responsáveis pareciam estar imunes e impermeáveis a qualquer sanção.
Esta é também a perspetiva utilizada recorrentemente para analisar, a nível técnico, o poder e as prioridades da finança. Funciona como ponto de partida para aqueles que salientam e divulgam o duplo padrão subjacente ao pagamento da dívida: indivíduos e governos são moral e punitivamente forçados a pagar; as grandes corporações são luxuosamente apoiadas ou perdoadas. Os exemplos abundam, mas talvez o mais notório seja o que diz respeito ao Anglo Irish Bank e à campanha que surgiu para o desafiar: a anglo-irlandesa Not Our Debt.
As pessoas queriam saber por que razão quem não é responsável pelos problemas da dívida tinham de pagá-la, enquanto os responsáveis pareciam estar imunes a qualquer sanção
Em 2008, o governo irlandês anunciou uma das maiores garantias bancárias da história. O argumento de que os reguladores tinham adormecido ao volante, uma explicação comummente avançada para explicar a crise, parece insustentável à luz dos acontecimentos na Irlanda (ver: Sugarman, 2017). Após o colapso do banco foi acionado um esquema geral de garantias bancárias, que era superior ao dobro do PIB da Irlanda naquela época. A garantia cobria não apenas os depósitos bancários, mas também os detentores de obrigações dos bancos, fazendo com que os principais beneficiários da garantia fossem os próprios credores dos bancos insolventes da Irlanda. Entre os bancos incluídos na garantia estava o Anglo/INBS, com o governo a pagar 4 mil milhões de euros em 2009 para cobrir as dívidas de instituições que nitidamente estavam cada vez mais insolventes.
A Campanha anglo-irlandesa Not Our Debt lançou amplas ações de consciencialização pública para revelar injustiças e propor alternativas para a dívida inglesa. Foram feitas comparações importantes sobre a escala de pagamentos. Por exemplo, a Campanha mostrou que “o pagamento da nota promissória de 3 100 mil milhões de euros em 31 de março de 2012 teria sido mais do que suficiente para financiar o custo total de funcionamento de todo o sistema escolar primário da Irlanda durante um ano”. Simultaneamente, a Campanha reivindicou políticas alternativas que implicassem a redução dos pagamentos e a anulação das dívidas inglesas (Not Our Debt inglesa, 2012).
A campanha divulgou a sua mensagem através de métodos abrangentes de educação popular. Criou vários recursos educativos, power points, panfletos informativos, palavras de ordem e vídeos mobilizadores para desmascarar mitos e descodificar o jargão muitas vezes complexo e técnico. Através destas ferramentas inovadoras e criativas, a campanha apelou para que as pessoas se mobilizassem e organizassem em torno da preocupação principal: “Até 2031, o povo da Irlanda irá reembolsar uma dívida de 47 mil milhões de euros pela qual não tem qualquer responsabilidade. Isso corresponde a 30 % do PIB da Irlanda” (Not Our Debt inglesa, 2012).
2.2. Estudo de caso “15MpaRato” que analisa a transparência das dívidas contraídas
Os contratos de dívida surgem envoltos em escândalos de corrupção e muitas vezes as dívidas são contraídas de forma ilegítima. Os resgates públicos de práticas bancárias corruptas e fraudulentas provocaram grande descontentamento e várias campanhas foram criadas para divulgar os escândalos bancários. Uma iniciativa para acabar com a impunidade dos banqueiros teve lugar em Espanha, em torno das atividades nefastas do Bankia. Acusado de várias infrações, tais como a venda fraudulenta de produtos ao público, informação falsa sobre flutuação de ações e grande corrupção ao nível dos quadros superiores, o Bankia tornou-se rapidamente no principal símbolo espanhol de escândalos financeiros. A Caja Madrid foi uma das seis caixas de aforro regionais que constituíam o Bankia em 2010 cuja falência subsequente exigiu um forte resgate por parte da UE. Foram encontrados cartões de crédito não declarados, destinados a facilitar a corrupção e o suborno ao nível dos quadros superiores do banco, que foram usados para a obtenção de todo o tipo de benefícios privados, mesmo após os problemas financeiros óbvios que a instituição enfrentava e a sua incorporação no Bankia.
No aniversário do movimento 15M em Espanha, os cidadãos reuniram-se em praças públicas e divulgaram um plano para acabar com a imunidade dos banqueiros, que era perpetuada através de simples demissões e reformas (ver: Grueso, 2012). Como as autoridades não estavam dispostas a investigar ou a questionar as responsabilidades pelos colapsos financeiros, os cidadãos levaram a cabo um processo de automobilização para tentarem sozinhos “derrubar os banqueiros”. Dois movimentos sociais, 15MpaRato e XNET, concertaram esforços no sentido de criar plataformas online inspiradas pelo WikiLeaks, para facilitar a divulgação de informação e a partilha das queixas dos cidadãos. Bancários, entre outros, enviaram documentos para uma caixa de correio on-line anónima, com provas dos erros cometidos, e ativistas lançaram uma campanha coletiva para angariar fundos para avançar com um processo judicial. As ações judiciais cidadãs são parte integrante da luta política pela anulação da dívida ilegítima, e vários movimentos combinam a luta com a tradução da retórica política em linguagem jurídica. A ação judicial cidadã tem como objetivo “responsabilizá-los [os banqueiros] pela crise económica” e é fundamental na recolha de documentação necessária para revelar todo tipo de truques e fraudes.
Como as autoridades não estavam dispostas a questionar as responsabilidades pelos colapsos financeiros, os cidadãos [espanhóis] mobilizaram-se para tentarem sozinhos “derrubar os banqueiros”
O alto nível de corrupção e a falta de responsabilização fizeram com que os cidadãos recorressem aos seus próprios meios e criatividade para que fosse feita justiça. Como um membro da campanha Bankia referia: “Em países com alto nível de corrupção, as instituições responsáveis por combater esse mau funcionamento são elas mesmas corruptas… Os cidadãos têm, eles próprios, de auditar os governos e as multinacionais … Tem de se começar por pequenos grupos e movimentos de base” (Ueberschlag, 2016). Depois de uma perseguição persistente, Rodrigo Rato, ex-ministro das finanças espanhol (1996-2000), ex-vice-primeiro-ministro, ex-diretor executivo do FMI (2004-2007) e presidente do Bankia durante esse período crucial (2010-2012), foi considerado culpado de peculato em 2017 e condenado a mais de 4 anos de prisão.
Há uma outra iniciativa em andamento em Espanha que vale a pena mencionar, porque representa uma batalha contra a dívida ilegítima levada a cabo por representantes eleitos. Em outubro de 2016, o Manifesto de Oviedo foi tornado público. Já assinado por mais de mil representantes eleitos (entre os quais vereadores, deputados e deputados europeus) e ativistas, este documento compromete-se a apoiar “a criação de uma associação espanhola de municípios, comunidades autónomas e nacionalidades que questionam a dívida ilegítima e trabalham para a impedir; uma organização (…) que possa encontrar recursos financeiros legítimos para os cidadãos garantirem a proteção dos seus direitos económicos, sociais, culturais, cívicos e políticos” (Manifesto de Oviedo, 2016). O documento apela para o lançamento de auditorias à dívida nas administrações locais com participação cidadã. No âmbito deste manifesto, foi lançada a rede municipal contra dívidas ilegítimas e cortes fiscais (Red Municipalista contra la Deuda Ilegítima y los Recortes), reunindo representantes de mais de setenta municípios, bem como de regiões autónomas. O objetivo desta rede é unir esforços no sentido de investigar o papel e as origens da dívida pública atual, dar prioridade à satisfação do interesse geral em detrimento dos interesses dos credores privados, e colocar as instituições representativas e os movimentos sociais a lutarem em conjunto no sentido da remunicipalização dos serviços públicos (Duval e Martín, 2017).
2.3. Estudo de caso “Debt Resistance UK”(Resistência à dívida no Reino Unido), que analisa as instituições financeiras que ludibriam as autoridades locais
O fornecimento de informações oportunas, precisas e críticas tem sido crucial para galvanizar ações contra os credores. A investigação crítica é necessária para desmascarar as narrativas vigentes, muitas vezes justificadas com argumentos pouco convincentes apenas para poder impor a austeridade. É preciso investigar para divulgar e analisar o funcionamento da alta finança, das grandes multinacionais e os seus impactos sociais.
A investigação crítica do funcionamento da alta finança e das grandes multinacionais é necessária para desmascarar as narrativas vigentes, muitas vezes justificadas com argumentos pouco convincentes apenas para poder impor a austeridade
A Debt Resistance UK, um grupo que luta contra as dívidas ilegítimas e injustas no Reino Unido, lançou uma ampla campanha para revelar como foi possível as autarquias locais contraírem empréstimos caros e arriscados (empréstimos LOBO) e ao mesmo tempo cortarem serviços essenciais. Fazendo investigação com o fito na ação, o grupo fez numerosos pedidos para que fosse libertada informação no sentido de ser revelada a dimensão do problema, trazendo-o para a praça pública. A exposição pública fez títulos de jornais no Reino Unido, ajudando a campanha a ganhar publicidade. A investigação estimulou também o poder das iniciativas locais. A informação foi disponibilizada e os residentes em autarquias afetadas foram apoiados e incentivados a atuar junto das autoridades locais.
2.4. Estudo de caso “Rolling Jubilee” (Jubileu Rolante) que mostra que é possível anular a dívida se houver vontade política
Nos EUA, o Rolling Jubilee lançou uma iniciativa ousada para mostrar as injustiças do sistema atual. Um jubileu é uma anulação de dívida que limpa o ‘cadastro’ daqueles que estão presos a dívidas, e a anulação de dívida tem sido uma solicitação generalizada nos últimos tempos. O projeto Rolling Jubilee foi capaz de responder a esses pedidos, criando “um resgate do povo pelo povo”: constituiu uma plataforma de crowdfunding (financiamento coletivo) para juntar dinheiro com o objetivo de comprar empréstimos em incumprimento e de os anular. Até ao momento, mais de 700 000 dólares foram arrecadados e mais de 31 milhões de dólares em dívidas foram anulados. Como consequência imediata, devedores, escolhidos ao acaso, foram libertados das suas dívidas e deixaram de ser perseguidos pelos cobradores de dívidas. A iniciativa mostra a natureza predatória do sistema financeiro, porque, embora os bancos possam vender esses tais empréstimos por pagar e dívidas em incumprimento por uma ninharia, os compradores dessas dívidas tentam cobrar o valor todo. A campanha revela que as anulações de dívida não são apenas desejáveis, são também viáveis, concluindo que “juntos podemos libertar os devedores aleatoriamente através de uma campanha de apoio mútuo, boa vontade e recusa coletiva” (Rolling Jubilee).
O Strike Debt combate a financeirização no seu todo, desde a dívida privada à dívida pública, fornecendo táticas específicas para entender o sistema de dívida e lutar contra ele
O Rolling Jubilee surgiu do coletivo Strike Debt (“Greve à Dívida”), que foi criado nos EUA no âmbito do movimento Occupy Wall Street (“Ocupem Wall Street”). Tendo como principal objetivo combater a angústia que assolava as famílias e os indivíduos endividados, o movimento alargou o seu âmbito, ao denunciar que, com os cortes orçamentais e outras medidas de austeridade que acompanhavam o processo de financeirização, havia uma inversão do “ónus do sustento da ‘vida’ que passa do Estado para o indivíduo e para o agregado familiar”, levando à conclusão de que assim: “agora somos todos devedores” (Strike Debt, 2012: 52). O Strike Debt é, portanto, um movimento de luta contra a dívida em sentido amplo, combatendo a financeirização no seu todo, desde a dívida privada à dívida pública. Em setembro de 2012, lançou o Debt Resistors’ Operations Manual (“Manual de Operações de Resistência à Dívida”), que “visa fornecer táticas específicas para entender o sistema de dívida e lutar contra ele com o objetivo de todos podermos recuperar as nossas vidas e as nossas comunidades” (Strike Debt, 2012: v).
3. Auditorias à dívida: um movimento abrangente para denunciar dívidas ilegítimas
Os movimentos de auditoria à dívida surgiram como um meio de contrariar a narrativa oficial sobre o imperativo inabalável de pagar a dívida. Embora pareça ser um ato tecnocrático, o objetivo das auditorias não é um exercício de contabilidade rotineira, mas sim uma tentativa de iniciar um amplo movimento de participação cívica para reforçar os processos democráticos e confrontar o poder financeiro instalado. Os ‘auditores’ são todas as pessoas que queiram participar, representantes de movimentos sociais e do movimento sindical, empregados, desempregados, etc. As auditorias à dívida são ferramentas para envolver as pessoas na investigação sobre o impacto que a acumulação de dívida tem tido na economia e na população.
O objetivo das auditorias não é a contabilidade rotineira, mas sim uma tentativa de iniciar um amplo movimento de participação cívica, reforçar os processos democráticos e confrontar o poder financeiro instalado
Uma nova geração de movimentos de luta contra a dívida, que colocou a auditoria no centro das suas atividades, surgiu nos últimos anos, inspirada pelas metas e objetivos dos movimentos pela justiça global contra a dívida em atividade nas últimas duas décadas, por exemplo, o Jubilee 2000, o CADTM e o Jubilee South. Essas organizações há muito lutam contra o uso e abuso da dívida como transferência ilegítima de recursos, desencadeando ações como a Who Owes Who (“Quem Deve a Quem”) para desafiar e reverter a noção tradicional de que os devedores devem aos credores (Millet-Toussaint, 2004). Os movimentos pela justiça global contra a dívida criaram todo tipo de iniciativas para anular dívidas ilegítimas e injustas, deixando atrás de si uma vasta experiência. Exemplos emblemáticos que inspiraram os atuais movimentos de luta contra a dívida incluem iniciativas oficiais, tais como a Comissão de Auditoria Integral de Crédito Público do Equador (CAIC), ou as iniciativas cidadãs do Brasil ou das Filipinas.
Em 2012, havia uma grande diversidade de grupos euro-mediterrânicos de auditoria cidadã no ativo; uma plataforma com 12 países participantes, alguns com mais de uma iniciativa, resolveu unir esforços e partilhar as experiências das redes e movimentos participantes. A International Citizen Audit Network (“Rede Internacional de auditorias cidadãs” / ICAN) foi, num primeiro momento, albergada pelo CADTM na Bélgica, e criou o espaço necessário para a partilha de informações sobre as várias auditorias ou outro tipo de lutas contra a dívida (ver: ICAN, 2012). A plataforma preencheu um espaço vital de partilha de informações, onde os grupos se podiam conhecer e inspirar mutuamente, por lidarem com questões semelhantes. A iniciativa permitiu a partilha de ferramentas e de recursos, mas também a discussão de ações e de estratégias de mobilização em que cada um estava envolvido. A plataforma ajudou a consolidar uma rede internacional onde era possível colaborar e manifestar solidariedade, identificar dias importantes de ação comum e planos para coordenar atividades coletivas.
3.1. Objetivos das auditorias
A observação do processo de formação de dívida tem um objetivo educacional alargado. Facilita a educação popular sobre um assunto que comummente utiliza termos e processos considerados complicados e opacos. As auditorias podem também funcionar como repositórios de conhecimento sobre um determinado local, e um meio para troca de informações sobre os mecanismos da dívida, operando, por exemplo, em autarquias locais, empresas estatais, ministérios, e tendo como base as contribuições de todos os participantes. Sendo um processo educativo, a auditoria é também fundamental para o desenvolvimento de argumentos e provas que permitam responsabilizar governos e autoridades pelos seus empréstimos. Pode ajudar os movimentos a articularem reivindicações sobre a anulação da dívida ou mobilizar procedimentos legais contra as dívidas ilegítimas, ilegais e injustas. Nesse sentido, pode ser um catalisador de mobilizações pela justiça social (ver: Fattorelli, 2014).
As auditorias podem funcionar como repositórios de conhecimento e troca de informações sobre os mecanismos da dívida em autarquias, empresas estatais, ministérios. Nesse sentido, podem ser um catalisador de mobilizações pela justiça social
Melhorar a responsabilização e a transparência, capacitar os cidadãos e reforçar o seu poder no sentido de supervisionarem e questionarem “os atos daqueles que os governam… é parte intrínseca da democracia… O facto de os governos, que continuamente criticam os media com a sua retórica sobre transparência, se oporem às auditorias cidadãs é um sinal de que as democracias atuais se encontram numa situação lamentável. A necessidade permanente de transparência nos assuntos públicos está a tornar-se uma necessidade social e política vital” (Millet e Toussaint, 2012). A criação de redes e a divulgação são atividades chave levadas a cabo por muitas auditorias cidadãs. Incentivar a informação sobre o funcionamento real da economia permite a articulação de alternativas mais justas; saber mais sobre o atual mecanismo de dívida possibilita a criação de alternativas que respondam às reais necessidades e interesses da sociedade, em detrimento das necessidades de ‘mercados’, elites e credores (PACD, 2013).
Uma auditoria à dívida tem como principal objetivo analisar as características da dívida e a política de endividamento seguida pelas autoridades. Tendo em conta as pressões que são exercidas em torno dos orçamentos de Estado no sentido de dar prioridade aos interesses dos credores, os cidadãos têm exigido saber como foram contraídas as dívidas e onde foi gasto o dinheiro (ver, por exemplo, Laskaridis, 2012 e 2014a). As perguntas feitas incluem saber: o que levou o Estado a assumir dívidas cada vez maiores? Quais os fins políticos e os interesses sociais que levaram a contrair a dívida? As dívidas foram usadas de acordo com o propósito inicial? Quem beneficiou dos empréstimos? Quem são os credores e que condições impõem? Como foram tomadas as decisões para contrair os empréstimos? Que parcela do orçamento de Estado é usada para pagar a dívida? Como financia o Estado o pagamento da dívida? Quais os juros pagos e quanto do montante principal já foi reembolsado? Como foi que as dívidas privadas se tornaram dívidas públicas? Quais as condições de cada resgate bancário? Quanto custaram? Quem tomou as decisões?
“Há dívidas que implicam violações de direitos humanos ou de direitos económicos, sociais e culturais da população (...) Estas dívidas podem ser consideradas ilegítimas, injustas ou mesmo contrárias aos princípios do direito internacional”
O processo de auditoria pode servir para defender que nem todas as dívidas devem ser pagas. Como afirma a iniciativa de auditoria à dívida dos cidadãos espanhóis, a PACD: “Há dívidas que implicam violações de direitos humanos ou de direitos económicos, sociais e culturais da população, que ameaçam o desenvolvimento de uma vida digna, que geram desigualdade beneficiando uma elite e prejudicando a maioria da população, que enfraquecem a soberania ou que resultam de corrupção ou de má gestão do governo. Estas dívidas podem ser consideradas ilegítimas, injustas ou mesmo contrárias aos princípios do direito internacional” (PACD, 2013).
3.2. Reflexões sobre a experiência da auditoria grega
Em 2011, a Campanha Grega de Auditoria à Dívida (ELE) foi lançada exigindo um estudo aprofundado sobre a dívida pública da Grécia. A campanha trabalhou para abrir a “caixa de Pandora” da dívida grega, sobre a qual, desde o início da crise, muito tinha sido dito, mas pouco se tinha feito para manter a população informada sobre natureza dessa dívida. O grupo usou o argumento da auditoria para inverter a relação de forças entre credores e devedores com o objetivo de “anular todas as partes ilegítimas, odiosas ou insustentáveis da dívida pública”. Ficará para a história que a oportunidade de constituir um comité oficial surgiu vários anos depois, pela mão do Parlamento helénico, durante o primeiro governo do Syriza em abril de 2015.
O Comité para a Verdade sobre a Dívida Pública foi criado pela Presidente do Parlamento helénico, Zoe Konstantopoulou, que confiou a coordenação científica a Eric Toussaint. O relatório resultante dos trabalhos demonstrou que os mecanismos concebidos pelos resgates oficiais tinham transferido os empréstimos quase na sua totalidade para instituições financeiras, criando novas dívidas, gerando custos abusivos, acelerando o processo de privatizações e aprofundando ainda mais a crise. O relatório fez revelações inéditas sobre as circunstâncias que rodearam os acordos de empréstimo e os memoranda da Grécia; descrevia situações em que não foram respeitados os direitos humanos e aludia ao modo como as reformas tinham sido coercivamente impostas, privando o país duma parte fundamental da sua soberania: “violações de direitos humanos e de normas consuetudinárias, várias indicações de que as partes contratantes estavam a agir de má fé, o que, a juntar ao caráter inconcebível dos acordos, invalida esses mesmos acordos” (Comité para a Verdade, 2015: 4).
O Relatório mostrou como os programas intrusivos e os seus condicionalismos provocaram amplas violações dos direitos humanos, concluindo que o impacto das medidas “afetou diretamente as condições de vida das pessoas e violou os direitos humanos, que a Grécia e seus parceiros são obrigados a respeitar, proteger e promover no âmbito do direito interno, regional e internacional.” A conclusão principal foi que “a Grécia atualmente não está em condições de honrar a sua dívida sem ferir seriamente a sua capacidade de respeitar direitos básicos”. (Comité para a Verdade, 2015: 4).
O relatório preliminar do Comité continha em si numerosas evidências que possibilitavam desencadear um confronto direto com os credores. As alternativas ao resgate levado a cabo pelos credores incluíam os fundamentos legais necessários para se proceder ao repúdio e à suspensão da dívida soberana grega, em particular no que se refere às condições em que, de acordo com o direito internacional, um Estado soberano pode avançar com um ato unilateral de repúdio ou suspensão do pagamento da dívida (ver também Bantekas e Vivien , 2016).
A conclusão principal do Relatório do Comité para a Verdade sobre a Dívida Pública Grega foi que “a Grécia atualmente não está em condições de honrar a sua dívida sem ferir seriamente a sua capacidade de respeitar direitos básicos”
No final, o governo grego liderado por Alexis Tsipras não fez uso dos resultados nem das recomendações do Relatório do Comité para a Verdade sobre a Dívida em 2015. Em vez disso, deu o seu aval a um programa de ajuste macroeconómico proposto pelos credores, o terceiro desde 2010, sobre o qual pode ser obtida mais informação em Laskaridis (2014b). Contudo, a decisão não era inevitável: em setembro de 2014, o Syriza adotou um programa (“o programa de Salónica”) que afirmava que um governo liderado pelo Syriza exigiria aos credores “a anulação da maior parte do valor nominal da dívida pública”, permitindo ao sector público recuperar os seus direitos sobre os bancos recapitalizados. No entanto, uma vez no governo, o gabinete de Tsipras não adotou as tais medidas soberanas unilaterais através das quais a relação de forças poderia ter beneficiado o devedor.
Para evitar o círculo vicioso dos reembolsos, seria necessário avançar com as exigências incluídas originariamente no programa de Salónica: a anulação da maior parte da dívida. Uma auditoria poderia ter comprovado que a dívida era ilegítima, odiosa, ilegal e insustentável. Ter-se-ia invocado o princípio do direito internacional que permite a um Estado declarar uma moratória nos pagamentos, tendo em conta o estado de necessidade em que se encontra. [1] A existência de uma crise humanitária era a prova evidente desse estado de necessidade. Se tivesse lançado e utilizado um processo de auditoria, o governo grego poderia argumentar que estava apenas a aplicar o artigo 7º (9) do Regulamento (UE) nº 472/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2013, que afirma: “Os Estados-Membros sujeitos a programas de ajustamento macroeconómico devem realizar uma auditoria exaustiva às suas finanças públicas, a fim de, designadamente, avaliar os motivos que levaram à acumulação de níveis excessivos de dívida e detetar eventuais irregularidades” (UE, 2013).
Da mesma forma, se o programa original tivesse sido cumprido em termos de controlo público sobre os bancos recapitalizados, o Estado poderia ter exercido as suas responsabilidades e fornecido uma solução para a crise bancária de uma maneira perfeitamente legal. Em 2015, o Estado grego, através do fundo helénico de estabilidade financeira, era o principal acionista dos quatro maiores bancos do país, que representavam mais de 85 % do total do setor bancário grego. O parlamento grego poderia ter alterado as políticas adotadas pelos governos anteriores e transformado as ditas ações preferenciais detidas pelas autoridades públicas (que não implicam direito de voto) em ações ordinárias dando direito de voto.
Finalmente, para gerir a crise bancária e financeira que foi inflacionada pelos credores quando se tornou claro que o governo liderado pelo Syriza era uma realidade (a 4 de fevereiro, depois de o governo estar já constituído, o BCE decidiu obstruir as capacidades financeiras da Grécia permitindo aos bancos gregos o acesso a fundos somente através do mecanismo de Assistência de Liquidez de Emergência), o Governo grego poderia ter decretado um controlo dos movimentos de capitais com o objetivo de pôr fim à fuga de capitais para o estrangeiro. Podia ter sido criado um sistema de pagamento paralelo para recuperar alguma margem de manobra em termos de política monetária, fazendo circular uma moeda paralela não-convertível, usada apenas localmente, para trocas no interior do país – por exemplo, para pagar pensões mais elevadas, aumentos de salários aos funcionários públicos, impostos, serviços públicos.
O Governo grego não implementou nenhuma dessas medidas. Em vez disso, comprometeu-se, no dia 20 de fevereiro de 2015, a manter os pagamentos devidos a todos os credores durante o primeiro semestre de 2015. Tendo apenas realizado uma aprovação fachada do Comité para a Verdade da Dívida, criado pela Presidente do Parlamento Grego, quando do seu lançamento, o parlamento ignorou totalmente o Relatório Preliminar do Comité, em junho de 2015, que definia que a Grécia tinha o direito de parar com o pagamento da dívida, dando exemplos de opções possíveis.
4. Precedentes históricos do repúdio da dívida
Nos últimos dez anos surgiram experiências muito enriquecedoras que desafiaram a financeirização através de mobilizações populares. A história dos movimentos pela justiça global contra a dívida mostra existir falta de fé em iniciativas lideradas por credores. Os problemas de dívida não estão completamente resolvidos e o preço pago oficialmente para atenuar a situação é muito elevado. Apesar de diversas investigações e campanhas mostrarem que não foram gastos públicos excessivos que geraram dívidas insustentáveis, mas as condições em grande parte criadas pelos credores, várias oportunidades de enfrentar vitoriosamente os credores foram perdidas.
Esta secção final examina exemplos históricos de repúdio de dívida com o objetivo de mostrar que, apesar do atual clima de intolerância, é possível livrarmo-nos de dívidas injustas, insustentáveis e ilegítimas. Roos (2016) pergunta “por que razão os estados periféricos altamente endividados [não] deixam de pagar as suas dívidas externas com mais frequência?”, já que existem diversos precedentes históricos nesse sentido. Os atos soberanos unilaterais são meios legítimos para inverter a relação de forças e acabar com os problemas da dívida, e foi isso que faltou fazer à Grécia em 2015 para poder enfrentar os credores.
4.1. Equador e Islândia
O Equador (2007-2009) e a Islândia (2009) são exemplos promissores de países que encontraram meios alternativos para lidar com os problemas da dívida. O Equador é um caso bem-sucedido de implementação de uma auditoria cidadã à dívida, após ter suspendido o seu pagamento, o que levou a uma redução significativa da dívida externa do país. Rafael Correa assumiu funções em 2007, tendo sido eleito na sequência de fortes movimentações sociais, incluindo a campanha a favor da anulação da dívida lançada em 1997, liderada em parte pelo movimento cristão no âmbito da campanha mundial do Jubileu 2000, bem como por outras organizações pertencentes ao movimento de luta contra a dívida, como por exemplo o Centro de Direitos Económicos e Sociais (CDES). Inspirado pela Teologia da Libertação, Rafael Correa nomeou como ministro das Finanças, Ricardo Patiño, líder do movimento antidívida, que juntou autoridades políticas e ativistas equatorianos, bem como ativistas estrangeiro da luta contra a dívida, com o objetivo de elaborar o decreto presidencial, tornado público em julho de 2007, que constituiu uma comissão de auditoria à dívida. Tendo como base os resultados do trabalho da comissão, Correa suspendeu o pagamento de 3,2 mil milhões de dólares de dívida relativa a títulos comerciais, vendidos em Wall Street, com vencimento entre 2012 e 2030, argumentando que essas dívidas eram ilegítimas. Correa suspendeu o pagamento a partir de novembro de 2008 e manteve-se firme em relação aos detentores de títulos, ocultando informação sobre os planos do Equador até abril de 2009. A 10 de junho de 2009, o governo equatoriano conseguiu que 9 % desses títulos fossem vendidos ao Equador com um desconto de 65 %. Pagando mil milhões de dólares, o Equador conseguiu recuperar títulos no valor de 3,2 mil milhões de dólares. O Equador poupou 2,2 mil milhões de dólares, o que, com os juros, totalizou 7 mil milhões de dólares (2,2 mil milhões de dólares em títulos e 4,8 mil milhões de dólares em juros). Isto foi possível porque o governo de Correa, apoiado por mobilizações sociais, decidiu suspender unilateralmente o pagamento da dívida em novembro de 2008.
A recusa islandesa do pagamento da dívida e a sua decisão de processar as pessoas responsáveis pelos riscos assumidos pelos bancos só foram possíveis graças à mobilização do país
Na Islândia, após a crise económica de 2008, em vez de os bancos do país serem resgatados, as autoridades islandesas anularam uma percentagem da dívida hipotecária. Depois de terem sido interpostas queixas na Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA) pela Holanda e pela Grã-Bretanha, que queriam que a Islândia pagasse as dívidas dos bancos privados islandeses aos credores britânicos e holandeses, a EFTA decidiu a favor da Islândia: não compete ao setor público pagar os riscos e as perdas do setor privado. A recusa do pagamento por parte da Islândia e a sua decisão de processar as pessoas responsáveis pelos riscos assumidos pelos bancos só foram possíveis por causa da mobilização do país.
Apesar de a história recente não fornecer muitos casos de repúdio bem-sucedidos, os movimentos de luta contra a dívida puderam encontrar apoio para a implementação com sucesso de atos soberanos unilaterais e para o repúdio da dívida ao longo da história dos séculos XIX e XX. Este ponto é tratado em Toussaint (2017) que analisa vários exemplos históricos, onde o apoio político ao repúdio deu frutos.
4.2. O repúdio da dívida nos EUA nos anos trinta do século XVIII
Na década de trinta do século XVIII, quatro estados dos EUA, Mississípi, Arkansas, Florida e Michigan, repudiaram as suas dívidas, contraídas sobretudo a credores britânicos. O jurista Alexander Nahum Sack escreveu a propósito: “uma das principais razões que justificou esses repúdios foi a delapidação das somas emprestadas: os empréstimos eram em geral contraídos para criar bancos ou construir caminhos de ferro, mas os bancos faliram e as linhas ferroviárias nunca foram construídas. Essas operações duvidosas resultavam muitas vezes de acordos entre membros do governo corruptos e credores desonestos” (Sack, 1927). Esses repúdios da dívida surgem após a crise bancária de 1837, tendo por cenário as fortes movimentações populares da década de trinta do século XVIII. Os credores que tentaram processar os Estados, que tinham repudiado as dívidas, num tribunal federal dos EUA viram as suas ações rejeitadas.
4.3. México: A luta bem sucedida contra a dívida nos séculos XIX e XX
O desenvolvimento agitado do capitalismo no México alimentou as divergências crescentes entre as classes dominantes do país em meados do século XIX: quando os liberais tomaram o poder em 1855, começaram a aprovar leis que ficaram conhecidas como a Reforma, com o objetivo de expropriar as terras pertencentes não apenas às comunidades indígenas, mas também ao clero, para promoverem o surgimento de uma burguesia capitalista. Em reação, o Partido Conservador, representando os interesses do clero e dos grandes latifundiários, lançou a Guerra da Reforma contra os liberais no poder, com o apoio do Papa Pio IX. O liberal Benito Juárez, presidente desde 1858, foi derrubado por generais conservadores e começou a organizar a resistência armada contra os usurpadores do poder, desfrutando de amplo apoio. Depois de vencer a guerra e de voltar ao cargo em 1861, Juárez e o seu governo repudiaram os empréstimos internos contraídos pelos golpistas entre 1858 e finais de 1860. Em seguida, suspenderem o pagamento da dívida aos banqueiros de Londres, bem como aos credores mexicanos, que tinha adquirido recentemente a cidadania francesa ou espanhola com o objetivo de beneficiarem da proteção dessas potências europeias. Entre dezembro de 1861 e janeiro de 1862, tropas espanholas, britânicas e francesas invadiram o México, tendo os militares franceses tomado a capital e instalado uma monarquia católica com o apoio das classes dominantes mexicanas cujos interesses como credores eram defendidos pela França. Em 1867, a expedição militar francesa terminou com uma derrota amarga. Regressado ao palácio presidencial, Benito Juárez repudiou todas as dívidas contraídas pelo testa-de-ferro francês Maximiliano da Áustria; Juárez repudiou também a dívida interna contraída entre 1858 e finais de 1860 pelos golpistas conservadores.
Entre 1934 e 1943, num contexto de luta social e greves operárias, o governo mexicano (…) recusou retomar as negociações com os credores dos países industrializados e obteve uma redução de mais de 90 % da dívida
A história das ações bem sucedidas contra a dívida no México não acaba com este caso de repúdio, na sequência de uma vitória anticolonial. Em 1914, em plena revolução Mexicana, que tinha começado em 1910, os pagamentos da dívida foram suspensos. E não foram retomados até 1942 (na década de vinte, dois governos anunciaram que retomariam os pagamentos, em 1923 e em 1926, mas depressa renunciaram a fazê-lo), quando o México obteve uma vitória impressionante sobre os seus credores. Entre dezembro de 1934 e dezembro de 1940, Lázaro Cárdenas exerceu um mandato presidencial num contexto de luta social com greves operárias; realizou grandes reformas, algumas das quais concretizaram, pela primeira vez, as aspirações revolucionárias dos anos 1910-1917 e aplicaram a Constituição progressista de 1917, que tinha sido adotada no âmbito do movimento revolucionário, mas que nunca fora realmente implementada. Lázaro Cárdenas recusou retomar as negociações com o Comité Internacional de Banqueiros sobre o México, criado em fevereiro de 1919, composto por credores de países industrializados, que pressionavam o México a voltar aos pagamentos. Finalmente, em 1941, quando os EUA estavam prestes a entrar na Segunda Guerra Mundial, o presidente Franklin D. Roosevelt fez com que os banqueiros dos EUA, começando pelo J. P. Morgan, desistissem e reconhecessem o repúdio do governo mexicano. Apesar de o Comité exigir o pagamento de dívidas estimadas em 510 milhões (capital e juros) de dólares, o acordo final fazia menção a um pagamento inferior a 50 milhões de dólares – uma redução de mais de 90 %. Além disso, mais notável ainda é a taxa usada para compensar os juros em dívida: os juros não liquidados anteriores a 1923 foram pagos a uma taxa de 0,001 e os juros não liquidados entre 1923 e 1943 foram pagos a uma taxa de 0,01 (Wynne, 1951: 97, tabela 106). Ora em muitos acordos de reestruturação de dívida no século XIX ou na primeira metade do século XX, os juros de mora foram transformados em capital em dívida. A assinatura deste acordo foi um ato de rendição por parte dos bancos.
4.4. O repúdio da dívida na Rússia Soviética
Em 1905, durante a primeira revolução russa que acabou por ser derrotada, o Soviete de São Petersburgo publicou um documento que ficou conhecido como o Manifesto Financeiro, no qual denunciava a ilegitimidade das dívidas contraídas pelo czar (dado terem sido contraídas para benefício da autocracia do czar e do seu poder coercivo, bem como dos capitalistas estrangeiros, dos poucos capitalistas russos que existiam, e contra os interesses do povo russo e das nações dominadas pelo Império Czarista) e no qual fazia saber que essas dívidas não seriam reconhecidas, uma vez que o regime autocrático tinha sido derrubado. Os milhões de mortos e as destruições massivas consequência da Primeira Guerra Mundial aceleraram o impulso revolucionário na Europa. A Guerra deixou também os bancos e os comerciantes de armas muito mais ricos. Entre 1913 e a revolução de outubro de 1917, a dívida pública russa multiplicou por 3,6 e subiu de 930 milhões de libras para 3 385 milhões de libras (Lienau, 2014). Em fevereiro de 1918, todas as dívidas contraídas pelo regime czarista e pelo governo provisório, que manteve a Guerra, foram repudiadas por decreto. As potências imperialistas da Europa, dos Estados Unidos, do Canadá e do Japão, cujos interesses económicos ficaram comprometidos pelo repúdio da dívida, assim como pela queda do capitalismo na Rússia, uniram-se numa frente de ataque imperialista para apoiar os exércitos contrarrevolucionários da Rússia e restaurar o capitalismo no país. Como o plano fracassou, foi realizada uma conferência internacional, na primavera de 1922, em Génova, organizada por cinco potências capitalistas, com o objetivo de forçar o governo soviético a reconhecer as dívidas que tinha repudiado e a deixar de pedir uma revolução global, se quisesse reanimar a sua economia, contraindo empréstimos e atraindo o investimento estrangeiro das potências capitalistas. A Rússia Soviética recusou a chantagem, alegando que estava no direito de repudiar todas as dívidas czaristas na medida em que a revolução tinha criado uma nova ordem legal. A esse respeito, os diplomatas russos evocaram os antecedentes históricos da França e dos EUA. Durante a conferência não foi alcançado nenhum acordo, mas a firmeza do governo soviético valeu a pena: nos anos seguintes, o Estado soviético foi reconhecido pelas várias potências capitalistas; foi reatado o comércio entre as duas partes e foram assinados acordos bilaterais de empréstimo. O repúdio da dívida russa foi um sucesso.
[em 1922] a Rússia Soviética alegou o direito de repudiar todas as dívidas czaristas, na medida em que a revolução tinha criado uma nova ordem legal. Os diplomatas russos evocaram os antecedentes históricos da França e dos EUA
4.5. O repúdio da dívida na Costa Rica
Em janeiro de 1917, Federico Tinoco tomou o poder na Costa Rica, após ter liderado um golpe militar, e estabeleceu uma ditadura militar no país. Em agosto de 1919, pressionado por um forte descontentamento popular e por mobilizações, Tinoco abandona o país, levando consigo uma grande soma de dinheiro, que tinha pedido emprestado em nome do país a um banco britânico, o Royal Bank of Canada (ver: Ludington et al. 2009). A Constituição do regime anterior ao golpe de Tinoco foi restabelecida e, em agosto de 1922, o Congresso Constitucional declarou nulos e sem efeito todos os contratos celebrados entre o poder executivo e particulares, tendo ou não sido aprovados durante a legislatura, entre 27 de janeiro de 1917 e 2 de setembro de 1919; também anulou a Lei n.º 12, de 28 de junho de 1919, que autorizava o governo a emitir dezasseis milhões de colones (a moeda da Costa Rica) em papel-moeda, que tinham sido levados por Tinoco quando abandonou o país. Convém salientar que o novo presidente, Julio Acosta, num primeiro momento, vetou a lei que repudiava a dívida, que foi votada pelo Congresso em 1920 (Lienau, 2014), argumentando que a lei ia contra a tradição que era honrar os compromissos internacionais com os credores. Mas o Congresso Constitucional, sob pressão popular, manteve a posição e o presidente acabou por prescindir do veto.
Os casos mais bem sucedidos de repúdio da dívida soberana foram levados a cabo por Estados devedores em que os movimentos populares direta ou indiretamente questionaram a função da dívida pública
Estes exemplos históricos não exaustivos são a prova de que os movimentos de luta contra a dívida podem ter sucesso. Os casos mais bem sucedidos foram as iniciativas levadas a cabo por Estados devedores em que os movimentos populares apoiaram direta ou indiretamente que se questionasse a função da dívida pública.
4.6. A longa lista de anulações ou repúdios de dívida entre os séculos XIX e XXI
É longa a lista de anulações ou repúdios de dívidas que invocaram o argumento do carácter ilegítimo ou odioso de uma maneira ou de outra. Uma lista não exaustiva incluiria: [2]
O repúdio das dívidas de Portugal em 1837; o repúdio pelo Peru da dívida reclamada pelo banco de Paris Dreyfus em 1886; o repúdio de 1898 da dívida exigida a Cuba por Espanha; o repúdio da dívida da Grã-Bretanha aos bóeres, após a conquista das repúblicas bóeres em 1899-1900; a anulação das dívidas da Alemanha na Polónia e nas suas colónias africanas em 1919; a abolição pelos bolcheviques da dívida dos três Estados bálticos em 1920 e das dívidas da Polónia, da Pérsia e da Turquia em 1921; a anulação de todos os contratos celebrados entre o antigo governo czarista e a China em 1924; os grandes repúdios de dívida feitos pelo Brasil e pelo México em 1942-1943; os repúdios de dívida chinesa em 1949-1952; o repúdio pela Indonésia da dívida reclamada pela Holanda em 1956; os repúdios de Cuba em 1959-1960; o repúdio da dívida colonial pela Argélia em 1962; o repúdio pelo Irão das dívidas contraídas pelo xá para comprar armamento em 1979; o repúdio das dívidas herdadas pela URSS, levado a cabo pelas três repúblicas bálticas em 1991; a abolição da dívida da Namíbia pelo governo sul-africano de Nelson Mandela em 1994; a abolição da dívida colonial de Timor-Leste em 1999-2000; a abolição de 80 % da dívida do Iraque em 2004; o repúdio pelo Paraguai de dívidas a bancos suíços em 2005 (Balbuena, 2008); o abrandamento das exigências da Noruega em relação a cinco países (Equador, Peru, Serra Leoa, Egito e Jamaica), envolvendo dívidas relativas à produção e entrega de barcos de pesca em 2006 (CADTM, 2006).
5. A doutrina da dívida odiosa
Tanto no presente como no passado, as campanhas de luta contra a dívida têm tido como principal argumento o facto dessas dívidas serem odiosas. Nesta secção, desenvolve-se a doutrina da dívida odiosa para mostrar a sua contínua atualidade. Os casos bem-sucedidos de repúdio realizados por Estados devedores levaram um jurista conservador russo, Alexander Nahum Sack, a redigir, em 1927, aquela que mais tarde viria a ser conhecida como a “doutrina da dívida odiosa”. Sack era favorável a que se mantivessem os compromissos do Estado após uma mudança de regime, mas isso não invalidou que reconhecesse o sucesso que alguns Estados obtiveram quando repudiaram as suas dívidas. O seu trabalho pode, assim, ser interpretado como um aviso aos credores para que não façam empréstimos que possam legitimar o repúdio desses mesmos empréstimos após uma mudança de regime no seio do Estado devedor. Sack define os critérios que tornam uma dívida odiosa:
quando o propósito que o governo anterior pretendia resolver com a dívida em questão era odioso e claramente contrário aos interesses da população no seu todo ou em parte, e
quando os credores concedem um empréstimo, estando conscientes da sua finalidade odiosa.” (Sack, 1927)
Ao contrário do que é com frequência afirmado por académicos ou movimentos sociais no que se refere à doutrina da dívida odiosa, Sack não considera que o facto de o Estado devedor ser um regime despótico seja condição sine qua non para que uma dívida possa ser designada como sendo odiosa (Alexander Sack, um pensador conservador da primeira metade do século XX, defendeu que as dívidas contraídas por um governante despótico não são necessariamente contra os interesses da população). Isso alarga o âmbito para a aplicação da doutrina, significando que um regime democrático pode também contrair uma dívida odiosa.
Os credores, estando perante reconhecidos ditadores, não podem alegar inocência e exigir os reembolsos
Partindo do princípio que a doutrina tem alguma coerência, apesar de ser criticável por dar prioridade aos credores e não ter em conta os direitos humanos, alguns movimentos de luta contra a dívida usaram-na e foram mais além, utilizando “aquilo que é aplicável, rejeitando o que é inaceitável e acrescentando elementos relacionados com os avanços sociais e democráticos alcançados pelo direito internacional desde a Segunda Guerra Mundial” (Toussaint, 2017). Vale a pena citar alguns excertos da definição de dívida odiosa adotada pelo CADTM:
“Qualquer empréstimo deve ser considerado odioso se um regime, democraticamente eleito ou não, não respeitar os princípios fundamentais do direito internacional, tais como os direitos humanos fundamentais, a soberania dos Estados ou a ausência do uso da força. Os credores, estando perante reconhecidos ditadores, não podem alegar inocência e exigir os reembolsos. Nesse caso, o objetivo dos empréstimos não chega para tipificar a dívida. Na realidade, ajudar financeiramente um regime criminoso, mesmo sendo para hospitais e escolas, significa apoiar a consolidação e a autopreservação do regime. Em primeiro lugar, alguns investimentos úteis (estradas, hospitais ...) podem mais tarde ser usados para fins odiosos, por exemplo, para sustentar os esforços de guerra. Em segundo lugar, a fungibilidade dos fundos torna possível que um governo que contrai empréstimos para servir a população ou o Estado – o que, oficialmente, é sempre o caso – possa também gerar fundos para objetivos menos nobres.
À parte da natureza dos regimes, o objetivo dos fundos deve ser suficiente para qualificar as dívidas como odiosas, ou seja, sempre que esses fundos são usados contra os interesses principais da população ou quando enriquecem diretamente as coortes do regime. Nesse caso, as dívidas tornam-se pessoais, e não dívidas do Estado que é constituído pelo seu povo e pelos seus representantes. Vejamos uma das condições que regula a dívida segundo Sack: “as dívidas do Estado devem ser contraídas e os fundos delas derivados devem ser usados para satisfazer as necessidades e o interesse do Estado”. Assim, as dívidas multilaterais contraídas no âmbito de ajustes estruturais enquadram-se na categoria de dívidas odiosas, uma vez que o caráter destrutivo dessas dívidas tem sido claramente demonstrado, nomeadamente, pelas agências da ONU. (Toussaint, 2005)
De facto, tendo em conta o desenvolvimento do direito internacional desde a primeira teorização da dívida odiosa em 1927, as dívidas odiosas podem ser definidas como as dívidas que são contraídas pelos governos que violam princípios fundamentais do direito internacional, tais como aqueles incluídos na Carta das Nações Unidas, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, nos dois pactos complementares sobre direitos civis e políticos e direitos económicos, sociais e culturais de 1966, bem como nas normas vinculativas do direito internacional (jus cogens)” (Toussaint, 2017).
6. Conclusão
[São odiosas] as dívidas contraídas por governos que violam princípios fundamentais (...) incluídos na Carta das Nações Unidas, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, nos [pactos internacionais] sobre direitos civis e políticos, económicos, sociais e culturais
Este capítulo mostra a diversidade de meios criativos e legais utilizados nos últimos tempos para desafiar o poder crescente dos credores. Esse poder está longe de ser estável ou inevitável. Exemplos históricos demonstram que as ações unilaterais e as mobilizações populares são possíveis e necessárias para os desafiar efetivamente. Combinar a vontade política e o apoio popular é a receita necessária para o sucesso.
Traduzido por Maria da Liberdade. Revisto por Rui Viana Pereira
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Wynne, W. (1951). State Insolvency and Foreign Bondholders: Selected Case Histories of Governmental Foreign Bond Defaults and Debt Readjustments, vol. 2, New Haven, USA: Yale University Press
Notas
[1] Sobre o estado de necessidade inscrito na Convenção de Viena de 1969 sobre o Direito dos Tratados, ver: Lamarque e Vivien (2011).
[2] Alguns destes exemplos surgem na lista de King (2016).
Eric Toussaint, docente na Universidade de Liège, é o porta-voz do CADTM Internacional.
Christina Laskaridis
Nathan Legrand é permanent au CADTM Belgique
12 de Abril 2018
http://www.cadtm.org/As-lutas-atuais-contra-a-divida
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