Jean Wyllys desiste de mandato e deixa o Brasil: "Quero me manter vivo"
- Opinión
O deputado federal Jean Wyllys (PSOL) anunciou nesta quinta (24) que abrirá mão do mandato e deixará o País por tempo indeterminado. Ativista da causa LGBT, Wyllys vinha sofrendo ameaças que se intensificaram nos últimos tempos. Ele disse, em entrevista exclusiva à Folha, que teme por ataques homofóbicos ou tentativas de assassinato por causa de sua militância - como ocorreu, fatalmente, com a vereadora Marielle Franco - além de ter em vista um componente novo, que surgiu de maneira mais saliente após a eleição de Jair Bolsonaro: o fanatismo religioso impulsionado por fake news e difamações nas redes sociais.
"Eu já vinha pensando em abrir mão da vida pública desde que passei a viver sob escolta, quando aconteceu a execução da Marielle. Foi quando ele teve 'noção da gravidade'", disse ele.
Wyllys afirmou que "não foi a eleição dele [Bolsonaro] em si [que motivou sua decisão]. Foi o nível de violência que aumentou após a eleição dele. Para se ter uma ideia, uma travesti teve o coração arrancado agora há pouco. E o cara [o assassino] botou uma imagem de uma santa no lugar", lembrou.
O deputado eleito também disse que "me apavora saber que o filho do presidente contratou no seu gabinete a esposa e a mãe do sicário [ex-PM suspeito de chefiar milícia que é investigada no caso Marielle]. O presidente que sempre me difamou, que sempre me insultou de maneira aberta, que sempre utilizou de homofobia contra mim. Esse ambiente não é seguro para mim."
Acho que a saída para as esquerdas é a união. Mas, sinceramente, eu não quero mais opinar sobre isso porque estou abrindo mão do mandato justamente para não ter mais que opinar neste momento sobre essa questão. Quero cuidar de mim e me manter vivo.
Wyllys disse que sua prioridade é cuidar de si e manter-se vivo. Ele afirmou que foi este o conselho que recebeu do ex-presidente do Uruguai, Pepe Mujica, quando este soube que o parlamentar é ameaçado por grupos extremistas. Pepe teria dito que ele deveria tomar cuidado, porque "mártires não são heróis".
O socialista afirmou que pretende voltar a lutar pela causa LGBT, mas para isso precisa estar vivo. "Eu não quero ser mártir. Eu quero viver. Acho que essa violência política que se instalou no nosso país vai passar. Pode ser que no futuro eu retome isso, mas eu nem penso em retomar porque há tantas maneiras de lutar por essa causa que não passam pelo espaço da institucionalidade."
"Quando eu estiver refeito, quando eu achar que é a hora, eu volto, não necessariamente para esse lugar da representação política parlamentar, mas para a defesa da causa — isso eu nunca vou deixar de fazer", afirmou.
Ele também disse que recebeu os lamentos do PSOL, mas que a legenda reconheceu o risco das ameaças e apoiou a decisão. Wyllys também comentou que pesou em sua decisão o fato de que a OEA comunicou o Estado brasileiro a respeito da gravidade da situação do parlamentar e pediu providências mais robustas, e a resposta das autoridades foi "absurda": alegaram que o Brasil não tem problemas com homofobia.
Wyllys ainda lembrou das difamações e ataques que sofre na internet, destacando o episódio da desembargadora do Rio de Janeiro, que desejou a ele pena de morte. Ele também citou o caso de Alexandre Frota, que associou ele à pedofilia, e de Bolsonaro, que fez a fake news do kit gay respingar no socialista por anos.
Questionado sobre o balanço dos 8 anos de mandato, ele disse que não se arrepende de nada, e destacou a vitória na conquista do casamento civil igualitário. "Durante esses oito anos, enfrentei tudo isso com muita dignidade. Mas sou humano e cheguei ao meu limite."
Por motivos de segurança, ele não informou qual será seu destino. Disse apenas que pretende reconstruir a vida dedicando-se à academia, e nega interesse em voltar à vida pública por meio do Legislativo novamente.
24/01/2019
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