Por que Bolsonaro teme?
12/05/2020
- Opinión
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No dia 12 de março, os membros da comitiva do Presidente Jair Bolsonaro, que haviam viajado para os Estados Unidos na semana anterior, receberam uma preocupante notícia: deveriam fazer exames para saber se contraíram o coronavírus.
Naquele dia, o secretário de Comunicação da Presidência, Fábio Wajngarten, recebera a contraprova que confirmava a sua infecção.
Nos dias que se seguiram nada menos do que 26 integrantes da comitiva teriam seus exames positivos para a Covid-19. Entre eles estavam: General Augusto Heleno, Ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); Almirante Bento Albuquerque, Ministro de Minas e Energia; Karina Kufa, advogada de Bolsonaro e da direção de seu novo partido; Marcos Troyjo, diplomata e secretário de Comércio Exterior do Ministério da Economia; Alan Coelho de Séllos, chefe de cerimonial do Ministério de Relações Exteriores; Carlos França, chefe de cerimonial do Palácio do Planalto; Coronel Gustavo Suarez, diretor do Departamento de Segurança Presidencial; Major Mauro Cid, ajudante de ordens da Presidência da República; Nelsinho Trad, presidente da comissão de assuntos exteriores do Senado; além de vários parlamentares, dirigentes empresariais e assessores diretos do presidente.
Do período de chegada da comitiva ao Brasil até os primeiros diagnósticos positivos de Covid-19 se passaram seis dias, e todas estas figuras, que ocupam cargos chaves na administração pública, estiveram em dezenas de reuniões e eventos. Esses encontros resultaram na contaminação do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e de inúmeros senadores e deputados.
Desde então, Bolsonaro vem negando que tenha contraído a Covid-19, mas se esquiva de apresentar seus exames. O que fica cada vez mais evidente é que, caso fosse confirmada a infecção do presidente pelo coronavírus, sua atuação ficaria ainda mais insustentável, deixando claro sua irresponsabilidade e inconsequência por expor milhares de pessoas à doença. Seria mais uma confirmação de seu comportamento antissocial deliberado e agressivo com a vida, inclusive de seus apoiadores.
Diante de uma série de manifestações de parlamentares, entidades da sociedade civil e da imprensa, o jornal Estado de São Paulo impetrou uma ação judicial e garantiu o direito a obter os laudos do exame do presidente por decisão da Justiça Federal de São Paulo, no dia 27 de abril.
Ao longo desses dias Bolsonaro foi mudando o tom do seu discurso, parou de negar totalmente o contágio, e começou a dizer que “Eu talvez tenha pegado esse vírus no passado, talvez, talvez, e nem senti”.
A Advocacia-Geral da União, instruída por Bolsonaro, não apresentou o exame de Covid-19 realizado pelo presidente, o que levou a Justiça a notificar a AGU a apresentar, em um prazo de 48 horas, o documento solicitado.
Diante desta situação é bom recordar a resposta do vice-presidente, general Hamilton Mourão, à Folha de São Paulo no dia 29 de março. Quando perguntado se “o presidente não deveria, como fizeram outras autoridades, mostrar o teste dele que diz ter dado negativo, já que é informação de interesse nacional?”.
O general respondeu: “Acho que tem de confiar na palavra do presidente. Porque aí seria uma coisa muito, vamos dizer assim, acho que seria o pior dos mundos o presidente chegar e declarar que testou e deu negativo e depois de alguma maneira aparecer o teste dizendo que deu positivo. Isso aí, para mim, seria o pior dos mundos. Parto do princípio, e isso é uma coisa que é muito cara para nós que viemos do meio militar, a questão que sua palavra tem fé de ofício. A gente só trabalha no meio militar assim. Se eu falei A, é porque é A. A partir do momento em que vou estabelecer uma desconfiança com o subordinado ou com um superior, morre o relacionamento. Acho que, se o presidente disse que deu negativo, OK. Deu negativo”.
Está claro o que ocorreu, independente do exame. Os mais próximos ao presidente sabem a verdade. O Brasil também.
- Leandro Severo é Gestor Público. Foi secretário de Governo e de Comunicação do município de São Carlos-SP.
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