Notas sobre as eleições municipais depois do segundo turno

01/12/2020
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Eleições Brasil
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  1. As eleições se realizaram em um contexto extemporâneo, sem possibilidade de debates de ideias, comícios e mobilizações das pessoas e militantes. Isso dificultou a pratica da tradição cultural da esquerda fazer política eleitoral.

 

  1. Em algumas cidades surgiram novas formas criativas de fazer agitação e propaganda, mas que não se sabe sua eficácia, em termos de votos. Tampouco os Memes, cards, vídeos, mensagens pela internet tiveram efeito relevante.

 

  1. No primeiro turno tivemos uma abstenção de média de 30% de eleitores, acima dos tradicionais 20%. E no segundo turno a média ficou em 35% e algumas cidades passou de 50%, comprometendo a representatividade dos eleitos. Isso é ruim para a democracia, por que revela o aumento da alienação e descrédito em relação ao voto, mas sinaliza a incapacidade de motivá-los para a política.

 

  1. Na maioria dos lugares, mesmo nas capitais a disputa não foi de projetos nem de partidos. Para as massas aparecem apenas os nomes das figuras. Ainda que por trás deles tenham projetos de classe e interesses partidários.

 

  1. Nessas circunstancias não se pode fazer análise estatística do resultado das eleições e dizer tal partido ganhou ou tal perdeu. As eleições e a política são medidas por simbologias da luta de classe e não apenas números.

 

  1. O financiamento privado continuou acontecendo de forma escamoteada, agora em nome do empresariado rico, que doou para seu escolhido e todos eram conservadores. O fundo partidário, com recursos públicos, ainda que importante e mais democrático, também tem lá suas distorções pois coloca nas mãos da burocracia partidária o direito de destinar os recursos para os “seus escolhidos”. Tanto que a lei de quotas dos recursos para mulheres e negros praticamente não influenciou a viabilidade dessas candidaturas.

 

  1. Pelo resultado, pode-se afirmar que a maioria dos candidatos vencedores, desenvolveram um discurso moderado, se apresentando longe do bolsonarismo e do “radicalismo” das mudanças pregados timidamente pela esquerda, assim tentaram captar o espirito conservador do eleitor. Também tiveram peso as candidaturas que já tinham sido prefeitos e por tanto se aproveitaram de sua experiência já provada. E isso foi utilizado por todos os partidos.

 

  1. O Bolsonarismo saiu perdendo. Em especial no Rio de Janeiro, São Paulo, Fortaleza e Belem. Como expressão da extrema-direita o bolsonarismo refluiu a sua real representação que teve historicamente na sociedade brasileira em torno de 8 a 12 % dos votos.

 

  1. Mesmo naquelas cidades aonde algum bolsonarista se elegeu, teve que esconder seu projeto de extrema-direita.

 

  1. A imprensa burguesa passou o ano todo dizendo que a esquerda estava dividida e que não tinha líderes e que seria derrotada. Não foi isso que aconteceu. A esquerda marchou unida em várias cidades sobretudo no segundo turno. Por isso que não se deve dar glórias a este ou aquele partido. Surgiram diversos nomes de expressão nacional, como Boulos, Edmilson, Manuela, Marilia, Margarida.

 

  1. Os governadores não conseguiram emplacar seus candidatos. Mas isso é comum nas eleições municipais, em cada cidade os eleitores analisam a situação particular e assim os governadores são meros eleitores.

 

  1. As maquinas institucionais de cada município seguem operando pelo conservadorismo, ou seja, manter os privilégios. Esses interesses particulares são invisíveis, por isso não aparecem nas pesquisas de voto. Mas atuam na sua lógica. Imaginem quantos servidores públicos tem la seus interesses nas escolas, hospitais, a imprensa burguesa com suas verbas de publicidade, as igrejas pentecostais com suas isenções e até pastores que se transformam em funcionários das prefeituras, como foi revelado em Recife.

 

  1. A esquerda como campo político sai fortalecida das eleições. Vejam mesmo na derrota da Manuela e da Marilia, elas saíram maiores politicamente e o povo ficou sabendo que elas eram a mudança real. A esquerda saiu das cordas, parou apenas de se defender da ofensiva da direita.

 

  1. A crise do capitalismo e do covid-19, o aumento do desemprego, e das dificuldades, tiraram também a capacidade da direita vir para ofensiva, porque objetiva e ideologicamente a crise do capitalismo os deixou na defensiva. Não puderem ficar repetindo a defesa do mercado, da liberdade do capital.

 

  1. As fake news continuam sendo uma possibilidade de manipulação na propaganda da direita. E que, em circunstancias da falta de maior tempo de reuniões, concentrações, mobilizações de massa, assumem uma influência maior.

 

  1. Os candidatos precisam ter carisma pessoal na sua comunicação com as massas. E as vezes um candidato do campo conservador tem mais carisma do que o candidato progressista.

 

  1. A inercia das massas, a força da máquina institucional e o dinheiro do partido são as armas que os partidos conservadores tem. Como alguém disse sobre a política institucional “só um bobo não consegue se reeleger” na estrutura brasileira!

 

  1. As eleições municipais nunca foram parâmetros para eleições presidenciais. A imprensa burguesa agora está projetando que Doria saiu fortalecido. Como? Se durante a campanha Covas o escondeu, porque sabia que perderia votos. A Dupla Hulk/Moro, não acumulou nada nas eleições, mas podem vir com a força da Globo e de setores de direita. Por esta razão, é que os porta-vozes do palácio do planalto disseram que independente do resultados, a principal preocupação é o enfrentamento ao Lula/PT.

 

  1. Tampouco é verdadeiro já projetar como possíveis candidatos as figuras que saíram engrandecidas nas eleições como Manuela, Boulos, Marilia. As articulações nacionais passam por outros parâmetros. Assim como os governadores que poderiam ter pretensões nacionais, Flavio Dino e Rui Costa, ou mesmo Doria pela direita, não saíram com força maior das eleições municipais.

 

  1. Não cabe agora o debate se a esquerda irá unida nas eleições de 2022, porque pela lógica dos partidos é natural que cada partido tenha seus candidatos no primeiro turno e depois se façam as alianças programáticas no segundo turno. Como campos políticos partidários, será natural que Ciro seja candidato pelo PDT buscando o eleitor de centro. Talvez atraia o PSB, mas também ninguém garante que adesões de siglas, tenham adesão real da base social. O campo petista deve sair com Lula ou o que a circunstancias definirem. O PSOL e o PCdoB, não tem força própria para bancar candidaturas próprias com potencial eleitoral. Podem até lançar candidatos, como parte da lógica partidária, e no segundo turno gravitar para a candidatura petista ou do Ciro.

 

  1. Precisamos aproveitar as lições e aonde a esquerda e forças populares ganharam cargos de vereadores, prefeitos, transformar essas vitorias eleitorais em processos de acumulação de força popular e de melhoria das condições de vida do povo.

 

  1. Fica a lição de que vitorias eleitorais, só vem se tivermos capacidade de organizar a rebeldia popular antes. Se tivermos capacidade de motivar corações e mentes com um novo programa. Se tivermos capacidade de fazer grandes mobilizações de massa. Por tanto não basta ter um nome palatável, ou tentar mudar a cara na campanha, (menos radical) ou apenas da força e do dinheiro do partido.

 

  1. A luta institucional que aparece nas eleições não terá sucesso se antes não colarmos com a luta social, em que possamos organizar o povo para as lutas de melhorias das condições de v ida, e que acumulem forças.

 

30 de novembro

 

- João Pedro Stedile é dirigente do MST e da Frente Brasil Popular.

 

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/210017
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