Só quebra de patentes poderá evitar catástrofe anunciada para breve
Está claro que não teremos uma oferta capaz de atender ao maioria da população humana do planeta. Com 16% da população, os países ricos já tomaram posse de 60% das vacinas disponíveis.
- Opinión
Após um ano de covid-19, é pernicioso cultivar ilusões a respeito da oferta de vacinas capazes de derrotar a pior pandemia do último século.
Está claro que não teremos uma oferta capaz de atender ao maioria da população humana do planeta. Os dados são conclusivos. Com 16% da população, os países ricos já tomaram posse de 60% das vacinas disponíveis.
Na mesma linha, Japão, Austrália e Canadá, que até agora tiveram 1% dos casos, compraram mais doses de vacinas do que América Latina e Caribe, que abrigam 17% dos casos (Estado de S. Paulo, 1/3/2021, página 8).
O conjunto dos analistas da indústria farmacêutica está de acordo num ponto. Mesmo que quisessem, os países produtores de vacina não teriam capacidade instalada para atender a demanda do conjunto da humanidade, na quantidade e no prazo necessário para impedir uma catástrofe bíblica que já é possível enxergar no horizonte.
Nesta situação, restam duas alternativas. Uma delas é multiplicar gestos de boa vontade em direção a indústria farmacêutica, na esperança de receber uma quantidade um pouquinho maior de vacinas, num prazo um pouquinho mais curto, também. Pode ser útil para proteger a clientela endinheirada dos países pobres, como queria, a recente movimentação em torno de compras de vacinas pelo setor privado.
Abandonada no momento pelo caráter indecoroso, essa iniciativa pode retornar aos debates caso as previsões de um recrudescimento da pandemia sejam confirmadas nos próximos meses -- e nada for feito até lá.
A outra alternativa envolve o direito de patentes, que pode ser quebrado em situações de emergência. A própria lei número 9279, que regulamenta a propriedade industrial no país, prevê o licenciamento compulsório no artigo 71, em "casos de emergência nacional ou interesse público".
O mesmo artigo prevê que o licenciamento será concedido "de ofício", ou seja, automaticamente, com uma única condição: "desde que o titular da patente ou seu licenciado não atenda a esta necessidade".
A diferença entre "licenciamento compulsório" e "quebra de patentes" é econômica, essencialmente. No licenciamento, os direitos dos proprietários originais são respeitados, permitindo que recebam uma remuneração por sua descoberta -- ainda que inferior ao preço de mercado.
Com base na lei 9279, em 2007 o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou a quebra da patente do Efavirenz, medicamento usado no tratamento contra AIDS.
Não há nenhum motivo racional para que uma decisão semelhante não seja tomada agora.
Alguma dúvida?
- Paulo Moreira Leite é colunista do 247, ocupou postos executivos na VEJA e na Época, foi correspondente na França e nos EUA
1 de fevereiro de 20211 de fevereiro de 2021
https://www.brasil247.com/blog/so-quebra-de-patentes-podera-evitar-catastrofe-anunciada-para-breve
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