O novo velho continente e suas contradições:

Porque o Mundo deve quebrar a patente das vacinas

Cientistas advertem que as vacinas deveriam ser consideradas um bem público e não um bem privado

22/02/2021
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  • Análisis
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Há séculos governos e sociedades não se defrontavam com tão grande ameaça à própria sobrevivência da Humanidade como esta representada pela Covid-19. É uma pandemia que espelha as cenas dos filmes catástrofes de Hollywood e que ainda não tem data para ser vencida. Cinquenta e três por cento de toda a produção de vacinas foram reservados pelos países ricos, que já fizeram compras em número suficiente para imunizar três vezes a sua população. Apenas o Canadá já garantiu doses suficientes para vacinar cinco vezes cada cidadão. Os países pobres só serão capazes de vacinar uma em cada dez pessoas.

 

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A falta de vacinas e remédios específicos no começo, o açambarcamento que hoje fazem os países ricos em detrimento dos países pobres e o enriquecimento obsceno dos laboratórios pertencentes ao grande capital trazem à luz uma verdade definitiva: a vacina e as terapias existentes precisam ter suas patentes quebradas em benefício de todas as populações do mundo. Como se fosse um dogma neoliberal, a União Europeia se recusa a sequer debater o assunto. Esta é, portanto, uma verdade inconveniente.

 

Há séculos governos e sociedades não se defrontavam com tão grande ameaça à própria sobrevivência da Humanidade como esta representada pela Covid-19. É uma pandemia que espelha as cenas dos filmes catástrofes de Hollywood e que ainda não tem data para ser vencida. Os mortos contam-se aos milhões. Três milhões, até agora. Oitenta por cento concentrados no continente americano e na Europa, onde existem as estatísticas mais confiáveis.

 

Estima-se que precisam ser vacinados pelo menos setenta por cento da população mundial de quase oito bilhões de humanos que vivem atualmente sobre o planeta. E nunca os fabricantes de remédio ganharam tanto dinheiro. Suas ações dispararam nas bolsas e não param de subir desde antes da real existência de suas vacinas . Seus executivos estouram garrafas de champanhe: https://tinyurl.com/70j5ilm0 .

 

Os laboratórios de testes também tiveram altas exponenciais em suas ações.

 

Logo no início da pandemia, foi a própria Organização Mundial da Saúde que fez um apelo, depois esquecido, para que se tornassem públicas as patentes. Seria assim possível a produção de acordo com a capacidade instalada dos laboratórios em todo o mundo segundo as necessidades de cada país. E não a prevalência dos lucros em benefício de poucas empresas privadas.

 

Os preços

 

A Pfizer/BionTech tem contratada a entrega de 1,128 bilhão de doses de sua vacina ao preço de US$19,50 por dose. São necessárias duas doses que serão destinadas 96 por cento para os países ricos e 4 por cento para os países pobres. Sua margem de lucro é de até oitenta por cento. A Moderna tem preços que variam de U$12 a US$32 e cem por cento da sua produção é destinada aos países ricos. Astra Zeneca/Oxford custará de R$3 a R$5 por dose e 36 por cento da sua produção de 2,7 bilhões de doses vai para os ricos. Novavax, a US$16 por dose, destina 27 por cento da sua produção de 1,3 bilhão de doses aos ricos e 73 por cento aos pobres. Todos eles receberam recursos públicos para desenvolver seus produtos mas já disseram que não poderão produzir o total que estava previsto para este ano.

 

Os laboratórios farmacêuticos usam fundos de governo para pesquisas e passam a ser detentores de direitos de exclusividade. A Astra Zenica e a Pfizer receberam juntas cinco bilhões de euros em financiamento público. Sua tecnologia é mantida em segredo para, praticando preços exorbitantes, assegurarem maiores lucros à custa de muitas vidas humanas.

 

No início de fevereiro, a Pfizer anunciou aos seus acionistas que vai faturar 15 bilhões de euros com a sua vacina. E a Moderna anunciou 5 bilhões.

 

O açambarcamento

 

Os países ricos já compraram vacinas em número suficiente para imunizar três vezes a sua população e os países pobres só serão capazes de vacinar uma em cada dez pessoas. Apenas o Canadá já garantiu doses suficientes para vacinar cinco vezes cada cidadão.

 

No total, cinquenta e três por cento de toda a produção foram reservados pelos países ricos, onde vivem catorze por cento da população do planeta. Dos países que serão capazes de vacinar apenas uma em cada dez pessoas, Quénia, Myanmar, Nigéria, Paquistão e Ucrânia somados têm quase 1,5 milhão de contágios acumulados.

 

Steve Cockburn, da Amnistia Internacional, assinala que ao comprar a grande maioria do estoque mundial de vacinas, os países ricos estão a violar as suas obrigações de respeitar os direitos humanos. Se, em vez disso, trabalhassem com terceiros para partilhar conhecimento e aumentar a oferta, poderiam ajudar a pôr fim à crise global da Covid-19.

 

Olivier Wouters, da London School of Economics and Political Science e que subscreveu junto com outros especialistas uma carta aberta publicada na revista médica The Lancet, disse que o mundo precisa de mais doses de vacinas contra a Covid-19 do que de qualquer outra vacina na história, de modo a que possa imunizar pessoas suficientes para atingir a imunidade coletiva. A menos que as vacinas sejam distribuídas de forma mais equitativa, poderá levar anos até que o coronavírus esteja controlado a nível mundial.

 

As regras do capitalismo

 

A saúde e a vida humanas encontram-se hoje submetidas a alguns dos cânones fundamentais do capitalismo: concorrência, acumulação, maximização do lucro e aumento da produtividade da mão de obra do trabalhador.

 

“Ninguém poderia ser proibido de receber uma vacina que salva vidas por causa do país onde vive ou por causa da quantidade de dinheiro que tem no bolso”, disse Anna Marriott, porta-voz da Oxfam (https://www.oxfam.org/en) , uma confederação de organizações que atua em mais de 90 países lutando contra a pobreza e a desigualdade. Ela sublinhou que a menos que algo mude drasticamente, milhões de pessoas em todo o mundo não receberão uma vacina segura e eficaz para Covid-19 nos próximos anos.

 

Cientistas advertem que as vacinas deveriam ser consideradas um bem público e não um bem privado e que os países pobres não têm recursos para o transporte e o complicado acondicionamento. Passam então a depender da OMS-Organização Mundial da Saúde. É necessário um pacto de cooperação global de proteção da vida. As empresas farmacêuticas continuarão a ser lucrativas mesmo se abrirem mão da patente ou transferirem a tecnologia das vacinas.

 

Podemos concluir sem margem de erro que a Covid-19 está destinada a transformar-se numa moléstia confinada no mundo dos pobres e dos miseráveis. Mas a Humanidade às vezes é capaz de mudar o seu destino.

 

22/02/2021

https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/O-novo-velho-continente-e-suas-contradicoes-Porque-o-Mundo-deve-quebrar-a-patente-das-vacinas/4/49980

 

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/211061?language=es
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