Dia Internacional dos Povos Indígenas: a boiada está passando e o silêncio predomina
Com o atual governo mais a pandemia, houve a agudização da situação e tudo o que já ocorria veio à tona. O universo nefasto da grilagem, do agronegócio, das mineradoras, da instalação de hidrelétricas e da precariedade.
- Opinión
Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), as invasões de terras indígenas no Brasil aumentaram 44% em janeiro de 2019, quando o presidente Jair Messias Bolsonaro assumiu a Presidência.
No Brasil, a morte de líderes comunitários, as grilagens, a implantação de loteamentos em terras consideradas sagradas por seus habitantes só se expandiram. A chegada de Jair ao poder aumentou a violência contra indígenas e campesinos em todo o país. Seu governo, de envergadura reacionária, que conta com o apoio da chamada bancada BBB (da bala , do boi e da Bíblia) compartilham a mesma visão do presidente: a expansão do mercado. Dentro deste, diversos projetos de leis foram desenterrados, impactando diretamente as comunidades indígenas.
A violência não para
Em plena pandemia ocorreu no Maranhão o assassinato de Zezico Guajajara, líder da Terra Indígena Arariboia e diretor do Centro de Educação Escolar Indígena Azuru. Zezico foi encontrado baleado no dia 31 de março de 2020 em uma estrada perto de sua aldeia. A morte de Zezico deixou uma marca no em seu povo.
Com sua morte já são cinco membros dos chamados guardiões “Guardiões da floresta Floresta” assassinados desde o ano passado.
“Foi com essa preocupação, para defender nossa terra, que começamos a pensar o que poderíamos fazer para pelo menos diminuir esse impacto muito grande. Foi quando os caciques decidiram criar a organização dos Guardiões porque já estávamos cansados de tanto esperar pelo Governo brasileiro, que não cumpre o seu papel de proteger e fiscalizar a terra, de defender o meio ambiente. Porque sem o meio ambiente nós não vamos sobreviver. Porque para nós a nossa terra é a nossa mãe. Mãe terra. Nossa mãe terra que dá tudo para nós. E não só nós.” (Tainaky Tenetehar, guardião da Amazônia)
Segundo a Pastoral da Terra (CPT), o número de conflitos por terra em 2019 foi o maior desde 1985, o que expõe a desumanidade do atual governo com os mais vulneráveis. O discurso de ódio a todos que se opõem à sua cosmovisão abriu as portas para legitimar as práticas violentas empregadas há séculos contra os indígenas e os campesinos.
Na avaliação da CPT, o dado sugere uma mudança de tática na atuação dos grileiros: em lugar de mortos, os trabalhadores rurais mais conhecidos são processados e presos. A estratégia mostra, também, que esses grileiros se sentem respaldados pelo Estado. “O governo central sinaliza que a grilagem de terras é uma prática autorizada.”
No início de junho, diversos povos indígenas armaram acampamento na frente do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF) em protesto contra a votação dos projetos de lei anti-indígenas, que ameaçam os direitos que foram garantidos com o fim da ditadura militar e fazem parte da Constituição elaborada em 1988.
O acampamento “Levante pela Terra” se manteve por quase todo o mês de junho, quando houve a suspensão da votação, e retorna entre os dias 22 e 28 de agosto. A votação está prevista para 25 de agosto. O que está em jogo? A demarcação de terras indígenas em todo o território brasileiro.
Os projetos de lei
Atualmente, estão tramitando no Congresso projetos que podem destruir os direitos dos indígenas no Brasil: PL 490/2007, projeto que altera a demarcação de terras (marco temporal)[1];PL 2633, o “PL da Grilagem”, que foi aprovado na Câmara dos Deputados do último dia 4 de julho; PL 984/19, que possibilita a abertura de estradas no Parque Nacional do Iguaçu; PL 3729/04, que retira a necessidade de licenciamento de treze atividades setoriais de impacto ambiental, já aprovado na Câmara dos Deputados e enviado ao Senado; e, por último, o PL 191/20, considerado a menina dos olhos do atual presidente, pois autoriza a mineração, exploração de hidrocarbonetos e obras de infraestrutura em terras demarcadas.
A tramitação desses projetos significa total retrocesso no que diz respeito às questões ligadas ao meio ambiente, fundamentais na atualidade. Além do descaso com mais de 300 povos indígenas que habitam o território brasileiro.
“As terras indígenas são as áreas ambientalmente mais preservadas do Brasil, visto que mantêm a biodiversidade e a maior integridade das florestas, cumprindo funções socioambientais essenciais para o equilíbrio do clima e do regime de chuvas, sendo extensivos a toda a sociedade os benefícios da sua proteção e do seu uso sustentável.” (Nota pública das Organizações da Sociedade Civil sobre o PL 490/07)
É importante salientar que nunca existiu de fato o cuidado apropriado com indígenas no Brasil. Há séculos os distintos povos sofrem com o descaso, a violência e o abandono, indiferentemente de a gestão ser de esquerda ou direita. O problema dos povos indígenas é estrutural.
Com o atual governo mais a pandemia, houve a agudização da situação e tudo o que já ocorria veio à tona. O universo nefasto da grilagem, do agronegócio, das mineradoras, da instalação de hidrelétricas e da precariedade que muitas comunidades vivem ressurgiu nos meios de comunicação, justamente pelo caráter genocida de Jair, que declarou:
"O índio mudou, tá evol... Cada vez mais, o índio é um ser humano igual a nós. Então, vamos fazer com que o índio se integre à sociedade e seja realmente dono da sua terra indígena, isso é o que a gente quer aqui"
O discurso de Messias é o discurso do colonizador. Arcaico, animalesco e sem escrúpulos, mas que ainda encontra ressonância dentro da sociedade brasileira, marcada pelo racismo e pelo classismo. Para muitos, tais projetos não significam nada, já que os povos indígenas são quase "mitológicos".
A não valorização da cultura, a falta de projetos educacionais que ensinem a respeitar a pluralidade dentro de um mesmo território resultaram no cenário atual, que gera preocupação com o que pode ocorrer.
Como bem sabia Mariátegui, o “problema do índio” era o problema da terra. Fato! O homem branco não permite que as comunidades historicamente massacradas tenham paz e conquistem a soberania territorial e alimentar negada há séculos. O "problema do índio" é a terra, pois os “donos do poder” não aceitam que a terra pertence àqueles que a preservam e cuidam, e que somente desejam seguir zelando pelo território que é seu por direito para que não ocorra o total apagamento das culturas indígenas brasileiras.
Hoje, indígenas brasileiros apresentaram ao Tribunal Penal Internacional (TPI) uma denúncia formal contra o presidente por crimes contra a humanidade dos povos indígenas. O documento, expõe os abusos do atual governo, que vem tentando "exterminar" etnias e povos e estabelecer um Brasil sem indígenas.
O mês de agosto é fundamental para toda a sociedade brasileira. Caso ocorra a aprovação do PL 490, vamos, desafortunadamente, ver um dos piores episódios da história do Brasil.
Fontes:
https://cimi.org.br/2021/07/pl-490-como-votaram-deputados-partidos-comis...
https://brasil.elpais.com/brasil/2021-03-04/se-a-nossa-terra-a-nossa-flo...
https://cimi.org.br/2019/09/a-maior-violencia-contra-os-povos-indigenas-...
https://cespad.org.hn/2020/04/03/alerta-lris-argentina-alvarez-era-lider...
https://www.bbc.com/mundo/noticias-america-latina-48798825
https://www.nodal.am/2020/06/brasil-al-menos-siete-mil-indigenas-contagi...
https://www.dw.com/es/sin-tregua-durante-la-pandemia-asesinatos-de-defen...
https://noticias.uol.com.br/colunas/rubens-valente/2020/03/31/mais-um-li...
[1] Projeto de Lei 490 de 2007 que, entre outros pontos, altera o marco temporal de ocupação de territórios indígenas para aqueles ocupados previamente à promulgação da Constituição Federal de 1988. Além disso, o PL retira o usufruto exclusivo das populações indígenas sobre seus territórios e, por meio de mecanismos legais, autoriza a exploração e a invasão das terras indígenas por terceiros.
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