Novo relatório confirma que houve massacres e abuso policial durante golpe na Bolívia em 2019
Presidente Arce pediu punição aos responsáveis, enquanto opositores exigem reforma judicial antes de abrir processos.
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Na Bolívia, o Grupo Interdisciplinar de Especialistas Independentes divulgou um relatório sobre as investigações relacionadas ao golpe de Estado de 2019 e o governo da autoproclamada Jeanine Áñez. O documento reitera que houve ruptura da ordem constitucional, perseguição política, massacres e abuso policial.
O presidente Luis Arce pediu ao Parlamento que aprove o quanto antes a abertura de processos contra os responsáveis e assegurou que o Estado irá desestruturar grupos armados irregulares.
"Hoje devemos estar a altura das circunstâncias para que justiça seja feita, por isso todas as forças políticas devem assumir essa responsabilidade que se traduz em compromisso com a democracia", declarou o chefe de Estado boliviano.
O relatório, que analisa o período de 1º de setembro a 31 de dezembro de 2019, foi apresentado em uma cerimônia pública no Banco Central da Bolívia. Os especialistas confirmam as 37 vítimas mortais das massacres de Senkata e Sacaba, em novembro de 2019. Também apontam que houve perseguição política contra movimentos populares e indígenas. Um dos casos mais emblemáticos foi o linchamento público da ex-prefeita de Vinto e atual senadora, Patrícia Arce Guzmán.
O GIEI ainda assegura que houve execuções sumárias, abuso sexual, agressões a jornalistas e que a violência foi implementada pelos corpos de segurança do Estado com apoio de grupos armados irregulares, como a Resistência Juvenil Cochala e a União Juvenil Cruceñista - vinculada ao atual governador de Santa Cruz e protagonista do golpe, Luis Fernando Camacho.
Além disso, sugerem que o Estado boliviano pense em uma reestruturação das forças de segurança "para superar um comportamento autocrático".
Atendendo as indicações do grupo de especialistas, o presidente boliviano já anunciou que irá anular o Decreto 4461, que confere anistia a políticos, e irá criar uma comissão para realizar um censo das vítimas e oferecer reparação integral.
Golpe
Em outubro de 2019, após vencerem a quinta eleição consecutiva, Evo Morales e Alvaro García Linera foram obrigados a renunciar por pressão das Forças Armadas. Enquanto isso, a Polícia Nacional organizou motins e todos os sucessores vinculados ao Movimento Ao Socialismo (MAS-IPSP) foram perseguidos para deixar o caminho livre para a autoproclamação da então senadora, Jeanine Áñez.
Após a ascensão de Arce, em outubro do ano passado, o Ministério Público da Bolívia abriu um processo aberto para investigar o golpe de Estado e já decretou a prisão preventiva de Áñez, quatro ex-ministros e membros das Forças Armadas.
O ex-comandante das Forças Armadas, Williams Kaliman, assim como ex-ministro de Governo, Arturo Murillo viajaram aos Estados Unidos, foragidos da justiça. Murillo foi preso por suborno e lavagem de dinheiro, sua extradição não foi confirmada pelas autoridades estadunidenses. Enquanto há suspeitas de que o ex-ministro de Defesa, Fernando López continue no Brasil, depois de fugir das investigações no seu país.
Repercussão
As denúncias de suposta fraude eleitoral, que nunca foram confirmadas, foram promovidas pela Missão de Observação da Organização dos Estados Americanos, considerada protagonista no golpe.
O secretário geral da OEA, Luis Almagro, afirmou que tomou nota do informe e que o documento contém "elementos importantes a serem apresentados na Corte Penal Internacional e na Corte Internacional de Justiça".
Em resposta, o vice-chanceler boliviano, Freddy Mamani, reiterou que "o golpe aconteceu com a participação de Almagro" e ainda acrescentou "ele perdeu toda credibilidade no âmbito multilateral. Almagro se converteu num ministro de colonização do Governo dos Estados Unidos".
A encarregada de negócios da embaixada dos EUA em La Paz, Charisse Phillips, esteve presente no evento e se solidarizou com as vítimas.
Alguns opositores tentam usar o informe a seu favor. O ex-candidato à presidência, Carlos Mesa disse que respalda as informações, mas que os processos só poderão ser abertos após uma reforma judicial, afirmando que os atuais magistrados estão "submetidos ao MAS e não são confiáveis".
Enquanto Luis Fernando Camacho e Jeanine Áñez pedem que o ex-presidente Evo Morales também seja investigado, afirmando que houve um "vazio de poder" e não um golpe de Estado.
O ex-representante do Alto Comissionado da ONU para Direitos Humanos na Bolívia, Denis Racicot recomendou que o relatório do GIEI seja usado como instrumento para refletir sobre os fatos, além de buscar justiça e reparação às vítimas.
"É um catálogo de todas a violações. É fundamental parar de tergiversar os direitos humanos, que têm sido manipulados por uma ótica política, devemos olhar essa situação na sua integralidade", declarou Racicot.
Edição: Vinícius Segalla
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