Nasce Aliança Soberania Alimentar
07/08/2013
- Opinión
A Soberania Alimentar está prejudicada por instituições multilaterais e pelo capital especulativo. O controle cada vez maior das empresas multinacionais sobre as políticas agrícolas tem sido facilitado pelas políticas econômicas das organizações multilaterais, tais como a Organização Mundial do Comércio – OMC –. Diante disso e há mais de uma década, os movimentos sociais de pequenos produtores de alimentos deram início a um processo de articulação em todos os continentes para defender a Soberania Alimentar frente ao capitalismo que renova e recria formas para condenar os alimentos a meros rótulos de mercadoria, comprometendo, desta forma, os povos. Neste contexto nasce, neste processo de articulação, o Comitê Internacional de Planificação pela Soberania Alimentar (CIP) como espaço internacional para articular politicamente estas forças.
As organizações e movimentos sociais em nossa América Latina foram pioneiras/os neste processo, entendendo que a restituição de direitos coletivos e setoriais aos pequenos produtores de alimento é condição chave e necessária para retomar a soberania dos povos.
A crise econômica-financeira, e sobretudo ética, marcou em 2006 um aumento dos preços dos alimentos, agravando ainda mais a pobreza a milhões de pessoas do Sul.
Em uma estratégia articulada pelas grandes corporações, fez-se detonar abruptamente o sistema agroalimentar a nivel mundial, facilitando a elas e aos governos aliados disparar uma série de medidas especulativas que tendem a fortalecer o controle sobre os alimentos com instumentos comprovados pelo sistema de governo internacional, como os mercados de futuro, os bancos privados de alimentos, etc.
Frente a isto, o Fórum Mundial de Nyeleni, no ano 2007, marca um ponto de inflexão na acumulação de forças continentais e mundiais e aponta aos movimentos que recuperem energias e redobrem as apostas de fortalecer nossas ações de luta estratégica e façam um aprofundamento do conceito, a partir das experiências de lutas e construção no território, ampliando a base social e setorial de organizações que defendem a Soberania Alimentar para a Soberania dos Povos.
Os movimentos ampliam suas campanhas e lutas contra a concentração de terras, contra a OMC, como órgão supremo da mercantilização agroalimentar que destrói as sementes camponesas, contra o sistema das Nações Unidas que se ensurdece diante da voz dos povos e, em cumplicidade com as transnacionais, vai cercando as agriculturas locais, ricas em conhecimentos resilientes aos embates do capitalismo.
Se fortalecem transversalmente os movimentos, com ações e propostas pela Reforma Agrária, pela Agroecologia, pelas sementes camponesas, pelos direitos coletivos de nação, pelos direitos camponeses, pelo acesso livre a água, pela luta pela biodiversidade.
Fortalecemos nossas ações em defesa de nossos direitos de acesso à informação e a participar dos processos de tomada de decisões. Estes direitos formam a base de um bom governo, de responsabilidade e igualdade de participação na vida econômica, política e social, livre de qualquer forma de discriminação.
Os produtores de alimentos em pequena escala devem ter o direito a participar direta e ativamente na formulação e implementação de políticas agroalimentares em todos os níveis. Com este lema é que vimos com bons olhos as mudanças que começaram a ser geradas, a partir de 2009, no sistema das Nações Unidas, reformas que atravessam todas as suas agências, mas especialmente aquelas que estão relacionadas com a Agricultura e Alimentação, a FAO, que, em um alento de abertura e para salvar seu mandato (exigida pelos povos do mundo), abriu suas portas à sociedade civil, no marco da reforma do Comitê de Segurança Alimentar (CSA). Assim, pela primeira vez, os movimentos sociais chegam, com voz organizada e sustentada, a uma assembléia das Nações Unidas.
Neste contexto, os movimentos articulados no CIP começam um tempo de análise e reorganização de estratégias regionais e mundiais para aprofundar a articulação política e operativa.
Em nosso continente, durante dois anos, ocorreu este processo ao passo que aprendemos a participar de forma organizada neste novo marco do CSA da FAO. Este processo para a América Latina culmina com a “III Conferencia Especial para a Soberania Alimentar dos Movimentos Sociais e Organizações da Sociedade Civil”, prévia à 32a. Conferência Regional da FAO para a América Latina e Caribe, em que, por unanimidade, consentimos em constituir uma instância de coordenação e articulação a fim de fortalecer as propostas, ações e lutas. Alí, as organizações lançaram um novo passo no processo de fortalecimento da luta: foi criada a Aliança pela Soberania Alimentar dos Povos da América Latina e Caribe. A notícia foi apresentada no marco da Assembléia, a mais de 150 delegados e delegadas de 30 organizações regionais e continentais.
Nessa oportunidade, organizações como CLOC VC, MAELA, COPROFAM, CITI, Amigos da Tierra LAC, UITA, RAP-AL(1), animaram-se e convidaram a unir-se a todas as organizações ali presentes, a articulare-se juntas para ampliar a luta frente ao avanço esmagador e sem escrúpulos do sistema dominante, decidindo: somos uma aliança política e social de organizações, de movimentos e redes regionais e subregionais da América Latina e Caribe que representam camponeses, agricultures familiares, povos indígenas, pescadores, trabalhadores rurais, camponeses agroecológicos, ambientalistas, consumidores, mulheres, jovens comprometidas/os com a luta pela Soberania Alimentar,
Foi um chamado ao aprofundamento das ações conjuntas e de enriquecimento conceitual das organizações em torno de sua própria história de luta e sua interação com a soberania dos povos para fortalecer o alcance da Soberania Alimentar frente ao modelo opressor. Por isto, nossas ações são dirigidas a contribuir à unidade e organização dos povos na luta por Soberania Alimentar como elemento substancial na construção de um novo modelo de sociedade com identidade e Viver Bem. Ele implica também na resistêcia ao modelo de desenvolvimento dominante que artificializa e privatiza os sistemas agroalimentares a favor de grandes corporações, impondo estilos de consumo que acarretam em desnutrição, fome, má distribuição e concentração de bens da natureza nas mãos de poucos para especular a fome de muitos e com o direito à alimentação, privatizando os alimentos.
Nossa ação conjunta se baseia em defender o Direito Humao à Alimentação, a concebermos um território com identidade local, a ter uma terra para trabalhar por direito, a defender os bens da natureza (sementes, água, terra, biodiversidade) como patrimônio da Humanidade, a fornecer alimentos saudaveis para os povos sob nossas identidades agroalimentares. Defendemos nosso direito a mobilizarmo-nos como organizações que mantem nossas plataformas no exercício livre de um marco democrático e em resistência a todo proveito que nos afete, incluindo a luta contra a criminalização e repressão da mobilização social e popular. Aspiramos a participar, de forma direta, nas políticas públicas sobre alimentação e agricultura, a defender a terra para que nossos jovens não emigrem para as cidades, a revalorizar a cultura rural dos povos e sua história alimentar, a articular ações com as organizações de consumidores e a semear lutas nas urbes.
Nos urgem as linhas centrais de nossa ação: necessitamos e nos vamos por uma Reforma Agrária Integral, pela transformação do modelo agroalimentar de monocultivo e monoconsumo e pela proposta da agroecologia, que integra as diversas agriculturas camponesas e indígenas sob os princípios de biodiversidade, organização territorial, sistemas produtivos de alimentos saudáveis e soberanos, os sistemas de recuperação e restituição de sementes, os sistemas de regeneração de água, assim como a reivindicação da ação política articulada para defender nossos interesses e a reorganização do comércio de alimentos partindo dos processos locais e solidários.
Nossa primeira Assembléia se realizará em agosto de 2013, em Bogotá, Colômbia, onde se definirão as linhas políticas que guiarão a articulação, as alianças, os espaços de representação internacional, assim como as principais ações para fortalecer a luta coordenada pela Soberania Alimentar no continente. Nos encontramos renovados na força, nas lideranças de companheiros e companheiras que assumiram, com força e determinação, o desafio lançado, que nos imprimem valor e coragem para encorajar a mudança a partir das forças populares.
A partir da Aliança entendemos que a Soberania Alimentar não é somente uma alternativa ao modelo capitalista, mas o pilar fundamental para a supervivência da sociedade. (Tradução: Juliana D. Ricarte-Covarrubias)
- Maria Noel Salgado é delegada do Movimento Agroecológico da América Latina e Caribe – MAELA – no Comitê Coordenador da Aliança.
https://www.alainet.org/pt/articulo/78279?language=es
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