Falta liderança para deter o fim do mundo
21/04/2014
- Opinión
Os dados da equação climática sugerem que a humanidade perdeu o timmimg da mitigação capaz de refrear as causas do aquecimento global.
Artigo nesta página, assinado por Roberto Savio, da IPS – Agência de notícias Inter Press Service, expõe números de uma contagem regressiva que analisada com atenção provoca calafrios.
O capitalismo encurralou o futuro da humanidade em uma estreita pinguela de uma década e meia, se tanto.
Esse seria o tempo disponível para limar divergências, pactuar metas, dividir cotas e iniciar, por volta de 2020, um corte de 40% a 70% no volume de emissões de gases de efeito estufa, a ser concluído até 2050.
A base de referência seria o nível de emissões de 2010.
Detalhe: aquilo que se preconiza como imperativo para as próximas três décadas destoa brutalmente da tendência registrada nas três anteriores.
As emissões no período só fizeram crescer, em degraus ascendentes.
A redução heroica projetada agora marcaria a derradeira chance de se evitar que a temperatura média no planeta aumente mais de 2 graus Celsius até o final deste século.
A ciência adverte que qualquer degrau além disso adicionaria um roteador endiabrado à dinâmica dos eventos extremos, anulando qualquer esforço de readaptação da atividade humana no planeta.
Mais que a indiferença diante da fatalidade, a prostração na boca do funil reflete, em primeiro lugar, um déficit de liderança na condução da agenda ambiental.
Ressalvadas honrosas exceções, ao menos no Brasil, o ambientalismo sempre resistiu em associar a sua luta à superação da ordem neoliberal.
Exemplo dessa contradição é o discurso da ex-ministra Marina Silva, atual candidata a vice na chapa de Eduardo Campo.
O que temos aqui? Temos aqui um inebriante coquetel de socialismo e ambientalismo ajoelhados no altar da ortodoxia mais rudimentar e obtusa.
Campos e Marina entendem que o governo Dilma é ‘intervencionista’.
Seu ambientalismo é cevado nas reflexões do decrescimento evocadas pelo econeoliberal, André Lara Resende, formulador de uma agradável simbiose entre arrocho fiscal e vapores sustentáveis.
A classe média semi-culta e semi-informada se inebria.
Tudo o mais fica subordinado à mais estrita vigilância de um Banco Central independente, avisa Marina Silva.
Não vamos longe por aí.
Neomalthusianos tingidos de verde deveriam admitir, a bem da verdade, que a bandeira do 'decrescimento’ já se encontra em vigor em sociedades díspares, da África subsaariana às economias europeias às voltas com a deflação, sob o torniquete de Merkel & FMI.
Os desdobramentos em marcha na forma de desemprego, fome e diáspora jovem estão longe de irradiar uma aurora sustentável.
1/3 da humanidade ainda depende da queima de lenha ou carvão (leia-se, derrubada de florestas) para preparar uma simples refeição.
Quase um bilhão de seres humanos vive no calabouço da fome crônica. Outro tanto moureja a terra nua dispondo tão somente da força muscular para extrair seu sustento.
Mais decrescimento que isso?
Para escapar à lógica do fim do mundo –se é que ainda há tempo— é preciso incorporar as circunstâncias da história realmente existente à equação sustentável.
O artigo de Roberto Sávio lembra que isso está longe de ser resolvido:
‘Dez países causam 70% do total de poluição mundial (...) os Estados Unidos e a China são responsáveis por 55% (dela); China: os países ricos que criaram o atual problema querem que tomemos medidas que atrasem nosso crescimento?’.
Não se trata de uma contabilidade estática.
Nas últimas décadas, a desregulação imposta a todos os níveis da atividade humana agravou os contornos da crise social e ambiental.
Se os fundos especulativos conseguem dobrar o rendimento dos detentores da riqueza financeira em prazos curtíssimos, todos os demais setores da economia capitalista terão que perseguir idêntica voragem. Do contrário, acionistas insaciáveis fritarão o fígado de gestores empedernidos numa grande fogueira de ações nas Bolsas de Valores.
A dominância financeira impõe há mais de 40 anos uma aceleração predatória em todas as latitudes, do macro ao micro.
Acelerar, no léxico dos mercados, significa desregular. O quê? Tudo: da proteção ao trabalho à exploração das riquezas naturais.
A pedra de toque do jogo do fim do mundo são os direitos de saque sobre a riqueza disponível, exercido pela papelama rentista cujo montante supera os US$ 600 trilhões: 10 vezes a soma do PIB planetário.
Eis o moinho satânico do nosso tempo, cujo poder de esmagamento dissemina um padrão de retorno financeiro incompatível com os valores que orientam a vida em sociedade e com as taxas de regeneração dos sistemas naturais.
A omissão ‘verde’ não isenta a negligência da esquerda diante do colapso que o IPCC prenuncia.
A década de governos do PT tirou 50 milhões de brasileiros da miséria.
Nunca é demais reiterar aquilo que desespera o conservadorismo: isso mudou a geografia política do país. Talvez de forma irreversível nos marcos da legalidade.
O que mais o PT tem a dizer a esse universo que ascendeu ao consumo e, sobretudo, como pretende que ele assuma o comando de seu destino rumo a uma cidadania plena, se no meio do caminho tem uma pedra ambiental esmagadora?
Como assegurar que a renda do pré-sal, ademais de financiar a educação pública de qualidade, erga linhas de passagem para uma matriz energética verdadeiramente à altura dos desafios do século XXI?
Os cálculos do IPCC indicam que o sopro da barbárie já respira no planeta.
Ou alguém acredita que um poder internacional dominado pela supremacia financeira, incapaz de regular o dinheiro, terá reservas de responsabilidade para limitar as emissões poluentes no volume preconizado pelo IPCC, e dentro do exíguo espaço de tempo que nos resta?
As linhas da urgência ambiental e a da prostração política indicam que a batalha da mitigação, por ora, foi perdida.
Resta saber se a esquerda será capaz de recuperar o tempo perdido para dar à humanidade uma segunda chance de adiar o fim do mundo.
Artigo nesta página, assinado por Roberto Savio, da IPS – Agência de notícias Inter Press Service, expõe números de uma contagem regressiva que analisada com atenção provoca calafrios.
O capitalismo encurralou o futuro da humanidade em uma estreita pinguela de uma década e meia, se tanto.
Esse seria o tempo disponível para limar divergências, pactuar metas, dividir cotas e iniciar, por volta de 2020, um corte de 40% a 70% no volume de emissões de gases de efeito estufa, a ser concluído até 2050.
A base de referência seria o nível de emissões de 2010.
Detalhe: aquilo que se preconiza como imperativo para as próximas três décadas destoa brutalmente da tendência registrada nas três anteriores.
As emissões no período só fizeram crescer, em degraus ascendentes.
A redução heroica projetada agora marcaria a derradeira chance de se evitar que a temperatura média no planeta aumente mais de 2 graus Celsius até o final deste século.
A ciência adverte que qualquer degrau além disso adicionaria um roteador endiabrado à dinâmica dos eventos extremos, anulando qualquer esforço de readaptação da atividade humana no planeta.
Mais que a indiferença diante da fatalidade, a prostração na boca do funil reflete, em primeiro lugar, um déficit de liderança na condução da agenda ambiental.
Ressalvadas honrosas exceções, ao menos no Brasil, o ambientalismo sempre resistiu em associar a sua luta à superação da ordem neoliberal.
Exemplo dessa contradição é o discurso da ex-ministra Marina Silva, atual candidata a vice na chapa de Eduardo Campo.
O que temos aqui? Temos aqui um inebriante coquetel de socialismo e ambientalismo ajoelhados no altar da ortodoxia mais rudimentar e obtusa.
Campos e Marina entendem que o governo Dilma é ‘intervencionista’.
Seu ambientalismo é cevado nas reflexões do decrescimento evocadas pelo econeoliberal, André Lara Resende, formulador de uma agradável simbiose entre arrocho fiscal e vapores sustentáveis.
A classe média semi-culta e semi-informada se inebria.
Tudo o mais fica subordinado à mais estrita vigilância de um Banco Central independente, avisa Marina Silva.
Não vamos longe por aí.
Neomalthusianos tingidos de verde deveriam admitir, a bem da verdade, que a bandeira do 'decrescimento’ já se encontra em vigor em sociedades díspares, da África subsaariana às economias europeias às voltas com a deflação, sob o torniquete de Merkel & FMI.
Os desdobramentos em marcha na forma de desemprego, fome e diáspora jovem estão longe de irradiar uma aurora sustentável.
1/3 da humanidade ainda depende da queima de lenha ou carvão (leia-se, derrubada de florestas) para preparar uma simples refeição.
Quase um bilhão de seres humanos vive no calabouço da fome crônica. Outro tanto moureja a terra nua dispondo tão somente da força muscular para extrair seu sustento.
Mais decrescimento que isso?
Para escapar à lógica do fim do mundo –se é que ainda há tempo— é preciso incorporar as circunstâncias da história realmente existente à equação sustentável.
O artigo de Roberto Sávio lembra que isso está longe de ser resolvido:
‘Dez países causam 70% do total de poluição mundial (...) os Estados Unidos e a China são responsáveis por 55% (dela); China: os países ricos que criaram o atual problema querem que tomemos medidas que atrasem nosso crescimento?’.
Não se trata de uma contabilidade estática.
Nas últimas décadas, a desregulação imposta a todos os níveis da atividade humana agravou os contornos da crise social e ambiental.
Se os fundos especulativos conseguem dobrar o rendimento dos detentores da riqueza financeira em prazos curtíssimos, todos os demais setores da economia capitalista terão que perseguir idêntica voragem. Do contrário, acionistas insaciáveis fritarão o fígado de gestores empedernidos numa grande fogueira de ações nas Bolsas de Valores.
A dominância financeira impõe há mais de 40 anos uma aceleração predatória em todas as latitudes, do macro ao micro.
Acelerar, no léxico dos mercados, significa desregular. O quê? Tudo: da proteção ao trabalho à exploração das riquezas naturais.
A pedra de toque do jogo do fim do mundo são os direitos de saque sobre a riqueza disponível, exercido pela papelama rentista cujo montante supera os US$ 600 trilhões: 10 vezes a soma do PIB planetário.
Eis o moinho satânico do nosso tempo, cujo poder de esmagamento dissemina um padrão de retorno financeiro incompatível com os valores que orientam a vida em sociedade e com as taxas de regeneração dos sistemas naturais.
A omissão ‘verde’ não isenta a negligência da esquerda diante do colapso que o IPCC prenuncia.
A década de governos do PT tirou 50 milhões de brasileiros da miséria.
Nunca é demais reiterar aquilo que desespera o conservadorismo: isso mudou a geografia política do país. Talvez de forma irreversível nos marcos da legalidade.
O que mais o PT tem a dizer a esse universo que ascendeu ao consumo e, sobretudo, como pretende que ele assuma o comando de seu destino rumo a uma cidadania plena, se no meio do caminho tem uma pedra ambiental esmagadora?
Como assegurar que a renda do pré-sal, ademais de financiar a educação pública de qualidade, erga linhas de passagem para uma matriz energética verdadeiramente à altura dos desafios do século XXI?
Os cálculos do IPCC indicam que o sopro da barbárie já respira no planeta.
Ou alguém acredita que um poder internacional dominado pela supremacia financeira, incapaz de regular o dinheiro, terá reservas de responsabilidade para limitar as emissões poluentes no volume preconizado pelo IPCC, e dentro do exíguo espaço de tempo que nos resta?
As linhas da urgência ambiental e a da prostração política indicam que a batalha da mitigação, por ora, foi perdida.
Resta saber se a esquerda será capaz de recuperar o tempo perdido para dar à humanidade uma segunda chance de adiar o fim do mundo.
22/04/2014
https://www.alainet.org/pt/articulo/84961
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