A véspera do domingo no rio da Prata

25/10/2019
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Foto: Agustin Marcarian
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O domingo 27 de outubro é dia de eleições na Argentina e no Uruguai. E o cenário nos dois países está muito diferente nas vésperas do dia da decisão. Para começo de conversa, a situação uruguaia é estável, com a economia sólida e positiva, enquanto a Argentina vive uma corrosão mais e mais ameaçadora a cada dia que passa.  

 

Além disso, tudo indica que no Uruguai haverá segundo turno, enquanto que na Argentina ninguém (a não ser, e ainda assim é duvidoso, o proprio Mauricio Macri) aposta um tostão nessa possibilidade.  

 

Os eleitores uruguaios dizem que sua maior preocupação é a violência urbana, principalmente em Montevidéu.  

 

Para os argentinos, a questão é outra: como sobreviver até o dia 10 de dezembro, quando o novo presidente toma posse, num país esmigalhado, com uma moeda que só na sexta-feira (a dois dias do domingo eleitoral) perdeu 1,5% do seu valor, apesar das vendas desenfreadas de dólar feitas pelo Banco Central (quase 400 milhões numa só jornada) e uma economia que retrocede aceleradamente enquanto a inflação continua crescendo de forma disparada?

 

Para quem mora no Rio ou em São Paulo, o temor dos uruguaios com a violência parece injustificável. Convém lembrar, em todo caso, que tudo nesta vida é relativo: embora Montevidéu continue sendo uma cidade segura e tranquila quando comparada com as duas maiores capitais brasileiras, seus índices de violência são muito superiores aos de dez anos atrás.  

 

Por ser um país discreto e de população discreta, as eleições do Uruguai não chamam a nossa atenção. E menos ainda quando vivemos uma temporada de tensão extrema não só por causa das eleições na vizinha Argentina, mas pela explosão social que está sacudindo o Chile e, há pouco tempo, sacudiu o Equador.  

 

Não chamam, mas deveriam.

 

O favorito é Daniel Martínez, da mesma Frente Ampla que preside o país há quinze anos. Este engenheiro de 62 anos, que foi prefeito de Montevidéu, segue a linha moderada, mas ainda de centro-esquerda, do atual presidente Tabaré Vázquez. Ou seja, bem distante das propostas do ex-presidente José Mujica.  

 

Há outros dez candidatos (nenhuma mulher), embora só um deles pode ser considerado um rival de peso. Trata-se do candidato do Partido Nacional, de direita, Luis Lacalle, filho do ex-presidente Luis Alberto Lacalle.     

 

O sistema eleitoral uruguaio é semelhante ao brasileiro: para evitar o segundo turno, um candidato deve alcançar no primeiro 50% dos votos úteis. As pesquisas indicam que Martínez tem 38% das intenções de votos, contra 27% de Lacalle.  

 

Em terceiro lugar está o candidato do Partido Colorado, mais ao centro que o Nacional, embora distante da Frente Ampla, Ernesto Talvi, com 11%.

 

Tudo indica que num eventual segundo turno parte significativa dos eleitores de Talvi se absterá ou dará seu voto ao candidato da Frente Ampla. Não por proximidade ideológica, mas para fustigar seu rival eterno, o Partido Nacional. Caso isso ocorra, será a centro-direita fustigando a direita.

 

O mais provável, enfim, é que nesse esperado segundo turno, que acontecerá no dia 24 de novembro, Martínez seja o vencedor. Caso isso aconteça, deve-se esperar um governo afinado com o de Alberto Fernández na Argentina, para desgosto de Jair Bolsonaro, seu clã familiar e sua trupe.

 

E por falar em Alberto Fernández e nas eleições argentina, em Buenos Aires o clima é de tensa expectativa, mas de calma. Exceto, claro, nessa entidade tão poderosa como invisível chamada de mercado financeiro.  

 

Na sexta-feira, faltando dois dias para que se conheça o resultado das urnas, havia filas quilométricas nos bancos. O foco principal das filas: as contas em dólares.  

 

Isso mostra que por mais que Fernández tenha assegurado que não haverá mudança alguma nas regras bancárias, com ênfase especial nos depósitos em dólar, a desconfiança persistiu.  

 

De certa forma, existem razões sólidas para essa desconfiança. Basta lembrar que, em 2002, os depósitos em dólares foram congelados e submetidos a um câmbio fortemente desvalorizado. E que por mais que a trajetória de Alberto Fernández mereça que se dê a ele um voto de confiança, por ter sido sempre um político moderado e equilibrado, Macri mentiu tanto, mas tanto, que deixou todo mundo com os dois pés para trás.

 

Assim que o resultado for divulgado, ainda na noite de domingo, Alberto Fernández fará um pronunciamento à nação que é esperado com imensa ansiedade.  

 

Segunda-feira o mercado financeiro reabre. E aí veremos o que acontece.   

 

- Eric Nepomuceno é jornalista e escritor. Para o Jornalistas pela Democracia

 

25 de outubro de 2019

https://www.brasil247.com/blog/a-vespera-do-domingo-no-rio-da-prata

 

https://www.alainet.org/es/node/202892
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