Brasil: Validade do Plebiscito
28/08/2002
- Opinión
Desta vez, a Semana da Pátria será diferente. O povo brasileiro está
acordando. Já não faz sentido a celebração formal, o discurso
repetitivo, o aparato solene mas vazio de sentido. O povo quer saber
das coisas. E está pronto a participar.
A prova maior desta salutar mudança está no plebiscito sobre a Alca,
proposto por entidades da cidadania, cujo interesse vem se
alastrando pelo Brasil como fogo em tempos de seca e ventania. Já
fazia tempo que não se via mais o alvoroço de professores e alunos
querendo se informar, buscando subsídios, procurando explicações. O
plebiscito já está cumprindo sua função antes mesmo de concretizar
sua consulta. Quem estaria hoje falando da Alca, se a iniciativa do
plebiscito não tivesse sido lançada?
Seu primeiro mérito consiste em convocar para o debate objetivo, em
torno de questões que afetam a vida do povo, e comprometem o futuro
do país. Neste sentido, de cara, o plebiscito se apresenta como um
válido contraponto ao "faz de conta" de uma campanha eleitoral, em
que os candidatos só procuram dizer o que agrada aos eleitores.
É neste contexto que encontramos a resposta sobre a validade de um
plebiscito não oficial, às vésperas de eleições presidenciais, na
perspectiva de mudanças profundas no próximo governo.
Em primeiro lugar, o resultado do plebiscito se constituirá numa
referência importante para o Brasil. Acredito que todo presidente que
quer contar com o respaldo do povo, não fica indiferente, e não
menospreza uma iniciativa como esta. Sobretudo porque ela vem
carregada de valores, que são urgentes para constituírem a base de um
governo que precisará enfrentar situações difíceis e desafiadoras.
O plebiscito fortalece a cidadania. Sobretudo porque ele não é
oficial. Estamos cansados de coisas oficiais, que na realidade não
funcionam. A própria constituição começa a irritar pelo contraste
entre a oficialidade indiscutível do que ela determina, e a realidade
diferente que o povo vive. Está escrito lá que "a saúde é dever do
Estado e direito do cidadão". Muito oficial, e pouco verdadeiro!
O plebiscito desperta para a percepção de problemas que afetam o
país. Traz para o debate público questões que não podem ficar
restritas ao âmbito de comissões técnicas, desprovidas de mandato
popular, e sujeitas a pressões de interesses corporativos. O que
interessa ao país, precisa ser debatido pelos cidadãos. Assim o
governo terá condições melhores para negociar em nome da nação.
O plebiscito costura uma coesão nacional, cuja força se torna cada
vez mais urgente no confronto com as pretensões hegemônicas dos
centros mundiais do poder econômico.
Ao mesmo tempo, o plebiscito sobre a Alca não se opõe a uma
integração dos países da América, que salvaguarde as identidades
nacionais, respeite os valores culturais de cada povo, e encaminhe
uma justa e eqüitativa participação dos benefícios da economia,
resultantes dos avanços tecnológicos, dos aportes do capital
financeiro e da imprescindível contribuição dos trabalhadores.
Rejeitando a maneira como vem sendo tramada a Alca, a campanha
continental manifesta a convicção de que "uma outra América é
possível"!
Mas sobretudo o plebiscito lança o alerta mais urgente e aponta para
a questão de fundo. Na verdade, o que está em jogo é a soberania dos
países da América Latina. Com o Nafta e a Alca se pretende
desencadear um processo de recolonização, valendo-se dos tentáculos
da dependência financeira, da submissão tecnológica e da impotência
militar.
O tempo de reagir é este. A maneira democrática de contrapor um outro
processo é o plebiscito. Vamos a ele!
https://www.alainet.org/fr/node/106312
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