Cumpra-se a lei
23/03/2006
- Opinión
Ouviu-se muito esta frase nos últimos dias no Rio Grande do Sul, exigindo severa punição às mulheres camponesas que teriam destruído um pretenso laboratório da Indústria de Celulose Aracruz. Os arautos da legalidade deliciar-se-iam se o cumprimento da lei resultasse em cadeia para as mulheres camponesas.
Mas sempre é bom, quando se fala em cumprir a lei, perguntar: qual lei?
No caso em tela, gostaria de ver respeitadas as Leis estaduais do Estado do Rio Grande do Sul n° 9.202, de 11 de janeiro de 1991 e da lei n° 9.506, de 15 de janeiro de 1992, em plena vigência e que preconizam:
“ Art. 1º - Dependerá de prévio licenciamento do Poder Público Estadual e de aprovação da Assembléia Legislativa a construção, a instalação, a ampliação e o funcionamento dos empreendimentos e ou atividades que, efetiva ou potencialmente, possam, significativa ou irreversivelmente, alterar a qualidade de vida ambiental, causar desequilíbrio ecológico, impedir ou dificultar a regeneração natural do meio ambiente de uma região ou de uma comunidade: (...)
II - indústrias carbo ou petroquímica, cloroquímica, siderúrgica e usina de destilação de álcool; (....)
§ 1º - É considerada região envolvida quando os efeitos sobre o meio ambiente, da atividade e ou empreendimento repercutirem em mais de um município; e comunidade, os núcleos com mais de 10.000 habitantes;
§ 2º - Para licenciamento do empreendimento e ou atividade e aprovação da Assembléia Legislativa, deverá ser apresentado o Estudo de Impacto Ambiental, nos termos da regulamentação da matéria, federal e estadual, sem prejuízo de outras exigências fixadas em lei, ou regulamento, e do procedimento de licenciamento estabelecido pelos municípios.” Lei n° 9.202/91; grifos nossos.
“ XIV - Indústrias com efeitos tóxicos ou radioativos, localizadas nas áreas críticas de poluição ou fora dos limites das zonas de uso industrial, respeitando os critérios, normas e padrões fixados pela legislação em vigor.(....)
§ 1º - Por alteração significativa, entende-se a modificação dos níveis de contaminação sonora, aérea ou hídrica, assim como qualquer modificação no meio físico da região atingida pelo empreendimento.\" Lei n° 9.506/1992;
Grifos nossos.
O que disto foi cumprido pelas empresas Aracruz, Votorantin e Stora Enso, que já adquiriram 300 mil hectares de terra para implantação de monoculturas de eucalipto e pinus e indústrias com tecnologia Cloroquímica?
Ao que me consta, o estudo prévio de impacto ambiental não foi encaminhado à Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, nem consta que tenha sido realizado para o conjunto das regiões atingidas, com todas as suas implicações, conforme determinam as leis aqui evocadas.
Então, pode-se desrespeitar a Lei para violar e destruir o maior e mais importante laboratório da terra, o laboratório natural que é o maio ambiente, a natureza e a sua biodiversidade em nome do lucro de três grandes empresas? Isto não poderia ser também classificado como crime ambiental, vandalismo do capital, injustiça institucionalizada, selvageria dos poderosos?
Que tal garantir o cumprimento destas leis antes de reverberar contra atos que podem ser interpretados como de legítima defesa da vida, do meio ambiente, da justiça agrária e, pasmem, do estrito cumprimento destas mesmas leis desrespeitadas e não cumpridas?
Frei Sérgio Antônio Görgen
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