Preocupação pastoral
14/05/2006
- Opinión
Notícias recentes da grande imprensa declaram que o Papa Bento XVI tem uma motivação principal e maior para visitar, em 2007, o Santuário de Aparecida, em São Paulo. Além de participar da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, em maio do ano que vem, o Pontífice estaria bastante preocupado com a evasão de fiéis que sofre a Igreja Católica neste que é o maior país católico do mundo. Os bispos do Brasil, reunidos em Assembléia desde ontem em Itaici, também tomaram este tema para seu primeiro dia de reflexão. O tema central da Assembléia é a Evangelização da Juventude. É fácil adivinhar a preocupação que toma a cabeça e o coração dos pastores da Igreja Católica ao ver nossos jovens pouco presentes na Igreja. Sem contar as muitas, graças a Deus, e honrosas exceções, não é necessário ser um arguto observador para constatar que a distância entre a Igreja e os jovens se aprofunda e isto põe em risco todo o trabalho de evangelização e o próprio futuro da Igreja. Se as novas gerações não abraçam o Evangelho e não enriquecem a comunidade eclesial com seu entusiasmo, suas novas idéias, seus desafios, para onde vai essa Igreja? Como poderá responder às interpelações do mundo atual, do qual esses jovens serão os protagonistas? No entanto, segundo o depoimento de alguns bispos que estiveram pessoalmente com o Papa na visita anual, percebe-se que a preocupação de Bento XVI é mais ampla e englobante do que simplesmente com a faixa jovem da população brasileira. Na verdade, seu olhar de Pastor da Igreja Universal enxerga mais longe. E sua preocupação é com o fenômeno da evasão dos fiéis católicos que acontece em todo o país. Em 1991, 78% dos brasileiros eram ou se declaravam católicos. Hoje esse número caiu para 68%. Segundo os bispos, o Papa ficou bastante impressionado com essa cifra e isso o teria motivado com força a decidir-se a vir a Aparecida para a V Conferência do Episcopado latino-americano. Se o maior país católico do mundo tem essa baixa em seu número de fiéis, o que leva a que isso aconteça? No ano passado, em 2005, o CERIS (Centro de Estatísticas Religiosas e Investigação Social) finalizou uma pesquisa sobre as novas formas de crer. O objetivo principal era mapear os motivos e as características da mudança de religião na população brasileira. Constatou-se que tem havido um declínio relativo de pessoas que se declaram católicas e um crescimento de evangélicos de cunho pentecostal e neopentecostal . Em 1991 havia 83,3% de católicos e 9% de evangélicos na sociedade brasileira. No censo de 2000, a proporção de católicos cai para 73,9% e os evangélicos totalizam 15,6%. Contudo, no campo protestante, os que mais crescem são os evangélicos pentecostais. O último Censo, em 2000, identificou ainda um processo de desinstitucionalização, ao constatar que os que se declaram sem religião saltaram de 4,7% em 1991 para 7,4%. Além disso, há que reconhecer que existe igualmente uma ³indefinição² que leva a uma certa confusão entre os próprios fiéis católicos, tornando seu sentimento de pertença algo difuso. A presença crescente de instituições evangélicas no campo religioso brasileiro, bem como de novos movimentos religiosos que conjugam práticas esotéricas com outras de tradição cristã, produz um efeito de contaminação ou simbiose nas Igrejas históricas. Estas se vêem muitas vezes forçadas a adaptar-se às novas demandas espirituais dos indivíduos, o que se expressa, freqüentemente por meio da adesão a ofertas religiosas emergentes no campo religioso brasileiro, tais como ³New Age², sacralização de técnicas de relaxamento ou de terapias de saúde etc. De toda maneira, a mudança de religião no Brasil hoje constitui uma prática de 24% da população, o que não é um número inexpressivo. O sentimento de bem estar em um determinado grupo religioso e ainda a aproximação com Deus foram as principais motivações dos entrevistados para mudar de religião. Evidencia-se que cada vez mais as pessoas procuram a religião para atender a necessidades de ordem subjetiva e espiritual. E os compromissos éticos, embora apareçam como conseqüência da adesão espiritual, a secundam mais do que a antecedem. A grande sede dos brasileiros é por Deus, sua pessoa e seu amor. Este é o povo que Bento XVI vai encontrar quando vier a Aparecida. Um povo com grande sede de Deus e com profunda alma religiosa, mas algo desorientado em sua busca espiritual. Esperemos que a presença do Papa possa ajudar a fortalecer os espíritos abatidos e consolar os corações aflitos que desejam a Deus mais do que a terra seca e árida deseja a chuva que a molha e fecunda. - Maria Clara Maria Clara Lucchetti Bingemer, teóloga, professora e decana do Centro deTeologia e Ciências Humanas da PUC-Rio. È autora de "Violência e Religião" (EditoraPUC-Rio/Edições Loyola), entre outros livros. (wwwusers.rdc.puc-rio.br/agape)
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