Leilão de Libra é contestado por nacionalistas e neoliberais

21/10/2013
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Rio de Janeiro – Em protesto contra a realização do leilão do Campo de Libra, dezenas de militantes da Federação Única dos Petroleiros (FUP) e do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) ocuparam durante todo o dia de ontem (17) a sede do Ministério das Minas e Energia (MME) em Brasília. A manifestação foi o episódio mais visível de uma série de contestações ao leilão, o primeiro a ser realizado sob o regime de partilha adotado para a exploração do petróleo e do gás do pré-sal. Cada um com seu argumento, movimentos sociais, entidades sindicais e partidos políticos de oposição, desde o PSDB até o PSOL, aproveitam o momento também para tentar fustigar o governo do PT exatamente naquilo que é um de seus maiores trunfos: a retomada de uma posição soberana do Brasil em relação a seu próprio petróleo.
 
Na contestação mais concreta até aqui, com viés nacionalista, o advogado Fábio Konder Comparato e o professor da USP Ildo Sauer, que foi diretor da Petrobras no início do governo Lula, deram entrada ontem à noite na Justiça Federal de São Paulo em uma ação popular pedindo a imediata suspensão do leilão, que está marcado para a próxima segunda-feira (21) no Rio de Janeiro. Na ação, Comparato e Sauer pedem que o Campo de Libra seja integralmente passado ao controle da Petrobras e afirmam que o Brasil, como país exportador da matéria-prima, “deve controlar o ritmo da produção de acordo com os interesses nacionais e manter o preço do petróleo elevado no mercado internacional”.
 
Mas, algumas contestações são orientadas também pelo pensamento neoliberal. Especialistas, muitos deles ligados ao PSDB, ouvidos à exaustão pela grande imprensa nos últimos dias adotam um rosário de críticas que têm como principal alvo o próprio regime de partilha, mas são dirigidas também à presença “excessiva” da Petrobras, que terá participação mínima obrigatória de 30% em cada uma das áreas de exploração em Libra, à exigência de conteúdo nacional para equipamentos e serviços nas diversas etapas de produção e à criação da nova empresa estatal Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA), que será gestora de todas as operações executadas nos campos do pré-sal brasileiro.
 
Esse contexto, segundo os críticos, seria a razão para que alguns gigantes do setor petrolífero – como as empresas norte-americanas ExxonMobil e Chevron, a norueguesa Statoil e as britânicas BP e BG – tenham optado por não participar do leilão, embora as próprias empresas tenham alegado outras razões para justificar sua não participação. Em matéria publicada no jornal O Globo, o especialista Carlos Assis, da consultoria Ernst & Young, resume essa linha de pensamento: “Existe uma grande preocupação por parte dessas empresas em relação ao novo marco regulatório brasileiro. As companhias avaliaram que, apesar de serem as investigadoras, não terão nenhuma ingerência na operação, que será comandada pela Petrobras que, apesar de sua competência reconhecida, ficará sobrecarregada. Além disso, terão uma outra estatal, a PPSA, dentro de sua gestão, com poder de veto e voto”.
 
Entre as entidades representativas dos trabalhadores e dos movimentos sociais, o objetivo é promover manifestações diárias em diversos pontos do Brasil, até o dia marcado para o leilão, para quando está convocado um grande ato, a se realizar nas proximidades do Hotel Windsor, onde acontecerá o evento. A primeira manifestação, realizada ontem no Rio de Janeiro, teve a participação de cerca de 500 militantes da FUP, que é filiada à CUT, do MST, do PSOL e do PSTU. Na véspera, o Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro, talvez inspirado pelas grandes mobilizações que começaram na cidade em junho e agora continuam com a greve dos professores, dizia esperar “de 30 mil a 50 mil pessoas” na manifestação. Apesar dos esforços retóricos e de mobilização daqueles que se opõem ao leilão de Libra, ainda não foi detectado na prática qualquer vestígio de repúdio popular ao processo.
 
 Espionagem
 
Logo que foi revelado o esquema de espionagem contra o governo brasileiro e a Petrobras levado a cabo pela Agência Nacional de Segurança (NSA) do governo dos Estados Unidos, este se tornou também um motivo de contestação à realização do leilão do Campo de Libra. Em 16 de setembro, os senadores Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), Pedro Simon (PMDB-RS) e Roberto Requião (PMDB-PR) apresentaram à mesa-diretora da casa um projeto de decreto legislativo que determina a suspensão do leilão, uma vez que “informações sigilosas da Petrobras foram violadas”. A não participação das empresas dos EUA no leilão terminou por esvaziar esse argumento.
 
Antes disso, a diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Magda Chambriard, já havia refutado qualquer possibilidade de a descoberta da espionagem da NSA vir a provocar a suspensão do leilão: “Não há dados sigilosos que possam atrair o interesse de espionagem de qualquer tipo. Além disso, os dados que a ANP produziu para o leilão de Libra são públicos”, disse, ressaltando que o banco de dados da agência reguladora sequer é conectado à internet. Em nota, a Petrobras afirmou acreditar que seus sistemas de segurança jamais foram violados de fato. Informalmente, alguns executivos do setor afirmam que, se os EUA tivesse realmente espionado a Petrobras e a ANP, a ExxonMobil não teria perfurado um poço seco na Bacia de Santos, como aconteceu recentemente.

Para evitar que eventuais manifestações ou tumultos possam impedir o leilão na segunda-feira, a governo contará com mais de mil homens do Exército, da Força Nacional de Segurança e das polícias Federal e Rodoviária Federal. Para fazer frente às contestações legais que muito provavelmente surgirão após a realização do leilão, o governo já montou uma “força-tarefa jurídica”, que ficará sob a coordenação dos ministros José Eduardo Cardozo (Justiça), Édison Lobão (Minas e Energia) e Gleisi Hoffmann (Casa Civil), além do advogado-geral da União, Luís Inácio Adams.
 
21/10/2013
 
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