O que há na mesa do brasileiro?

18/03/2014
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Joan M./CC
 
Fast-Foods, grandes corporações alimentícias nacionais e internacionais e o uso cada vez mais desmedido de agrotóxicos nas lavouras são os principais inimigos da mesa do cidadão brasileiro. Foi essa a conclusão que o Núcleo de Pesquisa Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (NUPENS - USP) chegou com a publicação do Guia Alimentar Brasileiro. O trabalho do núcleo em conjunto com o Ministério da Saúde visa atualizar e definir as diretrizes alimentares para serem utilizadas na orientação de escolhas mais saudáveis de alimentos pela população brasileira e é periodicamente atualizado para acompanhar a realidade nutricional do país.
 
Considerando que o ato de comer vai muito além de levar o garfo à boca, o guia discute o conceito de segurança alimentar que se trata do “acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis”, aponta a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional de 2006.
 
A integrante do núcleo, Maria Laura Louzada, explica que o Guia Alimentar é importante para analisar o comportamento da sociedade e tem de acompanhar a realidade do momento. “A alimentação de uma população é muito ligada à sua história, cultura, geografia e economia. Por causa disso, é importante que os guias sejam específicos e que vão ao encontro dos recursos e hábitos da população local. A primeira versão foi publicada em 2006, mas a alimentação e o perfil de saúde dos brasileiros passaram por uma rápida transição nos últimos anos, o que levou à necessidade de atualização das orientações”, explicou.
 
Essas mudanças foram em sua maioria para pior, na opinião de Maria Laura. Com o brasileiro trabalhando cada dia mais e sem tempo para se alimentar corretamente, nos últimos anos foi identificada uma mudança nos hábitos alimentares dos cidadãos que passaram a consumir mais alimentos congelados e de rápida preparação.
 
“Infelizmente nas últimas décadas os brasileiros estão deixando de preparar alimentos básicos como arroz, feijão, carnes, leites e ovos e aumentando a ingestão de produtos prontos para consumo como carnes processadas, doces industrializados, refrigerantes e comida congelada. Essa mudança certamente trouxe um impacto negativo para a qualidade da nossa alimentação. Além de promover a saúde, portanto, o guia também tem a função de resgatar nossos hábitos alimentares tradicionais”, criticou.
 
Um dos principais problemas hoje no Brasil são as grandes corporações do ramo alimentício que dominam grande parte da produção de alimentos no país. Maria Laura alerta que esse monopólio acaba criando alimentos padronizados para todas as partes do mundo e enfraquece os hábitos mais tradicionais de preparação.
 
“O que vemos é a convergência para um sistema intensamente monopolizado, industrializado, baseado em commodities, com uso intenso de agrotóxicos e produtos padronizados em todas as partes do mundo. Esses produtos são, em sua maioria, baseados em ingredientes baratos e extremamente calóricos como óleos e açúcares e não possuem vínculo com a cultura alimentar das comunidades”, analisou.
 
Epidemia da obesidade
 
Essa também é a responsável pelo que muitos já estão chamando de epidemia da obesidade em todo o mundo. Em 2013, pela primeira vez na história, o índice de pessoas com sobrepeso no Brasil superou a metade da população. O mesmo estudo, feito pelo ministério da Saúde, apontou que 17% da população já está obesa.
 
“Várias evidências apontam que a principal causa dessa mudança relaciona- se a aos hábitos alimentares: consumindo muitos produtos industrializados, ingerimos uma maior quantidade de calorias em um volume menor de comida. O nosso cérebro tem dificuldade de entender isso e tende a comer mais do que precisa. Além disso, há o excesso de sal, açúcar, gorduras e substâncias como conservantes, estabilizantes, flavorizantes, corantes, sabores artificiais exagerados e menor quantidade de fibras, vitaminas e minerais. Mesmo produtos com ‘alegações de saúde’, ou seja, aqueles que se dizem light, diet ou que possuem fortificação com vitaminas e fibras são menos saudáveis que os alimentos de verdade. Muitas vezes, is so provoca o consumo exagerado com aquela sensação de ‘não consigo parar’. A conveniência dos prontos para consumo muitas vezes pode induzir que a gente substitua refeições saudáveis (a clássica dupla arroz e feijão, por exemplo) por lanches prontos e que a gente se alimente na frente da televisão ou enquanto trabalha ou dirige”, disse Louzada. Muitos mitos também rodeiam os hábitos alimentares brasileiros. Um dos maiores, na opinião de Maria Laura, é o de que custa caro se alimentar bem nas grandes cidades brasileiras. Pra ela, essa é uma falsa impressão causada pelo marketing dos fast-foods que ressalta preços mais acessíveis.
 
“Alimentos básicos como arroz, feijão, mandioca, batata – que são extremamente saudáveis – e algumas frutas ainda são muito mais acessíveis. Quando combinamos todos esses alimentos, o resultado é uma refeição geralmente mais barata que aquelas prontas para comer. Para aqueles que necessitam comer fora de casa, as melhores alternativas são os lugares que servem ‘comida caseira’, os famosos ‘pratos feitos’ ou os restaurantes de comida por quilo”, declarou.
 
- Bruno Pavan, de São Paulo (SP)
 
19/03/2014
 
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