O governo Dilma e a conjuntura
18/11/2014
- Opinión
“Em 2010 votei na Dilma por causa do Lula, agora, voto na Dilma por causa da Dilma.”
Chico Buarque, no programa eleitoral da campanha presidencial de 2014
Chico Buarque, no programa eleitoral da campanha presidencial de 2014
A vitória da presidenta Dilma foi o sucesso de um projeto político baseado em um desenvolvimento econômico subordinado ao emprego e à distribuição de renda. Um governo que tem lado e compromisso, não só na eleição. Na saudação do 1º de maio de 2014, a presidenta Dilma já reafirmava isso de forma clara e inequívoca.
O caráter heroico da vitória eleitoral nessa eleição valoriza nosso governo e o projeto que o identifica. O dramático desse pleito não foi a potência do adversário do segundo turno, o neoliberal Aécio Neves. Seu crescimento dependeu menos de suas virtudes pessoais e programáticas ou de seu governo. Por sinal um governo pífio, cheio de irregularidades e que foi rejeitado pelos eleitores.
Nosso maior inimigo foi o massacre que sofremos, diariamente, de uma mídia oligopólica que substitui os partidos de oposição e pauta, cotidianamente, a agenda oposicionista. E o faz há anos, como comprovam os estudos feitos na Uerj, analisando o comportamento dos grandes jornais do centro do país: O Globo, ESP e FSP.
Observando apenas alguns meses já temos a grandeza da cobertura negativa anti-Dilma e antigoverno e que foi responsável pelo ódio, pelo preconceito e pelo antipetismo presentes nas eleições, em maior ou menor grau, em todo o país. A tentativa criminosa de um golpe midiático nos últimos dias da campanha, perpetrado pela revista Veja, do Grupo Abril, foi o ápice dessa campanha orquestrada pelos grandes meios de comunicação.
Em segundo lugar, o sistema eleitoral vigente, com base no voto nominal, no financiamento por empresas e na possibilidade da coligação proporcional, já era uma morte anunciada no sentido conservador e reacionário do próximo Congresso. Mais uma vez predominou o poder econômico – campanhas eleitorais milionárias – e, principalmente, uma pulverização partidária destituída, na sua maioria, de compromissos programáticos, tornando inviável a construção de alguma governabilidade. Os três maiores partidos giram em torno de 10% da Câmara Federal, cada um.
Sem nenhuma reforma aprovada pelo Congresso que sai, com o engavetamento pelo ministro Gilmar Mendes da arguição de inconstitucionalidade do financiamento eleitoral por pessoas jurídicas, o pleito obedeceu às velhas regras em jogo: predomínio do poder econômico, quase a metade dos deputados federais, por suas declarações de patrimônio, são considerados milionários. A possibilidade das coligações proporcionais completou o quadro com o predomínio do reacionarismo e do conservadorismo e a pulverização partidária.
Finda a eleição, o PSDB não desceu do palanque. O candidato derrotado apresenta-se em nome dos 50 milhões que o apoiaram e com a cumplicidade da mídia, em especial da Rede Globo, não sai dos holofotes, bradando pelo terceiro turno, enquanto orientam sua base mais raivosa a levantar a bandeira do impedimento da presidenta Dilma. Seu mote são as denúncias e as relações das grandes empreiteiras e fornecedoras com a Petrobras e os supostos financiamentos a parlamentares e partidos.
A transição e composição do novo governo não será fácil. O comportamento do líder do PMDB na Câmara dá a dimensão do problema. Um partido que compõe o governo, indica o vice-presidente, controla vários ministérios e órgãos, mas não tem unidade nacional, nem responsabilidade programática com o projeto.
Eduardo Cunha e Henrique Alves organizaram a derrota da presidenta em relação ao decreto do Executivo que estimulava a participação da cidadania na estrutura dos Conselhos, existentes desde a Constituição de 1988. Puro revanchismo e chantagem no jogo político do tabuleiro do Congresso. Cunha organiza sua eleição à presidência da Câmara, rompendo o acordo tácito da primazia da indicação à maior bancada.
A presidenta Dilma não pode ceder a esse jogo mesquinho e pragmático. Por isso precisa total apoio do seu partido e dos partidos da base aliada, que compreendem o caráter histórico do momento que estamos vivendo.
A frase de Chico Buarque, genial em suas músicas, revela também um arguto comentário sobre o momento. Não cabe no partido o surgimento de sugestões de nomes que amenizem a crise e retomem a “confiança” do mercado. Muito menos saídas intempestivas de ministros, “batendo portas”. Esses só fazem o jogo dos inimigos, que querem dobrar o governo em questões-chave, como a política econômica e o Banco Central. A presidenta Dilma, que suportou essa tempestade até aqui, tem o discernimento para conduzir o próximo período com o partido e sua base aliada.
O que a maioria dos brasileiros que elegeu Dilma quer é que se aprofunde nosso projeto, e não um recuo para ganhar as boas graças do mercado.
A grande burguesia é hipócrita e farisaica, pois tem grandes lucros, faz greve de investimentos e não reclama da especulativa taxa Selic em 12%. Mesmo com as mudanças cambiais e as desonerações, não produz para exportar. Prefere ganhar no rentismo financeiro e na especulação.
O PSDB e os setores golpistas do PP continuam organizando e tentando mobilizar setores da população, pregando o impedimento da presidenta.
O papel dos partidos e dos movimentos sociais, que garantiram a reeleição da presidenta Dilma, deve ser no sentido de fortalecer o projeto para ampliar as mudanças no acesso aos direitos de educação, saúde, mobilidade e uma política que garanta o emprego e a melhor distribuição de renda.
Para isso, o principal caminho é ampliar a participação popular no governo. Por em prática uma democracia participativa que estimule e garanta espaços para o protagonismo social. Aí reside a ampliação mais segura da governabilidade e de construção de uma relação de forças mais sólida e maior da que se expressou no processo eleitoral.
Sem esse espaço de participação também não se altera a governabilidade congressual hoje atolada num terreno pantanoso e afeito aos negócios e corrupções. A eleição e os resultados já comentados anteriormente mostram que não será pela clara definição programática e de disciplina partidária que se moverão os aliados no parlamento.
Esse protagonismo popular, que é perfeitamente realizável, necessita assumir também a bandeira da reforma política eleitoral. O movimento não pode esfriar. As eleições provaram, mais uma vez, e de forma mais cabal, que o sistema eleitoral brasileiro perdeu sua legitimidade. Corroído pelos financiamentos empresariais, que acirram as disputas entre e dentro dos próprios partidos, a corrupção toma conta dos mandatos, pois os compromissos dos eleitos com as empresas, que investiram R$ 300 mil, R$ 500 mil ou R$ 1 milhão numa candidatura, serão muito maiores que os compromissos com os partidos e/ou os eleitores.
Diante das propostas existentes impõe-se, hoje, uma grande capacidade de diálogo, de tolerância e de busca de ação unitária em torno de posições comuns que acelerem o processo.
Créditos da foto: Arquivo
18/11/2014
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