Retomar o programa eleito em 2014

21/08/2015
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O recente encontro da maioria das correntes internas do PT gaúcho foi consequência da frustração com os resultados do 5º Congresso do partido realizado em Salvador, Bahia.

 

A corrente majoritária nacional optou por não enfrentar os principais problemas vividos pelo partido e pelo governo, aprovando um texto genérico, evasivo, que mal tangenciava o que os filiados e nossos eleitores esperavam do Congresso.

 

Os temas mais polêmicos foram remetidos a futuras reuniões da Direção Nacional e a seminários que aprofundem a análise sobre a política econômica adotada pelo governo Dilma com a indicação do Ministro Joaquim Levy.

 

Descontentes, mas não derrotadas, as correntes internas não abrem mão de seu diagnóstico e de suas propostas para o partido e o país. Por isso, a reunião do dia 7 de julho, na Assembleia Legislativa, contando com a maioria significativa das tendências internas do PT/RS, reafirmou as teses que havíamos levado ao Congresso: um posicionamento claro do partido contra a política econômica do Ministro Levy e do Banco Central. Defendíamos, também, atitudes exemplares do partido em relação ao processo de eleições diretas internas, ao financiamento empresarial das campanhas e a filiados denunciados por envolvimentos em atos de corrupção.

 

Nestes casos, a simples aplicação do Estatuto já determinaria o afastamento dos suspeitos de seus cargos de direção ou de representação até os fatos serem esclarecidos.

 

Agora, essas correntes organizam um ato semelhante no plano nacional. Queremos reafirmar nossa posição e convocar outros setores do partido para construção de uma nova maioria que pela Direção Nacional e por um encontro nacional extraordinário assuma posições nítidas que recuperem nossa identidade programática.

 

Não desconhecemos o cerco brutal que os inimigos realizam contra ao governo Dilma. Dos ataques diários e permanentes do monopólio midiático às ações de desespero e auto proteção do presidente da Câmara, dep. Eduardo Cunha (PMDB), que, com a cumplicidade de um grande “centrão” eleito pelo poder econômico, busca desviar a atenção de sua condição de réu na operação Lava- Jato. Se isso não bastasse, são secundados pelo PSDB de Aécio Neves e da partidarização do STF pela ação de figuras como Gilmar Mendes.

 

Do ponto de vista político, não adiantou o governo Dilma fazer enormes concessões, trazer um neoliberal convicto para o Ministério e ter que dar explicações da incoerência do discurso vitorioso no segundo turno e a política adotada após a vitória. Os partidos e os setores da grande burguesia, especialmente os bancos e os agiotas que vivem do rentismo financeiro, não arrefeceram suas críticas nem reorientaram seus “pugilistas” no Congresso Nacional. Não querem só a política econômica, querem tirar Dilma e o PT do governo e, se possível, do espectro político-partidário do País.

 

Aprendamos com o caso grego. Não basta desrespeitar a soberania popular de um Estado-membro, tem que derrotar, humilhar, aniquilar lideranças como o primeiro-ministro Tsipras e seu Partido Syriza. Essa é a lei da Troika européia, essa é a lei do neoliberalismo.

 

A consequência é que não há reconhecimento nem identidade com a política econômica adotada, mas com ela dividimos, confundimos e perdemos nossas bases sociais que são as primeiras e principais atingidas.

 

De que adianta manter uma base de aliados completamente infiéis e desleais pois estão no governo e com ele não tem identidade política e programática? Não há eleitor ou cidadania que sobreviva com essa esquizofrenia política. Um partido, um governo, não sobrevivem sem identidade programática, sem visualização nítida, sem o caráter democrático e pedagógico do processo eleitoral para que o cidadão saiba identificar que o governo tem lado, tem projeto e coerência.

 

Do ponto de vista econômico, a política do Ministro Levy e do Banco Central é um desastre. Se havia desequilíbrio orçamentário fruto do quadro mundial e de políticas anticíclicas adotadas, corrija-se o desequilíbrio. O que ocorreu foi uma mudança da política econômica baseada no pensamento neoliberal dos “ajustes” e “austeridades” com corte brutal do orçamento, diminuição do papel do Estado, das empresas e dos bancos públicos e a estúpida e recorrente elevação da taxa Selic para mais de 14%. Em um momento de recessão internacional, de queda dos preços de matérias-primas e dos alimentos e de uma inflação gerada por preços e tarifas administrados e, grande parte, especulada pelos “especialistas” da mídia, essa política de juros é um desastre para o Brasil. Significa não crescimento, desemprego, queda do salário médio, agravamento da questão social, perda de receita pela União, Estados e Municípios. Ou seja, essa não é nossa política. O PT tem que dizer isso alto e em bom som. E, fazê-lo junto com o movimento sindical, com os movimentos sociais da cidade e do campo. Essa é a melhor forma de defender nosso governo, de defender o mandato de Dilma e dos nossos verdadeiros aliados.

 

A grande burguesia industrial brasileira é cúmplice desse rentismo. Existem vozes isoladas como B. Steinbruch, diretor da Cia. Siderúrgica Nacional (CSN) e diretores da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ), mas as grandes Federações da Indústria são coniventes, não assumem uma clara posição contra a taxa Selic. São sócio menores, vivem também do rentismo e não tem um projeto nacional para o País.

 

Por isso, o governo deve retomar uma política de defesa do emprego e da distribuição da renda pois são os trabalhadores, os produtores da cidade e do campo que poderão defender o nosso projeto. Com Levy e Tombini vamos perder também estas bases sociais sem ter apoio de outros setores que se beneficiam do rentismo.

 

Este quarto mandato precisa aprofundar a política que nos trouxe até aqui. Não basta distribuição de renda, consumo e obras e serviços públicos. Para termos crescimento, o Estado não pode diminuir suas empresas e bancos, ao contrário, deve aumentar os investimentos públicos produtivos e de infraestrutura em outras áreas que o Brasil precisa.

 

Para isso, também é necessário chamar a participação popular, o protagonismo dos setores populares nas deliberações, junto com o governo, para definir os gastos públicos.

 

A “Agenda Brasil” proposta pelo senador Renan Calheiros (PMDB) não é a nossa e continuaremos reféns – mesmo sem a virulência e o golpismo do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB) – de um projeto neoliberal e dos acordos e conchavos de um Congresso eleito, majoritariamente, pelo poder econômico. Desde 2003, essa orientação política nos amarra a uma política de alianças construtora de derrotas e de perda de identidade. De 2002 até agora, diminuímos nossa representação na Câmara Federal quando a lógica de governos consecutivos apontaria para ampliarmos a representação parlamentar. Eleições dominadas pelo poder econômico determinam a diminuição das nossas bancadas e ainda sofremos o desgaste pelas acusações da fraude e corrupção dominantes no processo eleitoral.

 

Não sairemos da crise política atual presos a essa visão de governabilidade congressual cevada por concessões, cargos, emendas parlamentares e privilégios.

 

Por outro lado, no campo da direita não há uma unidade fácil, pois eles não possuem um projeto comum para o País e as saídas via golpes brancos ou impedimentos só revelam que a oposição não se constitui como alternativa ao país. As manifestações de rua, por sua intolerância e puro negativismo, como estas do 16 de agosto, são incapazes de dar um sinal, um rumo para o Brasil. As pesquisas sobre sua composição revelam uma identidade tucana de mais de 75% dos participantes. Se tivessem alguma lógica, deveriam abandonar o chamamento aos quartéis e o “Fora, Fora”, pelo aplauso e defesa ao ministro Levy que pratica o neoliberalismo que os manifestantes defendem.

 

Se o golpismo arrefeceu nos últimos dias e já aparecem vozes defendendo diálogo e os “interesses maiores” do País, é necessário que o governo responda positivamente e com propostas e iniciativas com base no programa eleitoral que nos garantiu a vitória no segundo turno.

 

A “Marcha das Margaridas” e a reunião com centenas de dirigentes sindicais e dos movimentos sociais em Brasília, demonstraram que a presidenta Dilma não está só.

 

Dia 5 de setembro em Belo Horizonte, a Frente Brasil Popular reunirá milhares de sindicalistas, lideranças populares, intelectuais, parlamentares, prefeitos para defender a democracia e um projeto popular e de soberania nacional para o País.

 

Sintonizar com o conteúdo das propostas que unificam a Frente Brasil Popular deve ser o ponto de inflexão para um novo rumo para o governo e o país.

 

- Raul Pont é professor.

 

21/ago/2015

http://www.sul21.com.br/jornal/retomar-o-programa-eleito-em-2014/

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/171886
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