Não à guerra
12/02/2003
- Opinión
Os analistas dão como certo o ataque de forças norte-americanas e aliadas ao
Iraque. Esse ataque deverá ocorrer mesmo que o Conselho de Segurança da ONU não
o aprove. No seu discurso à nação, no último dia 28, o presidente Bush deixou
claro que os Estados Unidos atacarão o Iraque prescindindo do aval
internacional, se for o caso. Assim, ao arrepio do direito internacional e
contra a opinião pública mundial, o governo norte-americano pretende resolver
suas pendências com o Iraque e com Saddam Hussein pelo uso da força. Os
objetivos deste ataque, com custos astronômicos em recursos e vidas segundo
projeções de especialistas, não estão claros para o mundo. As inspeções da ONU,
até agora, não conseguiram provar que o Iraque violou resoluções, que possua
armas de destruição ou alimente redes terroristas.
Manifestantes pacifistas norte-americanos chamam a operação militar de "guerra
do petróleo". Em setores da mídia especula-se sobre quais companhias
petrolíferas seriam beneficiadas sob um novo governo iraquiano, subserviente à
Casa Branca. O escritor Gore Vidal tem denunciado, insistentemente, a ligação
das famílias de Bush, do vice-presidente e do secretário de Defesa dos Estados
Unidos com a indústria petrolífera.
O mais grave de tudo é que o governo norte-americano apresenta razões e valores
supostamente universais para justificar a guerra. Dentre os valores, estariam a
defesa da democracia, da liberdade e da paz mundiais. Dentre as razões,
sustenta-se a tese da guerra preventiva para evitar futuros desmandos ou ações
belicistas de Saddam. Argumenta-se também que o Iraque, juntamente com a Coréia
do Norte e a Líbia, faz parte do "eixo do mal".
Saddam Hussein, segundo Bush, teria uma "mente má". É preciso desnudar a
natureza imperial das atitudes, da retórica e das justificativas do governo
norte-americano. Em primeiro lugar, as motivações da guerra são essencialmente
ligadas aos interesses e à dependência da economia norte-americana à fonte
energética do petróleo. Assim, por trás do discurso do universalismo de
valores, está o interesse particular dos Estados Unidos. As ações imperiais
contra outros povos e países, no passado, sempre foram desencadeadas em nome de
universalismos.
O conceito de "guerra preventiva" é o equivalente contemporâneo do clássico
conceito imperial de "guerra justa". Fazer uma "guerra preventiva" supõe,
inclusive, para quem a faz, a condição de onisciência, pois se presume que se
sabe o futuro ou que se sabe o que um outro país ou agente fará no futuro. A
"guerra preventiva" é uma guerra que, no fundamental, é justificada, não em
razões reais, mas em suposições. Resta saber até que ponto as suposições ocultam
as razões reais. No caso do Iraque, a guerra seria preventiva para evitar
possíveis ataques com armas químicas e biológicas que ocorreriam num momento
qualquer do futuro.
Um outro elemento da retórica de natureza imperial situa-se no discurso sobre o
"eixo do mal" e da "mente má". Esse discurso se complementa com a justificativa
da manutenção da "ordem internacional". Essa retórica, por um lado, visa
dissolver a idéia de que guerra comportará a confrontação entre Estados
nacionais e exércitos nacionais. E, por outro, visa dissolver a noção de
fronteira. A ação militar revestir-se-ia de caráter essencialmente policial:
tratar-se-ia de deter os agentes do mal (Saddam Hussein), e de restaurar a
"ordem internacional". Veja-se que, no caso, a "ordem internacional" não é nem
mesmo a ordem definida pela ONU, mas a ordem definida pelos Estados Unidos. Os
impérios não levam em consideração noções de "fronteira" e "Estado nacional".
Seu poder é ilimitado e universal.
Acreditamos que se é necessário desarmar e vigiar o Iraque, é possível fazê-lo
por outros meios que não a guerra. A guerra precisa ser detida pela opinião
pública norte-americana, pela opinião pública mundial e por governos de outros
países, através de intensas campanhas pela paz.
A ONU corre imenso risco de desmoralização definitiva. Se a guerra acontecer
sem seu aval, revelar-se-á que o mundo está à mercê do não limite da força e da
violência. Se a ONU der seu aval sem provas evidentes da necessidade do ataque
e por pressão dos Estados Unidos, mostrará que se trata de um organismo
subserviente aos ditames da força. Para que haja paz no mundo é preciso evitar o
unilateralismo e reconstruir os organismos internacionais, partindo do
reconhecimento de que o mundo se define por um caráter multicivilizacional. As
diferentes civilizações e as diferentes regiões devem ter assento no Conselho
de Segurança da ONU como fator de sua democratização e como necessidade de se
buscar saídas mediadas e negociadas para os conflitos internacionais ou
internos.
A guerra poderá mergulhar a economia internacional numa recessão. Os seus
efeitos se farão sentir em todo o mundo e atingirão, principalmente, os países
pobres e as populações pobres. No Brasil e nos demais países em
desenvolvimento, poderemos ter aumento dos combustíveis, aumento da inflação,
aumento do câmbio e fugas de investimentos. Temos todos os motivos para
condenar a guerra; nenhum para justificá-la.
https://www.alainet.org/pt/articulo/106935
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