FSM 2004:
Dalits gritam por direitos humanos
18/01/2004
- Opinión
Percorrer os caminhos do Nesco, local deste Fórum Social Mundial, é
driblar várias multidões que se entrecruzam. Grupos e mais grupos
que levantam vozes, cantam, dançam, exibem faixas e camisetas pelas
causas que defendem. Nesse mosaico humano, um movimento se faz notar
com especial intensidade: são os dalits (algo como "oprimidos"), que
representam cerca de 160 milhões de pessoas somente na Índia.
O sistema de castas hierarquiza a sociedade indiana há milhares de
anos, em uma tradição que nasceu do hinduísmo, acabou moldada por
sistemas políticos e econômicos e ainda persiste, mais de meio
século após a independência da Índia.
De acordo com esse sistema, a sociedade se divide em brâmanes (a
casta superior, dos filósofos, sábios e educadores), kshatriyas
(administradores e soldados), vaishyas (comerciantes e pastores) e
sudras (artesãos e trabalhadores braçais). Essa distinção é feita
desde o nascimento.
Um grupo é excluído desse sistema de castas – e, portanto, da
própria sociedade: são os dalits. Essa estrutura social
hierarquizada se reproduz também em outros países. Estima-se que
existam 250 milhões de dalits no Sul da Ásia - sem falar em Japão,
Coréia e África.
Considerados "intocáveis", eles praticamente não têm acesso aos
direitos humanos básicos. São segregados, vivem em áreas separadas,
não têm acesso às mesmas oportunidades e por vezes são impedidos de
freqüentar os mesmos espaços públicos dos demais. Em geral, cabem
aos dalits os trabalhos mais degradantes e, não raramente, são
submetidos a humilhações e agressões.
A mobilização da comunidade dalit neste Fórum Social Mundial
impressiona. A Campanha Nacional pelos Direitos Humanos dos Dalits
(Human Rights Campaign on Dalit Human Rights – HRCDHR) e a Rede
Internacional de Solidariedade Dalit (Internation Dalit Solidarity
Network – IDSN) organizaram um seminário – intitulado "Da frigideira
para o fogo: a discriminação das castas no contexto global" - para
chamar a atenção do mundo para o problema e discutir soluções. A
comunidade compareceu em grande número e as cadeiras do pavilhão A2,
reservado para a atividade, foram insuficientes. Havia música,
tambores, grupos de dança, cartazes e faixas. Mas, ao mesmo tempo,
uma seriedade implícita, a tensão de quem espera mudanças e quer
acreditar que elas são possíveis.
O professor Sukhadeo Thorat, do Indian Institute for Dalit Studies
(Instituto Indiano de Estudos sobre a Comunidade Dalit) e da
campanha HRCDHR, lembrou que o governo procurou não discutir a
questão na Conferência Mundial da Organização das Nações Unidas
sobre Desigualdade Racial, realizada em Durban, na África, em 2001,
e reclamou que a ONU nao vem dando a devida atenção ao problema.
A campanha faz algumas reivindicações básicas por igualdade
economica, social e cultural. Todas foram reunidas em um documento
que ficou conhecido como Black Paper (Relatório Negro):
- dignidade: menos de 31% dos dalits têm eletricidade em casa e mais
de 50% vivem abaixo da linha de pobreza.
- educação: quase dois-terços da população é analfabeta.
- trabalho e terra: 85% não possuem terras.
- igualdade de gênero: os casos de estupro são freqüentes e as
mulheres são constantemente discriminadas.
- segurança: em apenas dois anos (de 1995 a 1997), aconteceram mais
de 90 mil crimes contra membros da comunidade dalit.
- emprego: a maior parte das vagas reservadas para a população dalit
não foi preenchida.
As organizações e os movimentos de defesa das comunidades dalit
pretendem prosseguir na estratégia de mobilizar seus membros para
conseguir influenciar na elaboração de políticas governamentais e
sensibilizar organizações internacionais de direitos humanos.
* Fausto Rêgo, Rits
http://fsm2004.rits.org.br/conteudo.asp?conteudo_id=62
https://www.alainet.org/pt/articulo/109159
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